terça-feira, 16 de agosto de 2011

Terra de Lobos


A chacina de lobos desencadeada pelos conquistadores do Oeste Americano ainda permanecia viva na memória daquela pequena cidade de Montana. Buck Calder, o impiedoso rancheiro que a dominava, alimentava aliás o ódio dos habitantes para com aqueles animais. Protegida pelo sistema legal, a bióloga Helen Ross chega à cidade empenhada em defender aquela espécie agora em vias de extinção. Para isso, vai ter de enfrentar uma população revoltosa e assustada e de gerir a forte paixão que irá nascer entre ela e o filho do seu maior inimigo.

Um romance épico acerca do amor redentor e do inquietante confronto entre o homem e a natureza.

Livro que recomendo vivamente. Magnífico! Desde a primeira à última página!

Nicholas Evans, Terra de Lobos. Editorial Presença, colecção Grandes Narrativas, nº 87, 1ª ed., Lisboa, 1999.


Baseado noutra obra deste autor - O encantador de Cavalos -  o  excelente filme (1995) com o mesmo título e interpretações brilhantes de Robert Redford (que também é o realizador), Kristin Scott Thomas, Sam Neill e Dianne Wiest (género drama).

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Linha do Tâmega, Linha do Corgo, Linha do Tua, Linha do Douro…






  






Quem como eu, desde a minha infância, fazia viagens pela Linha do Tâmega, Linha do Corgo, Linha do Tua, Linha do Douro…viagens de sonho que poucos portugueses conheceram, certamente se recorda das paisagens únicas que do comboio se viam.

De Chaves, Vidago… a Vila Real… de Vila Real até ao Porto…Que saudades!

Por montes e vales, aqui e além salpicados pelo brilho dos rios que preguiçosamente serpenteavam por entre a pedernia, eu tive o privilégio de ver e sentir o trabalho do Homem, contra a dureza da terra, o sol abrasador, pelo pão e pelo vinho, pela Vida.
Num cenário mágico de linhas ondulantes, os socalcos percorriam em espiral os declives das serras num abraço fraterno entre o céu e a terra, numa mística única que nos arrebatava e extasiava para sempre.

Eu via e sempre vi com os olhos e com o coração.

Menina curiosa, que tudo olhava, sentindo, estendia o meu olhar até ao fundo dos vales e aí me prendia, numa geometria mais-que-perfeita da Natureza, como se nada de mais belo pudesse existir ou voltar a ver.

Perdia o meu olhar no verde dos pinheiros, das urzes e das flores silvestres, tantas, à nossa passagem e ao nosso olhar, vagarosamente acompanhado pela máquina que subia, subia, seguia, seguia, puxando, puxando, carruagens felizes com gente como eu.

Numa tela colorida pelo sol quente, muito quente, e que uma pequena aragem perfumava, chegava até mim aquele aroma magnífico de pinheiros, giestas e urzes em flor, como uma saudação ou abraço.

Parar nas estações da CP ao longo destas linhas, era uma lição de História. História de Arte. História da Vida e de vidas.
E o meu olhar prendia-se cada vez mais a tudo isto, tal a beleza e a diversidade de cores, sons, cheiros e emoções!

Nesta altura, ainda pequenita, não tinha máquina fotográfica, não tinha dinheiro nem mesada, ainda não havia televisão na minha terra, não tinha bicicleta, não sabia o que significava passar férias "fora", sabia que era duro viver em Trás-os-Montes, que havia uma capital que era Lisboa, que conhecia o mar e que o mar era lindo, sim, mas era longe, na terra da avó. Sabia que os meus pais eram os meus heróis e iam continuar a sê-lo, pela luta que travavam e pelo esforço que faziam para sermos crianças felizes, ainda que para isso sentissem no corpo e na alma a dureza de um regime que lhes negou sempre uma vida sem inquietações, a paz e o sossego. Conseguiram fazer de nós  crianças deslumbradas com as maravilhas da mãe-terra, encantados que ficávamos com as coisas simples, puras, vibrando com a Natureza como quem sorve a última gota de vida, abraçando-a com os olhos e guardando-a na alma. 
Vidago, Chaves, Vila Real, Porto – as terras que me viram crescer até aos 10 anos, altura em que foi preciso sair, partir, fugir.

Mas estas imagens mantiveram-se e mantêm-se vivas. Estas paisagens, estas cores, o aroma intenso que do verde se soltava… e o vento a sussurrar aos pinheiros… o cinzento matizado do granito, o azul brilhante dos rios onde o sol poisava, sorrindo, os azulejos das estações, os comboios, a fagulha que teimosamente entrava nos olhitos, o carvão que enfarruscava o rosto… Oh, máquinas a carvão! O “Texas” e não só!

No fundo, fui uma menina com uma infância feliz.

Enchi o coração com a beleza das serras e dos montes, brinquei na rua, a cantar, saltar à corda, à bilharda, à macaca, com amiguinhos, cães, gatos, burros, cavalos, pintainhos, bois e boizinhos, sem horas, sem medos, sem fome, no riacho que a cantar me encantava e onde barcos de folhas pousava com risos e sonhos pequeninos da minha enorme alegria!

E que bom que era ir até lá, sobretudo ao fim da tarde, das tardes quentes de Verão!

Que bom que era o cheirinho a terra molhada quando as regas começavam nas hortas e, num manto de trevos e erva fresca, sentar-me para ver os sapos, as rãs, peixes cintilantes, melros, andorinhas, pardais, lagartos, lagartixas, abelhas, borboletas multicores, pequenos insectos... e vê-los livres, livres, iguais a mim.

As lavadeiras apanhavam já a roupa que corara, brilhara e secara  no cimo de pedras e arbustos!

Ao longe, na pequena ponte, passava o comboio.

Eu acenava-lhe e dizia "Até amanhã!”.


Nazaré Oliveira





Para conhecer mais:

Fotos de:

1ª República, uma aurora de esperança

Revoltosos nas barricadas da Rotunda (Lisboa) 1910


Os historiadores dizem, com razão, que a 1ª República durou escassos dezasseis anos, de 1910 a 1926, mas criou no nosso País uma aurora de esperança.
Abriu-se, depois, um largo e doloroso período, em que as liberdades públicas e os direitos humanos foram suprimidos, de 1926 a 1974, intitulado, sucessivamente: Ditadura Militar, Ditadura Nacional, Estado Novo e Estado Social. Mas foi sempre e só, Ditadura, apoiada na repressão policial, na censura, nos tribunais plenários e na polícia política (Polícia de Informações, PVDE, PIDE e DGS), inimiga das liberdades, com a supressão das garantias individuais e dos Partidos e dos Sindicatos.
O regime ditatorial, nas suas diversas formas, bloqueou Portugal, por quase 48 anos. Foi responsável pelas guerras coloniais – contrárias à tradição portuguesa, cujo melhor exemplo de auto-determinação é o Brasil – pelo isolamento internacional, pela miséria do Povo, forçado a abandonar Portugal em vagas sucessivas de emigração, e pela mordaça permanente da liberdade de expressão e da repressão dos que pensavam diferente.
A libertação chegou com a Revolução dos Cravos, pioneira na Europa e na Ibero-América, legal e democraticamente instituída, com as primeiras eleições livres de 1975 e a elaboração da Constituição de 1976.
(…) Como é conhecido, a 1ª República criou um Estado Laico (não confessional) e foi pluralista e pluripartidária, garantindo a liberdade, nos seus diversos aspectos, apostando na instrução dos portugueses, no civismo, no associativismo e no progresso.
Mas, foi perturbada, no curto espaço da sua vigência, pelas incursões monárquicas, vindas de Espanha, pelo norte, por duas tentativas ditatoriais – Pimenta de Castro e Sidónio Pais – por contra-revoluções e sucessivos actos de violência.
Cometeu também alguns erros graves, que devem ser estudados, para não serem repetidos na nossa 2ª República. Dou como exemplos: as perseguições à Igreja Católica, que não foram compreendidas pela maioria dos portugueses, o tratamento demasiado severo contra os sindicatos e o operariado em geral, a falta de igualdade no tratamento dos dois sexos, apesar da plêiade de mulheres republicanas que se destacaram e, talvez, a própria intervenção de Portugal na guerra, apesar dos argumentos patrióticos com que os líderes republicanos a justificaram. Contudo, a guerra prolongou-se muito mais do que os republicanos julgavam e, as consequências negativas que dela resultaram foram muito pesadas...
No entanto, o legado que a 1ª República nos deixou foi enorme, bem como o exemplo de ética republicana dos seus grandes líderes, que marcaram os portugueses de sucessivas gerações e se manteve até hoje.
Com efeito, não podemos esquecer a gesta heróica da resistência ao fascismo de tipo salazarista, com gerações e gerações de sacrificados, de todos os Partidos e ideologias: desde os republicanos do chamado revira lho, aos maçons, aos anarquistas, aos católicos progressistas, aos comunistas, aos socialistas, e até a alguns monárquicos como o próprio Paiva Couceiro, Afonso Lopes Vieira, Rocha Martins e os integralistas como Pequito Rebelo, Hipólito Raposo e Rolão Preto, entre tantos outros.
Realmente, a resistência à Ditadura sempre se reclamou dos ideais de tolerância e liberdade da 1ª República, cujos valores nos continuam a orientar, no quadro político e ideológico muito diverso da nossa 2ª República.
(…)

Lisboa, 10 de Fevereiro de 2010

[Mário Soares] in site da Fundação Mário Soares

De Amor e de Sombra


Que livro fantástico! Que história tão bela, esta, do amor entre dois jovens, Francisco e Irene, apesar de ameaçada pela sombra da ditadura de Augusto Pinochet.

Irene, jovem jornalista aristocrata, que vive à margem da política, completamente alheia às atrocidades cometidas pela ditadura militar; Francisco, fotojornalista oriundo de uma família da baixa burguesia, de esquerda, que sobrevive com dificuldades.

Uma história de amor intemporal. Uma sensibilidade incrível que Isabel Allende mostra mais uma vez e, como sempre, a sua posição contra a ditadura, contra os regimes ditatoriais, sanguinários, neste caso, o de Pinochet, com dezassete anos de brutalidade e crueldade sobre o povo chileno - os pobres, os perseguidos por razões políticas, os torturados, os exilados, os que lutam pela liberdade e justiça social.

É simplesmente magistral a forma como Isabel Allende enlaça a História nos seus romances e nos reaviva a memória colectiva e a consciência histórica.

"De amor e de Sombra" é, também, a luta dos que acreditam que outra sociedade é possível, onde a ética política e os direitos humanos sejam a realidade há tanto desejada e justamente reivindicada.

A propósito deste seu livro, diz Isabel Allende:

Esta é a história de uma mulher e de um homem que se amaram plenamente, salvando-se assim de uma existência vulgar. Trouxe-a na memória conservando-a para que o tempo não a desgastasse e é só agora, nas noites silenciosas deste lugar, que finalmente posso contá-la. Fá-lo-ei por eles e por outros que me confiaram as suas vidas, dizendo: toma, escreve, para que o tempo não o apague.

Nazaré Oliveira

Isabel Allende. De amor e de Sombra. Difel, Difusão Editorial, S.A., 11ª edição, 1997.


Para saber mais:

Coro dos Escravos Hebreus


sábado, 13 de agosto de 2011

13 de Agosto de 1961 - Muro de Berlim

A luta pela liberdade no continente europeu parece, pouco a pouco, destinada a fazer parte das estantes da história europeia. 13de Agosto de 1961 constitui uma data sombria da Europa no período da Guerra Fria.

A então República Democrática Alemã (RDA) ou Alemanha Oriental (como também era conhecida) iniciava a construção do tristemente célebre muro de Berlim.

Durante quase três décadas, as largas dezenas de quilómetros de barreiras físicas, arame farpado, torres de controlo, minas e guardas fronteiriços da RDA que circundavam Berlim ocidental tornaram-se um símbolo vivo e sangrento da divisão europeia e do elevado preço da liberdade por que almejavam muitos cidadãos da ex-RDA. Muitos deles pagaram com a própria vida a tentativa de escapar de Berlim oriental para alcançar a liberdade no lado ocidental. Para eles, a liberdade tornou-se um preço demasiado elevado. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1945) que a Europa se encontrava dividida, estando parte dela por detrás de uma cortina de ferro, expressão apropriadamente utilizada por Winston Churchill. Neste contexto, a cidade de Berlim já se tinha tornado o epicentro de enormes tensões entre o bloco ocidental (liderado pelos Estados Unidos) e o oriental (liderado pela então União Soviética). Basta relembrar o bloqueio de Berlim (1948-1949) em que os países ocidentais tiveram de lançar mão de uma gigantesca e arrojada ponte aérea para fornecer bens alimentares e de primeira necessidade à população berlinense sitiada. Mas o muro de Berlim - cuja construção foi iniciada em Agosto de 1961 - passou a ser o símbolo por excelência da divisão europeia e da falta de liberdade dos alemães de Leste e dos restantes povos europeus por detrás da cortina de ferro.

A bandeira da liberdade iria servir de mote ao discurso do Presidente norte-americano, John F. Kennedy, quando, em 1963, visitou a cidade sitiada e para gáudio da multidão que o ouvia, declarou: Ich bin ein Berliner (eu sou um cidadão de Berlim), enfatizando deste modo o apego aos valores da liberdade e dando nota do empenho dos Estados Unidos em apoiar a cidade de Berlim contra a adversidade totalitária. Nessa altura, a democracia e a liberdade ainda eram bens raros para muitos europeus.

A queda do muro de Berlim, a 9 de Novembro de 1989, desencadeou uma reconfiguração do velho continente.

A 3 de Outubro de 1990, oficializa-se a reunificação alemã. Helmut Kohl tornou-se no líder da Alemanha reunificada. Sucedeu-lhe mais tarde Gerhard Schroder, de 1998 a 2005. Depois, Angela Merkel, cuja carreira política muito deve a Helmut Kohl, que a integrou nos seus governos logo após a reunificação. A Alemanha ganhou um protagonismo acrescido na cena internacional e no processo de construção europeia em particular.

Após a queda do muro de Berlim, foi-se assistindo ao desabamento do bloco soviético e à rápida democratização e liberalização de países europeus que, durante cerca de meio século, tinham estado debaixo da cortina de ferro. Porém, mais de vinte anos após a queda do muro, Berlim não é tanto o símbolo da liberdade evocada nos anos sessenta, mas antes o de uma capital cosmopolita símbolo do poder económico e financeiro que dita as grandes linhas da política europeia e até mundial.

A luta pela liberdade no continente europeu parece, pouco a pouco, destinada a fazer parte das estantes da história europeia. Simplesmente é a própria história quem ensina que a liberdade e a democracia não estão imunes a ameaças, podendo sucumbir perante forças adversas. Por vezes, a liberdade tem um preço bastante elevado, preço esse que muitos se dispuseram a pagar ao procurar atravessar o fortificado muro de Berlim. Talvez, por isso, valha a pena evocar o dia 13 de Agosto de 1961 como (mais) uma data funesta da divisão do continente europeu e da construção de um muro opressor dos povos livres.