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terça-feira, 4 de outubro de 2022

Rússia - A Revolução virá de dentro

 


A minha esperança é que uma revolução que venha de dentro da própria Rússia, traga a mudança efetiva de regime e devolva o poder ao povo. Verdadeiramente.

A contestação de rua, sobretudo de jovens, nas principais cidades, e apesar da dura repressão, são um sinal inequívoco de uma mudança anunciada.

Assim ela venha, rapidamente.


Nazaré Oliveira


Ver aqui:

https://exame.com/mundo/guerra-na-ucrania-mais-de-800-pessoas-sao-detidas-em-protesto-na-russia/

https://exame.com/mundo/guerra-na-ucrania-mais-de-800-pessoas-sao-detidas-em-protesto-na-russia/

https://pt.euronews.com/2022/02/25/protestos-na-russia-contra-a-guerra

https://www.publico.pt/2022/03/06/mundo/noticia/4300-detidos-russia-manifestacoes-guerra-1997793

https://www.tsf.pt/mundo/acordar-no-lado-errado-da-historia-portuguesa-conta-como-tem-sido-a-vida-em-moscovo-14663899.html

terça-feira, 27 de setembro de 2022

"Não há volta a dar-lhe": ou se é pela Rússia ou se é pela Ucrânia


"A ONU apresentou como confirmados desde o início da guerra 5.916 civis mortos e 8.616 feridos, sublinhando que estes números estão muito aquém dos reais".
Infelizmente, agravar-se-á este número com a mobilização de milhares de russos decidida por Putin para continuar o seu programa de crueldade e morte contra ucranianos e contra os que, mesmo russos, se opõem ao seu ideário extremista e belicista.
Esta guerra que Putin iniciou, porque de guerra se trata, também nos diz respeito e nos merece a maior atenção e apreensão, uma vez que estão em causa valores e princípios completamente espezinhados pelo mesmo, como o respeito pela soberania das nações, pela sua independência, pelas disposições da Carta das Nações Unidas, pelos Direitos Humanos e pelo Direito Internacional.
Nada justifica o que está a acontecer, exceto o desejo imperialista de um homem que, pela violência e pela força, negando a História recente da Europa a a partir de 1989, quer fazer renascer os horrores pelos quais passaram as ditas democracias populares e ressuscitar a velha e prepotente URSS.
Quem não critica abertamente Putin por tudo isto que tem feito também é como ele.
Neste contexto, e perante os factos e esta terrível realidade, não há lugar para os que, estranha e cobardemente se escondem na "abstenção" ou comodamente se viram contra os países que estão a ajudar a Ucrânia.
Isto nunca foi operação militar especial, mas guerra. Guerra!
"Não há volta a dar-lhe": ou se é pela Rússia ou se é pela Ucrânia.


 Nazaré Oliveira


Já agora, para consulta

https://www.europarl.europa.eu/news/pt/headlines/world/20220127STO22047/de-que-forma-a-uniao-europeia-apoia-a-ucrania

 https://youtu.be/LI5dbfr3Xp0 


terça-feira, 15 de março de 2022

O presidente Vladimir Putin está a abusar da História para justificar a invasão da Ucrânia

 




É com choque e horror que testemunhamos os acontecimentos que se desenrolam na Ucrânia, iniciados por ordem do presidente russo, Vladimir Putin, de invadir o país. 

O presidente Vladimir Putin está a abusar da História para justificar esta invasão e o ataque armado ao estado soberano da Ucrânia. Baseia-se numa visão unilateral da História que glorifica a Rússia e caracteriza erroneamente o povo ucraniano e o seu governo democraticamente eleito. Ele abusa da História para deslegitimar as atuais fronteiras da Ucrânia. 

Putin, a sua liderança e os mídia controlados pelo Estado, promoveram o sentimento anti-ucraniano ao disseminar falsidades centradas numa narrativa de “desnazificação” do governo. A equação da atual administração e do povo da Ucrânia com nazis e colaboradores nazis é a-histórica. As alegações de que a Ucrânia não tem tradição de Estado são falsas.

A EuroClio  posiciona-se firmemente contra o abuso da História – o uso da História com a intenção de enganar. O uso da violência que testemunhamos atualmente mostra até onde isso pode levar. Acreditamos que é imperativo que historiadores e educadores de História estejam vigilantes e se manifestem contra tais abusos sempre que possível, tanto dentro quanto fora dos ambientes educacionais.

Estamos solidários com o povo da Ucrânia, que viu o seu território invadido e a sua segurança ameaçada. Também estamos com todas as pessoas que, na Rússia, também estão em choque e protestam contra as ações do seu governo.

Os nossos pensamentos vão, em particular,  para os nossos colegas na Ucrânia que estão em perigo e com quem trabalhamos há décadas para promover o entendimento mútuo por meio da Educação. Esperamos vê-los em breve, com segurança. 

Que possamos testemunhar o fim deste sofrimento o mais cedo possível. 




Artigo disponível em https://euroclio.eu/2022/02/27/statement-against-the-abuse-of-history-and-in-solidarity-with-the-people-of-ukraine/ (consultado dia 15.03.2022)





sábado, 15 de junho de 2019

Refugiados

Disponível em https://www.publico.pt/2017/06/19/mundo/noticia/numero-de-pessoas-deslocadas-em-todo-o-mundo-bate-recordes-1776141 (consultado dia 15.06.2019)



Disponível em https://oglobo.globo.com/mundo/de-onde-vem-os-refugiados-por-que-17480704 (consultado dia 15.06.2019)

Disponível em https://sicnoticias.pt/especiais/afeganistao-capital-dos-errantes/2019-01-28-Os-refugiados-em-Portugal-e-no-mundo (consultado dia 15.06.2019)







Todos os que fogem da guerra, da fome, da miséria, da intolerância, e procuram uma vida em paz e com dignidade, todos têm direito a um abraço fraterno (asilo) e  todos devem dá-lo.
"Hoje eles, amanhã nós!" 
Os Direitos Humanos, a sua defesa, não se pode ficar por meras palavras. É preciso ação, ação e seriedade nas relações políticas e na diplomacia internacional.



Para os que se interessam por este tema, esta realidade, consultar:

quarta-feira, 13 de março de 2019

Greve estudantil PELO CLIMA




Greve estudantil climática soma cidades à convocatória


Está marcada para o mundo inteiro para a próxima sexta-feira. Em Portugal será a partir das 10.30. Há cada vez mais cidades com convocatórias de concentrações para a greve estudantil climática. Porque, dizem os jovens, “não há planeta B”.

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Os estudantes portugueses estão a responder ao apelo internacional para organizar uma greve climática estudantil que tem sido difundido com as hashtags #SchoolStrike4Climate e #FridaysForFuture.
Arouca, Aveiro, Arouca, Barcelos, Braga, Chaves, Coimbra, Covilhã, Évora, Faial, Faro, Flores, Fornos de Algodres, Funchal, Leiria, Lisboa, Ourém, Portalegre, Porto, Reguengos de Monsaraz, Santarém, Santa Maria, Setúbal, Tomar, Torres Vedras, Vila Real, Viana do Castelo têm já concentrações marcadas mas os organizadores convidam ainda mais a juntar-se à causa.
Nascido na sequência da intervenção de uma jovem sueca, Greta Thunberg, que protestou a partir de agosto em frente ao parlamento com o cartaz em que se lia “School Strike for Climate”, o movimento despoletou manifestações em vários ponto do globo: Alemanha, Austrália, Bélgica, Canadá, Finlândia, Itália, Irlanda, Reino Unido e Estados Unidos são apenas alguns dos exemplos.
Depois das manifestações em cada um dos países segundo os calendários decididos localmente, chegou o apelo para um dia de ação global a 15 de março. Um mapa provisório dos protesto pode ser encontrado aqui.(link is external)
 Em Portugal, os responsáveis pela convocatória fizeram um site (link is external)
no qual esclarecem que o movimento é “estudantil, internacional, pacífico e não-violento, determinado e organizado, descentralizado e apartidário”.



in https://www.esquerda.net/artigo/greve-estudantil-climatica-soma-cidades-convocatoria/60160

quarta-feira, 6 de março de 2019

Rui Pinto



Independentemente da forma como o fez, criticável, claro, e punível, há que reconhecer o facto do Rui Pinto, corajosamente, ter permitido que mais uma vez os "fora da lei" em Portugal (neste caso, no futebol), possam ser conhecidos, denunciados e ir à barra do tribunal. Ninguém é intocável, num Estado de Direito! Nem futebolistas, nem presidentes de clubes, nem juízes nem ninguém. Haja Justiça e equidade na forma como se aplica.

Vergonhosa e escandalosa a Justiça em Portugal.
Banqueiros-ladrões, patrões-ladrões, pedófilos, homicidas, corruptos engravatados, traficantes de droga e de pessoas... "sacanas sem lei"em liberdade ou à boa vida... Este jovem, corajoso, inteligente, que denuncia e põe a nu estas fraudes e que a polícia e a Justiça por isso mesmo devia proteger, é ameaçado de morte. 
Felizmente, há organizações internacionais no terreno que o estão a proteger.

Em Portugal ainda há muito paleio, muitas "cabeças bem falantes" (mas não bem pensantes) em todas as áreas da vida nacional. Ainda há "muita parra e pouca uva"! Ainda há muitos seguidistas e apoiantes da máxima “olha para o que eu digo, não olhes para o que eu faço”.

Muit@s "comentadeiros", muitos especialistas em tudo menos em Ética. Muitos padrinhos e afilhados. 

Muito Carnaval TODO O ANO.

Como disse a eurodeputada Ana Gomes, as autoridades portuguesas esmifram-se para prender o "perigoso" whistleblower RuiPinto que denuncia corruptos, no entanto, deixam "tranquilitos e à solta criminosos e corruptores do gabarito de Ricardo Salgado e capangas!".



Nazaré Oliveira


sábado, 2 de março de 2019

Os Loucos da Rua Mazur



Despojos de dignidade. Talvez seja esta uma forma arriscadamente simplista para apresentar o mais recente romance de João Pinto Coelho, que retrata a vida de uma pequena comunidade situada na Polónia antes, durante e depois da guerra e o contexto de um massacre perpetrado por cristãos relativamente a judeus, gente que antes convivia e se relacionava em contextos intimistas e pacíficos.
Muito se tem escrito e romanceado sobre a II Guerra Mundial, quase sempre a partir do comportamento invasor alemão, quase sempre com papeis consensualmente atribuídos a vítimas e a agressores. “Os Loucos da Rua Mazur” (Leya, 2017), de João Pinto Coelho (Prémio Leya 2017), apresenta uma abordagem diferente deste momento da história.
No nordeste da Polónia, entre 1935 e 1941, acompanhamos a vida de três amigos, jovens adolescentes, que vêm as suas vidas clivadas pelos acontecimentos geopolíticos de então e pela herança religiosa e cultural que transportavam consigo. Yankel, judeu, cego, torna-se décadas mais tarde livreiro em Paris, capaz de encontrar imagens para retratar a realidade.
Eryk, católico, maquiavélico, revela-se um improvável escritor que se disfarça nas personagens que cria, ensaiando a própria vida nos romances. Shionka, uma muda funcional que se torna relatora e editora, voz de memórias que agridem quem as recupera. O foco é surpreendente, indo com detalhe a parcelas da vida de um povo que se viu duplamente invadido e dividido pelos dois invasores, alemães e russos, como pela fragmentação social e religiosa surgida na própria sociedade polaca.
Entre Setembro de 1939 e o fim do conflito mundial, a Polónia viu-se multiplamente dividida entre o ressentimento dirigido às forças alemãs e soviéticas, o registo de alianças e a sobrevivência relativamente aos invasores, vítima de um terror em massa e de um esquema de dilação e denúncia.
Durante anos, os polacos viram-se privados de dignidade e de confiança a determinada altura em si próprios, tal o efeito pernicioso da dilação, perseguição e aniquilação promovida pelos ocupantes e efectivada, em certos momentos, por eles próprios, sabendo que a qualquer momento qualquer pessoa poderia ser alvo do extermínio, fosse qual fosse o pretexto, religioso, genético, étnico ou tão só estético, qual busca da perfeição. Apontam-se para cerca de seis milhões de pessoas as vítimas polacas mortas durante a invasão do país no período de 1939 a 1945. Muitos sobreviveram tornando-se refugiados no seu próprio país.
“Os Loucos da Rua Mazur” dá voz e visibilidade a uma forma especialmente perversa do domínio ocupante, nazi e soviético, aquela que conseguiu corromper as bases da convivência e confiança comunitária, substituindo-a por dilação, denúncia e anti-semitismo levado ao extremo, entre os próprios polacos, retratando a forma como muitos foram exterminados fora dos campos e dos guetos. Já em 2001, em Paris, cada um dos três protagonistas, fisicamente sobreviventes, mas emocionalmente esfarrapados, dão corpo à resiliência, reserva e dignidade do povo polaco. Ao recuperarem as memórias da inverosimilhança de episódios passados, vividos pelos próprios constatam que “quem viu de frente o inferno, não pode querer lá voltar nem contar o que encontrou”.
Longe de ser consensual, especialmente pela visão que o autor apresenta da fragmentação da sociedade polaca, trata-se de um livro que rompe com a unilateralidade dominante de apresentação destes acontecimentos históricos. Fá-lo depois de, entre outros projectos na área, ter integrado acções do Conselho da Europa em Auschwitz e trabalhado de perto com vários investigadores do Holocausto. 
Como relato com fundamento histórico, a narrativa de João Pinto Coelho serve-se da magia das palavras e da escrita, das letras e dos sons, independentemente da sua forma, como forma de sobrevivência e renovação de uma memória que se deseja imparcial e profundamente subjectiva. Contraditório? Talvez. Impossível? Não necessariamente. Leiamos “Os Loucos da Rua Mazur” e constatemos a forma como as cinzas desta memória assentaram.


Por Francisca Moura , in http://deusmelivro.com/mil-folhas/os-loucos-da-rua-mazur-joao-pinto-coelho-28-12-2017/em 28/12/2017.

EU VOTO!


segunda-feira, 6 de agosto de 2018

O (mau) exemplo que vem de Espanha



Segundo uma notícia da ANDA, de 1 do corrente mês, só neste Verão serão vítimas de tortura e assassinato em festivais espanhóis mais de 60.000  mil animais.
“Não podem comemorar sem maltratar nenhum animal?”. Esta é a pergunta lançada pela organização Equo Animals, que usa as redes sociais para denunciar as atrocidades a que milhares de animais são submetidos na Espanha”.
“Com a chegada desta estação, explodem festas tradicionais que consistem em práticas bárbaras e incompreensíveis de maustratos a animais, como o touro enamorado, o touro de fogo e as ‘batalhas rats puing’ nas quais ratos mortos são lançados contra as pessoas”.
Gente abjeta! Desumana gente que isto promove, que a isto assiste e que isto aplaude.

Se as pessoas quisessem, boicotavam este e outros países, esta terra e outras terras, não comprando os seus produtos*, não os visitando enquanto estas tradições se mantivessem, como as touradas, todas elas ligadas ao sofrimento e à crueldade que se inflige, sádica e continuamente sobre estes seres indefesos.

Rápido se esquecem que estes crimes horrendos estão a ser cometidos aqui, na Europa. Na Europa Comunitária que esquece os pilares em que assentou e assenta a sua formação  e que continua  a pavonear-se e a autosuperiorizar-se com o seu mais do que bafiento  europocentrismo e a sua civilizacional arrogância.

Na Europa que critica mas que não dá o exemplo. Na Europa que foi a semente do diabo em 1914, em 1939. Na Europa que explorou e escravizou e que também cometeu genocídio.

A propósito, algum (a) de vocês escreveu a um dos noss@s eurodeputad@s sobre isto (e não só)? Se el@s não cumprem o seu dever, cumpramos nós o nosso.
Mais do que um dever cívico, a cidadania é um imperativo moral.

Nazaré Oliveira


*Como faço em Portugal, por exemplo, com Barrancos.



terça-feira, 26 de dezembro de 2017

Hannah Arendt. A passagem por Lisboa a caminho da liberdade

A casa onde viveu, em Lisboa

Hannah Arendt

Sem pátria durante mais de duas décadas, a filósofa alemã refugiou-se em Lisboa, em 1941, até conseguir partir para os Estados Unidos. Os deputados do Livre na assembleia municipal propuseram agora que se assinale a casa onde Hannah Arendt viveu. Para que não se esqueça o passado e se reflicta no presente.

Talvez muitos não saibam da curta estada de Hannah Arendt por Portugal. Fugida da França ocupada pelo nazismo, a filósofa, judia e alemã, chegou a Lisboa, em Janeiro de 1941, acompanhada pela mãe e pelo marido, o poeta Heinrich Blücher. Estatuto: refugiada. 
Os deputados do Livre na assembleia municipal querem que se perpetue a passagem da filósofa por Lisboa. Por isso, na reunião de terça-feira daquele órgão, apresentaram uma recomendação à câmara municipal, que foi aprovada por unanimidade, para que a casa onde Hannah Arendt viveu na capital, entre Janeiro e Maio de 1941, seja identificada com uma placa ou um pequeno monumento. Para que se celebre a obra vasta da filósofa, para quem ser alemã e judia, com um pensamento livre das amarras do regime, se revelou uma combinação perigosa. 
Ainda antes de chegar a Lisboa, em 1933 e com 27 anos, as perseguições aos judeus e o seu envolvimento numa organização sionista obrigaram Arendt a fugir da Alemanha, depois de ter sido presa. Hitler ascendeu ao poder, a filósofa acabou por ir parar a Paris, cidade que havia de ser tomada pelos nazis em 1940. Foi colocada num campo de internamento, uma espécie de campo de refugiados, mas conseguiu fugir.
Como destino tinha os Estados Unidos, para onde havia de conseguir fugir em Maio de 1941 (e onde acabaria por morrer, em 1975). Mas não sem antes passar por Lisboa, como tantos judeus, e se estabelecer numa casa, no número 6 da rua da Sociedade Farmacêutica, hoje na freguesia de Santo António, que desemboca junto à entrada traseira do Hospital de Santa Marta, no coração da cidade.  
Este é hoje um edifício recuperado, de linhas sóbrias, amarelado, e com quatro andares que parece manter-se destinado à habitação. A fachada é rasgada ao centro por varandas balaustradas em ferro. Não fossem os azulejos verdes, na base, o painel de azulejos azuis e brancos no coroamento da casa, e a cabeça de cavalo acima da porta da garagem, e o edifício passaria despercebido entre os outros. 
“É uma questão simbólica porque Hannah Arendt é uma das maiores filósofas do século XX”, refere o deputado do Livre, Paulo Muacho, ao PÚBLICO. “Com o drama dos refugiados que continua bastante presente, e sem resolução à vista, e todos os ataques aos direitos humanos a que temos assistido, consideramos que era importante manter a memória daquilo que se passou no passado e do que esta figura da Hannah Arendt representa”, continuou. 
Também  ela foi apátrida durante mais de duas décadas, quando a Alemanha lhe retirou nacionalidade e a privou, por isso, dos seus direitos fundamentais. O que, para ela, era o “fundamental ”, diz Hermenegildo Borges, professor de Teoria Política na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. 
“Andar de terra em terra, sem direitos, sem o direito de cidadania, que para ela é fundamental, essa experiência limite de privação dos direitos, levou-a a perceber que havia a necessidade de refundar o pensamento político”, acredita o professor, perante a “fragilidade da racionalidade ocidental que se pensava livre, democrática”.
Foi essa vulnerabilidade vivida em Lisboa, e em outras cidades da Europa e dos Estados Unidos, que terá inspirado uma das mais relevantes obras da filósofa, o manifesto “Nós, Refugiados”.
“Foi um pensamento reflexivo sobre uma experiência de sofrimento que ela viveu. Não foi uma construção intelectual. Ela viveu a falência do ocidente, [a ascensão] do totalitarismo nazi, do fascismo e do estalinismo, numa altura em que estava em marcha a consolidação da democracia”, Hermenegildo Borges. 
“Acho esta recomendação do Livre extremamente pertinente”, admite o professor. Porque o seu pensamento talvez esteja mais actual agora do que há 60, 70 anos, admite, e porque “muitos dos seus receios se confirmam no momento presente”. 
“O direito a ter direito é o direito de cidadania”
Para o docente, a filósofa deixou-nos o “desafio constante” de estarmos “permanentemente em controlo”, vigilantes, para que não haja desvios de regimes democráticos. Porque os perigos e ameaças continuam, não sob a forma de regimes totalitários, como a história os descreveu, mas sob a forma de “ataques terroristas ou do radicalismo islâmico”, elenca. Assim como a escalada da violência, o renascimento de nacionalismos e do extremismo de direita, os radicalismos a sobreporem-se aos ideais democráticos, a crise dos refugiados. 
“Imagine as pessoas que atravessam o Mediterrâneo e chegam sem documentos à Europa. Elas têm a dignidade da pessoa humana, mas enquanto não adquirem o direito de cidadania andam a ser enjauladas, atrás de muros”, aponta Hermenegildo Borges. “O direito a ter direito é o direito de cidadania. Sem cidadania não posso aspirar a ter direitos humanos”, completa. 
O grande “desafio contemporâneo” que Hannah Arendt nos deixa, atira o professor, é o de “sermos capazes de integrar os que chegam e vivermos em comunidade com diferentes credos, culturas, num espaço que é defendido com fronteiras rígidas”, e ter a consciência de que “a diversidade faz riqueza e que a homogeneidade faz pobreza”. 
“O património comum da humanidade é uma riqueza”
As questões da ecologia e do desenvolvimento sustentável eram já fundamentais no pensamento de Hannah Arendt, nota o professor, e vêm ao encontro das “necessidades contemporâneas”. 
“O homem só habita a Terra se a transformar artificialmente, para seu conforto. O homem não consegue viver na Natureza tal como ela nos foi dada. O homem tem que construir pontes, casas, esgotos, carros, comboios, auto-estradas”, explica. Só que “a vontade do homem de transformar o mundo não deve esgotar os recursos da Terra”. 
É preciso caminhar, portanto, para uma “sociedade qye não provoque o esgotamento dos recursos, que não polua nem destrua pela vontade de criar riqueza”, refere o professor, dando imediatamente o exemplo da decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de retirar o país do Acordo de Paris sobre as alterações climáticas. “São [acordos] essenciais à sobrevivência do planeta e isso só mostra que Trump ainda não aprendeu com a lição da Hannah Arendt”.
Por isso, a perda de património comum, como “a destruição de estátuas, de monumentos, de coisas antiquíssimas, é uma perda para a humanidade extraordinariamente grande", considera o professor. “Só podemos fruir do ar puro se todos os países do mundo se regerem pelo mesmo princípio da não poluição”, exemplifica. 
Segundo explica Hermenegildo Borges, Hannah Arendt elege como condição humana fundamental a “pluralidade”. “Não é o homem sozinho, branco, que habita o mundo. É uma diversidade de povos de culturas. É o homem no seu plural”, para lá dos temperamentos de cada um. 
Além da identificação da casa, assinalando a passagem da filósofa, o deputado Paulo Muacho admite que o partido gostaria de propor também a criação, naquela zona, de um largo que ficaria o nome da filósofa. Onde, quem sabe, se pudessem discutir estas questões que são globais, começando por nos lembrarmos sempre, remata Hermenegildo Borges, que “de cada vez que cai uma bomba sobre uma biblioteca de Bagdad é a destruição de alguma coisa que é minha, que é de todos nós" que está a acontecer.

https://www.publico.pt/2017/12/23/local/noticia/hannah-arendt-a-passagem-por-lisboa-a-caminho-da-liberdade-1797052

Enquanto a receita xenófoba der votos, é preciso coragem para fazer como Emmanuel Macron ou Angela Merkel


Bom Natal!

Enquanto a receita xenófoba der votos, é preciso coragem para fazer como Emmanuel Macron ou Angela Merkel. 1. Angela Merkel e os seus pares europeus têm direito a umas merecidas férias nesta época natalícia que as sociedades europeias, livres, prósperas e relativamente justas, gozam “religiosamente”. Aliás, é melhor que recuperem forças, porque 2018 vai ser um ano em que muita coisa se joga sobre o futuro dos europeus e sobre o lugar que a História dará aos seus líderes.
 A chanceler continuará a ser decisiva, mesmo que a opinião pública alemã a veja com um olhar bastante mais crítico do que é vista, ironia das ironias, por muitos governos europeus.

O Natal é tempo de esperança e, talvez por isso, ainda acredito no vaticínio de Wolfgang Munchau, colunista do Financial Times, quando, no auge da crise, manifestou algum optimismo com um argumento aparentemente imbatível: Merkel não vai querer ficar na História como a chanceler que veio do Leste para destruir a União Europeia. Fará o que for preciso ao mais baixo custo e no último momento. Mas fará. Espera-se que aproveite o seu último mandato para fazer mais do que igualar os 16 anos que Helmut Kohl esteve no poder.

Com a sua quarta vitória consecutiva, ainda que bem mais modesta, e com o fracasso da “coligação Jamaica”, alguma imprensa internacional, da Spiegel ao Wall Street Journal, começou a escrever-lhe o obituário político. Porventura cedo de mais. Precisa de um bom acordo com o SPD e os sociais-democratas vão ter de baixar um pouco o tom para que isso seja possível. A chanceler sempre justificou a forma como geriu a crise do euro, impondo uma austeridade cega aos infractores do Sul, com duas preocupações de longo prazo: impedir o nascimento de um partido de extrema-direita na Alemanha, justamente o país onde a sua existência seria mais perturbadora; ter em atenção a catastrófica demografia alemã, contendo a despesa pública e abrindo as portas a gente vinda de fora para colmatar a baixíssima taxa de natalidade e garantir as pensões e a prosperidade.
Os estudos sobre a demografia europeia, mantendo-se as tendências actuais, indicam que a França e o Reino Unido vão aumentar a sua população nas próximas décadas, ultrapassando a Alemanha, que verá uma redução acentuada. Pode dizer-se que a chanceler falhou num destes objectivos, com a entrada no Bundestag de um partido de extrema-direita, elegendo 95 deputados. No outro, o resultado é misto. A chegada de um milhão de refugiados vindos da guerra da Síria e de outros conflitos nas fronteiras da Europa, aos quais a chanceler abriu as portas com generosidade mas também com racionalidade, acabou por criar-lhe o seu maior problema político.

 2. A vitória de Macron, com um programa assente na defesa convicta da Europa e de tudo o que ela representa, foi uma alma nova, mas não chegou, como se tem visto, para estancar a vaga populista e xenófoba que atravessa a Europa, com altos e baixos, mas muito longe ainda de regredir. É a alma da integração europeia que está em causa: o nacionalismo ou a abertura aos outros; a xenofobia ou a capacidade de integrar; o regresso das fronteiras ou a pergunta de Monnet sobre essa linha imaginária a que chamamos fronteira, que torna inimigos os que estão de um lado e do outro. Hoje, a Polónia é o lugar onde esse confronto de ideias se trava de forma mais visível. A resposta europeia é tudo menos fácil. A maioria qualificada necessária para a aplicação de sanções ao Governo de Varsóvia, por sistemática e persistente violação das regras do Estado de Direito, pode ser anulada por um veto, que Budapeste garante que utilizará. O fenómeno identitário regressou quase sem o vermos chegar. Com uma força com que não contávamos. A instabilidade passou a ser o estado natural das democracias europeias, o que é normal perante a crise que a Europa viveu e a transformação acelerada que o mundo está a viver. Nada poderia continuar como dantes. A questão é saber como controlar esta transição sem pôr em causa aquilo que é essencial. Não estamos em modo de Estados Unidos da Europa, como o líder social-democrata alemão, Martin Schulz, se lembrou de reclamar. Mas não podemos ficar indiferentes perante o regresso de uma ideologia identitária e nacionalista que, como diz Joschka Fischer numa entrevista à Spiegel com uma brutalidade invulgar, os alemães conhecem demasiado bem. “Sabemos como este filme termina.” O que vai acontecer na Polónia é ainda uma incógnita. Dispensa-se qualquer arrogância iluminada de Bruxelas. Frans Timmermans, vice-presidente da Comissão, não foi por aí. Apelou em vez de exigir. Explicou em vez de ditar. Uma boa novidade. Mas, de repente, os males que devoraram a Europa na primeira metade do século passado ousam exprimir-se na praça pública sem qualquer espécie de vergonha. É isso que é perturbador. É isso que dificulta a análise e nos faz hesitar sobre as palavras que devemos aplicar. Populismo? Bom e mau? Nacionalismo? Extrema-direita? Direita radical? Exageramos ou subestimamos? São os mesmos demónios que assolaram a Europa, só que com uma patine “civilizada”? Ou forças radicais que não põem em causa a democracia?

 3. Na Áustria, Sebastian Kurz, o líder dos sociais-cristãos que ganhou o título de “rapaz maravilha” graças aos seus 31 anos de idade, formou uma coligação de governo com o “Partido da Liberdade” (um nome que me custa sempre escrever), xenófobo e populista que, há bem pouco tempo, ainda se declarava antieuropeu (exigia um referendo como o britânico) e que agora, aparentemente, se rendeu ao europeísmo moderado do novo chanceler. Herdeiro do velho partido de extrema-direita de Joerg Haider que assustou a Europa em 2000, ainda que expurgado das referências anti-semitas e nazis do seu fundador, não pode ser visto como um partido que partilhe os valores universais de que a integração europeia é portadora, porque não havia nem há outro modo de a conseguir. A sua cartilha política é a do costume: contra os imigrantes, em particular os islâmicos, indo ao encontro do que pensam muitos eleitores. E nem se pode dizer que a culpa é do centro-direita de Sebastian Kurz. Perante os resultados eleitorais, que lhe deram a vitória (32%) contra um pouco mais de 27% para os sociais-democratas, que lideraram a “grande coligação” que governou Viena nos últimos anos, o líder do centro-esquerda também tentou uma coligação com a extrema-direita. A Áustria recebeu um grande número de refugiados da Síria, que atravessaram o chamado corredor balcânico. Muitos ficaram na fronteira, que o Governo encerrou, outros conseguiram chegar ao “paraíso” alemão e outros, ainda, ficaram. O Estado social austríaco continua a ser bastante generoso. Os austríacos bastante menos. Há pequenos sinais inquietantes. Por exemplo, o novo Governo de Viena quer oferecer às populações de língua alemã que vivem desde a guerra no Tirol italiano a nacionalidade austríaca. Por que carga de água? Kurz moderou a proposta do seu parceiro de coligação, dizendo que só o fará em negociação com o governo italiano. O líder da extrema-direita, Heinz-Christian Strache, também segue o padrão dos seus congéneres europeus em matéria de amizades internacionais: não esconde a sua inclinação por Putin. Mais uma vez, Kurz aceita uma versão mais moderada: tentará levar os seus parceiros europeus a levantar as sanções contra a Rússia.

 4. Enquanto a receita xenófoba der votos, é preciso coragem para fazer como Emmanuel Macron ou como Angela Merkel. É por isso que ambos estão hoje tão fortemente ligados pela mesma responsabilidade política de defender a moderação, a tolerância e a abertura ao mundo que ditará o destino da Europa. É por isso, também, que países como Portugal, até agora imunes ao contágio da xenofobia e do nacionalismo, ganham uma nova responsabilidade política, como se viu com a escolha de Mário Centeno para presidir ao Eurogrupo. Não foi só cumprir as metas do défice. Foi também a compreensão desse papel de moderação política e da criação de alternativas capazes de encontrar um terreno comum.


 5. Apenas uma nota final. A vitória de Inés Arrimadas nas eleições da Catalunha é o retrato perfeito da autêntica democracia europeia: uma andaluza, casada com um separatista catalão, que representa um partido de centro liberal e que não tem medo de defender o que pensa. O “independentismo” dos ricos não é um fenómeno novo. A Liga Norte da Lombardia, uma das regiões mais ricas da Europa, também não quer pagar para o Sul de Itália, muito mais pobre. No fundo, é mais ou menos a mesma coisa, mesmo que em Barcelona tenha a marca da esquerda radical e em Milão da velha direita nacionalista. Tenhamos esperança.



 Teresa de Sousa tp.ocilbup@asuos.ed.aseret - Jornal PÚBLICO

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sábado, 29 de julho de 2017

As crianças foram as mais afetadas pelo aumento da pobreza ou exclusão social



Não me surpreende, infelizmente, mas segundo uma notícia da RR de hoje, as crianças foram as mais afetadas pelo aumento da pobreza ou exclusão social.

Dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) divulgados esta quinta-feira referem que em 2013 mais de ¼ dos portugueses vivia em privação material, isto é, muito muito pobre, e que, em relação às crianças, a intensidade da pobreza para este grupo aumentou 6,2 pontos percentuais em 2012 face ao ano anterior.

Se considerarmos que um agregado está em privação material quando não tem acesso a pelo menos três itens de uma lista de nove relacionados com necessidades económicas e bens duráveis, a saber, atrasos no pagamento de rendas, empréstimos ou despesas correntes da casa, não conseguir comer uma refeição de carne e peixe de dois em dois dias, não ter carro, televisão ou máquina de lavar roupa ou não conseguir fazer face ao pagamento de uma despesa inesperada, entre outros, é simplesmente aterrador pensar como estamos e como vamos continuar a estar.

Os resultados definitivos do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento realizado em 2013, sobre rendimentos de 2012, referem que a população infantil apresenta, desde 2010, riscos de pobreza ou exclusão social superiores aos da população em geral.

Os dados divulgados neste dia por ocasião da comemoração do Dia Internacional da Erradicação da Pobreza (17 de Outubro), mostram que as crianças foram as mais afetadas pelo aumento da pobreza ou exclusão social (mais 3,8 pontos percentuais entre 2012 e 2013).
De acordo com este inquérito, 18,7% das pessoas estavam em risco de pobreza em 2012, o valor mais elevado no período iniciado em 2009 (entre 2009 e 2011 o risco de pobreza afetava, em média, cerca de 17,9% da população residente).

Até quando esta realidade cada vez mais medonha e mais trágica para os pobres?

Até quando esta política de austeridade cruel e desumana, implacável para com os que sempre viveram à espera de melhores dias? 

Até quando este fosso cada vez mais cavado entre ricos e pobres?


Portugal está muito orgulhoso de ter conseguido uma 'saída limpa' do programa de resgate. É uma 'saída limpa' de um ponto de vista económico e financeiro mas é uma saída muito dolorosa para muita gente, disse Salil Shetty, da Amnistia Internacional, em entrevista à agência Lusa.

domingo, 2 de julho de 2017

Simone Veil

Simone Veil (1927-2017), a sobrevivente que fez história pelas mulheres

Foi protagonista da lei que em 1974 despenalizou o aborto, europeísta convicta, magistrada e uma das figuras políticas mais amadas de França. Antes de tudo isso, sobreviveu ao inferno dos campos de concentração.


Foi a 26 de Novembro de 1974 que Simone Veil subiu à tribuna da Assembleia Nacional francesa para falar em nome das 300 mil mulheres que todos os anos abortavam clandestinamente no país. “Não podemos continuar a fechar os olhos”, disse a então ministra da Saúde, num discurso que seria repetido por muitas outras depois dela e que a França voltou a recordar no dia em que chorou a morte de uma das suas personalidades políticas mais amadas.
Há muitas dimensões nos 89 anos de vida de Veil, a jovem judia deportada para os campos de concentração nazi que sobreviveu para se tornar magistrada e ministra, a combatente pelos direitos reprodutivos das mulheres, a primeira Presidente do Parlamento Europeu eleito por sufrágio universal, a constitucionalista e voz empenhada em todas as causas em que acreditava.
“Possa o seu exemplo inspirar os nossos compatriotas, que nele encontrarão o melhor de França”, reagiu o Presidente Emmanuel Macron, logo depois de a família ter anunciado a sua morte. “Que a sua vida exemplar permaneça uma referência para todos os jovens de hoje. Era uma mulher excepcional que conheceu as maiores felicidades e as maiores tragédias na vida”, escreveu o antigo Presidente Valéry Giscard d'Estaing, que em 1974 lhe entregou a pasta da Saúde e a tarefa – então quase suicida, sobretudo para um Governo de direita – de fazer aprovar a despenalização da interrupção voluntária da gravidez com que ele se comprometera na campanha.
Ela não o desiludiu, mesmo que já no final da vida tivesse confessado que acreditava que “não iria durar mais de umas semanas” no cargo, o tempo necessário “para cometer alguma asneira”.
Mas em vez de insegurança, mostrou convicção, mesmo perante os piores insultos. “Nenhuma mulher recorre de ânimo leve ao aborto. Ele continuará a ser sempre um drama”, afirmou a jovem ministra, perante um hemiciclo onde apenas nove dos 490 lugares eram ocupados por mulheres. O debate demorou três dias, mas a lei – que assumiria o seu nome – acabou por ser aprovada por 284 votos a favor, fazendo de França o primeiro país de maioria católica a despenalizar a IVG. “Se sinto orgulho? Não, mas sinto uma grande satisfação porque isto era muito importante para as mulheres, porque era um problema que me era caro há muito tempo”, responderia anos mais tarde.

Sobrevivente
O carácter que a definiria – “uma rocha”, na descrição do Libération – atribuiu-o ela própria à sua infância e, sobretudo, à experiência inimaginável do Holocausto, que foi a sua companhia permanente. “Tenho a convicção que no dia em que morrer, será na Shoah que pensarei”, disse ao Le Monde em 2009.
Simone nasceu em 1927, a mais nova de quatro filhos de uma família judia burguesa – o pai um arquitecto premiado, a mãe forçada pelas regras da sociedade a abandonar os estudos de Química para cuidar da família. Uma infância feliz brutalmente interrompida pela II Guerra e a invasão nazi. A família foi presa e deportada em Março de 1944, o pai e o irmão num comboio com destino à Lituânia, onde acabariam por morrer em circunstâncias nunca apuradas; ela, a mãe e uma das irmãs enviadas para Auschwitz-Birkenau. Sobreviveu aos trabalhos forçados – contou que foi protegida por uma guarda prisional que lhe disse que “era demasiado bonita para morrer ali” – aos quilómetros da fuga forçada através da neve que terminou no campo de Bergen-Belsen, onde a mãe, doente com tifo, morreria dias antes da libertação.
Com o número de prisioneira – 78651 – para sempre tatuado no braço, Simone regressou a França, matriculou-se na Sciences Po, onde conheceu Antoine Veil, seu marido em pouco tempo. Tiveram três filhos e foi então que, após duras discussões conjugais, convenceu Antoine de que não iria ficar em casa. Ele aceitou na condição que ela fosse magistrada e sua ascensão foi imparável: em 1969 foi nomeada conselheira do então ministro da Justiça, no ano seguinte tornou-se a primeira mulher secretária-geral do Conselho Superior da Magistratura. Em 1974 chegaria o convite que marcou a sua carreira política.

Europeísta convicta
Alguns sobreviventes do Holocausto “ficaram para sempre esmagados pela imensa catástrofe. Outros demonstraram uma energia incrível, como se o facto de terem filhos ou dedicarem-se a uma profissão constituísse uma espécie de vitória sobre o nazismo, como se quisessem que os seus pais desaparecidos tivessem orgulho neles. Simone Veil pertencia sem dúvida a estes últimos”, escreveu Serge Klarsfeld, amigo e presidente da Associação de Filhos e Filhas dos Judeus Deportados de França, citado pelo Le Monde.
Mas a experiência do Holocausto tornou também Simone Veil numa europeísta convicta. “A Europa arrastou por duas vezes o mundo inteiro para a guerra. Ela deve encarnar agora a paz”, era uma das suas favoritas, recorda o Libération. A pedido de Giscard d'Estaing concorre às primeiras eleições europeias e acaba por assumir a presidência do Parlamento Europeu. Jacques Delors, futuro presidente da Comissão Europeia, recorda que entre o entusiasmo desses dias iniciais da integração europeia Simone Veil “demonstrou ter uma qualidade rara, a do discernimento”, sublinhando sempre as dificuldades do caminho.
Regressaria ao Governo francês em 1993, mas seria no Conselho Constitucional, a mais alta instância judicial, que passaria a última década da sua vida activa. Acumulou distinções – a Legião de Honra, a Academia Francesa, a presidência da Fundação para a Memória da Shoah. Nos últimos anos, a idade e a doença foram-na afastando da vida pública, mas não do imaginário dos franceses, que continuavam a considerá-la uma das figuras políticas mais populares.
“Continuo a acreditar que vale sempre a pena batermo-nos por qualquer coisa. Digam o que disserem, a humanidade está hoje mais suportável do que no passado”, afirmou há alguns anos ao Libération. “Acusam-me de ser autoritária. Mas só me arrependo de não me ter batido por esta ou aquela questão”.