«Vejo-te ainda, Mãe,
de olhar parado,
Da Pedra e da tristeza, no teu canto,
Comigo ao colo, morto e nu, gelado
Embrulhado nas dobras do teu mando» (Torga, Miguel)
«Ó visão, visão triste e piedosa!
Fita-me assim calada, assim chorosa…
E deixa-me sonhar a vida inteira» (Quental, Antero de)
«Oh Virgem de Nazaré,
Oh Mãe de Jesus
Lírio aberto aos pés da cruz,
Cujas pétalas de luz
Vertem lágrimas de fé» (Conde de Monsaraz, [Papança, António
Macedo])
«Junto da cruz, que estremecia ao
vê-la
Chorou, baixinho, a Mater Dolorosa:
E a terra, em volta, soluçou com ela» (Oliveira, António
Correia de)
O Sinédrio decretara a Sua morte. Nestes passos dramáticos em direcção à
humilhação, Jesus prepara-se para a doação total. Os doze esperam com ânsia
uma palavra do Mestre.
«Levanta as mãos ao
Céu vasto e piedoso
Vara-lhe o seio tenebroso espinho
Caem gotas, de sangue precioso,
De suor, nas violetas do caminho» (Leal, A. Gomes)
Mesmo de poetas descrentes, a beleza da sua linguagem expõe um sentimento
religioso. Ao longo dos séculos, a Paixão e Morte de Cristo são fonte
inspiradora da poesia. Luís de Camões – uma das almas lusitanas – tem elegias
onde canta a Paixão do Filho do Homem.
«Aquele corpo tenro e
delicado,
Sobre todos os santos sacrossanto,
De açoutes rigorosos flagelados» (Camões, Luís)
O poeta limiano, Diogo Bernardes considera-se culpado daquela morte. A
luminosidade das suas palavras como que formalizam um pedido de desculpas. O
lirismo religioso deste poeta do século XVI é marcado pela sinceridade.
«Eu vos crucifiquei,
eu vos vendi,
Eu vos neguei mil vezes, que não três
Eu fui o que esse lado vos abri!» …
«Por eles (os meus pecados), meu senhor, te vejo estar
Crucificado nesse duro lenho» (Bernardes, Diogo)
Partindo das palavras do Evangelho de S. João (19, 1-3), o poeta da Arrábida
ilustra a paixão de Jesus com a luminosidade de um místico. Frei Agostinho da
Cruz assume a culpa do sofrimento e morte de Jesus.
«Eu fui, eu sou
Senhor, o que vos pus
Nesse duro madeiro pendurado,
Donde morreis por mim, doce Jesus» (Cruz, Frei Agostinho)
Quando medita nas chagas de Cristo, Diogo Bernardes pede mesmo à sua alma
que, por amor delas, se arrependa dos seus pecados e dê início a uma vida
nova.
«Quando meus olhos
nessas chagas ponho
E não me vejo em lágrimas banhado
Corrido fico, todo me envergonho» (Bernardes, Diogo)
José Régio aborda os últimos passos de Jesus num registo diferente. Lamenta
ter nascido tarde, mas considera que Ele foi crucificado pelos homens.
«Por isso choro em mim a mágoa
verdadeira
De ter nascido tarde, e só te vir achar,
Feito em marfim, metal, pedra madeira,
No cimo dum altar»
……
«O Cristo, ao alto, alonga os magros braços nus
Por sobre a escuridão do rancho desolado
Que segue, ao som da marcha, o seu Jesus
Por nós crucificado» (Régio, José)
Preso e atado à cruz, a multidão gritava: Crucifica, crucifica. A humilhação
estava patente naquele rosto.
André Dias explica a crueldade daquela morte.Este poeta dos séculos XIV e XV (1348-1437) coloca nas suas palavras a
injustiça daquele tribunal.
«E todos bradavam com grande voz e
alta:
- Crucifica! Crucifica este falso profeta
E morra sobre a cruz morte cruel e feia,
Que jamais não engane toda a nossa gente» (Dias, André)
Depois de saber que tudo estava consumado, Jesus disse: «Tenho sede».
Teve como bebida, o amargo vinagre.
«Mas tem sede o Rabi. Um, mais
cruel,
uma esponja, em caniço pontiagudo,
toda em fel ensopou. – Ora, este fel
amarga mais o mestre do que tudo» (Leal, A. Gomes)
Do alto da cruz, os seus olhos sem brilho contemplavam Jerusalém. Após ter
tomado o vinagre, Jesus exclamou: «Tudo está consumado». E, inclinando a
cabeça, rendeu o Espírito.
«Filhos de Cristo, consumou-se
agora
O horrendo crime de Israel, na cruz.
Trémula se abre a terra; o sol descora
A igreja chora, - que morreu Jesus» (Ribeiro, Tomás)
A noite ia tombando de hora a hora cheia de assombro e cósmica tristeza. Esta
morte foi vida. Foi um rasgão no tempo.
«Tu morreste por nós na cruz da
afronta
E o sangue derradeiro
Derramaste do alto do madeiro,
Jesus, filho de Deus, Deus Verdadeiro
Aos crimes do homem não lançaste a conta
Inocente cordeiro
Quando foste no alto do madeiro
Lavar com sangue o último e o primeiro» (Garret, Almeida.)
Com a morte e ressurreição, a lanterna da vida brilha e alimenta a árvore
frondosa do cristianismo.
«Meu Deus, aqui me tens aflito e retirado
Como quem deixa à porta o saco para o pão.
Enche-o do que quiseres. Estou firme e preparado.
O que for, assim seja, à tua mão
Tua vontade se faça, a minha não» (Nemésio, Vitorino)
fonte: http://www.agencia.ecclesia.pt/
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