quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Pelo menos Warren Buffet tem vergonha!

O que justifica que os ricos paguem menos impostos que os pobres? Absolutamente nada. O título do artigo é Stop coddling the super-rich (Deixem de mimar os super-ricos), foi publicado no New York Times de 14 de Agosto, o seu autor é Warren Buffett e a sua leitura é obrigatória.


Buffett é actualmente o terceiro homem mais rico do mundo, foi durante anos o mais rico e é considerado o mais astuto investidor de sempre. E o artigo é obrigatório não porque seja a primeira vez que Buffett diz o que escreveu agora, mas porque o que escreveu é importante.

O que Buffett diz é simples: os ricos dos Estados Unidos, apesar de terem visto os seus rendimentos subir de forma astronómica nos últimos anos, têm visto os seus impostos descer sistematicamente graças a uma classe política que os beneficia por sistema. Buffett considera que isso é injusto e que não existe racionalidade social ou económica que sustente esse estado de coisas. E muito menos num contexto de crise financeira como o que os EUA atravessam, onde se pedem sacrifícios à classe média e aos mais desfavorecidos.

O multimilionário dá o seu próprio exemplo e conta que, no ano passado, pagou apenas 17,4 por cento de impostos sobre os seus rendimentos, enquanto os seus empregados pagaram 33 a 41 por cento.

Em Portugal, a história seria a mesma.

Buffett termina propondo um aumento de impostos para os agregados familiares que ganham mais de um milhão de dólares e um aumento ainda mais substancial para os que atingem mais de dez milhões.

O artigo teve um impacto considerável - não só nos EUA -, com apoiantes e detractores a envolver-se em discussão. Os últimos explicaram mais uma vez que era fundamental que o sistema premiasse de forma particularmente generosa os investidores, pois estes corriam grandes riscos e, se os prémios não fossem excepcionalmente generosos, eles deixariam de investir. Curiosamente, este é precisamente um dos argumentos que Buffett desmonta no seu artigo: "Trabalho com investidores há 60 anos", escreve o financeiro, "e nunca vi ninguém recusar um investimento razoável por causa da taxa de imposto a aplicar sobre o eventual ganho".

Outros críticos explicaram tecnicamente que, mesmo que o imposto dos ricos aumentasse, isso não iria resolver os problemas financeiros dos EUA - esquecendo no meio da argumentação minudências como a equidade, a justiça e a moral.

Mas o mais curioso nas reacções ao artigo de Buffett não foi a polémica, mas a quantidade de milionários que apareceram a apoiar a sua posição e a declarar-se disponíveis para pagar mais impostos - o que é tanto mais significativo quanto se conhece a chantagem assassina que os republicanos levaram a cabo para defender as reduções fiscais para os ricos, à qual Obama (que afinal não é FDR, que desgraçadamente não é FDR) cedeu em toda a linha.

A questão é que Buffett acha que a actual injustiça social passa das marcas e que é excessivo e indefensável o privilégio que a sua competência financeira lhe confere.

Tenho a certeza de que muitos ricos portugueses partilham destas ideias e que na realidade lhes repugnam, em termos morais e económicos, os privilégios fiscais de que beneficiam e que sabem que sobrecarregam fiscalmente os portugueses mais pobres. É inevitável que esse sentimento de vergonha atinja os bancos com empresas nas ilhas Caimão e as empresas do PSI20 com sedes na Holanda e noutros paraísos fiscais, que ficámos a conhecer nas páginas do PÚBLICO no passado domingo. É natural que, devido às férias de Verão, estes empresários ainda não tenham aparecido a manifestar o seu apoio às ideias de Buffett, mas certamente que o farão nos próximos dias, exigindo do Governo de Passos Coelho a mesma inflexão fiscal que o terceiro homem mais rico do mundo defende no seu país.

José Vítor Malheiros - 23-08-2011

domingo, 28 de agosto de 2011

Os católicos e a Política

Há sempre um ponto que me desgosta em muitos amigas e amigos católicos: é a distância em relação ao debate público e político, é o nojo fácil pela política. Isso é visível, por exemplo, no Facebook. Ali podemos ver milhentas pessoas a assumir com orgulho a identidade católica e, ao mesmo tempo, a desprezar a identidade política. Na secção "religious views", surge triunfante a palavra "católica". Na secção "political views", surge um pobre e fácil "não uso disso" ou um "são todos iguais", etc. Na revista Communio (Setembro 1988), o omnipresente Francisco Lucas Pires escreveu um artigo que é, para mim, a melhor resposta a esta pobreza apolítica de um certo catolicismo.

Nesta prosa, intitulada "Pureza de Coração e Vida Política", Lucas Pires afirma que existem duas maneiras de um cristão lidar com a esfera política. A primeira passa por aceitar que os princípios e regras da esfera política são de "outro tipo" e que, por isso, o cristão só deve ter preocupações com a salvação da sua consciência. Ou seja, o cristão deve criar uma redoma à sua volta, retirando-se assim dos debates da Cidade. Nesta via, o cristão julga-se tão puro, que não quer sujar as mãos na realidade. "Sim, sou muito católico, mas não quero nada com a política, são todos iguais".

Como já perceberam, Francisco Lucas Pires critica esta primeira via, e defende uma alternativa. Para o ex-líder do CDS e inspirador de boa parte do PSD atua l, um cristão tem o dever de lutar na Cidade, tem o dever de fazer opções públicas e políticas. Porque o leigo não é o padre a viver fora da Cidade. O leigo tem de viver no mundo, tem de produzir e/ou participar numa narrativa normativa para a Cidade, mesmo quando essa Cidade é dura e suja. Sim, a política namora com o pecado e com a mentira, mas - precisamente por causa disso - a política é o terreno propício para se apurar a "pureza de coração". Só podemos testar a nossa pureza num mundo imperfeito e duro. A redoma apolítica é uma via fácil e pouco cristão.

Portanto, numa lógica algo parecida à de T.S. Eliot, Lucas Pires diz que o cristão tem de tentar influenciar o espaço público, tem de levar os seus valores cristãos para a Cidade. O cristão não tem apenas de salvar a sua consciência: também tem de salvar a sua cultura. O cristão não é apenas um ser metafísico, também é um ser historicamente situado. No fundo, não deve existir uma separação entre a obediência moral (a Cristo, a Deus) e a vida política e colectiva aqui na Cidade dos homens. Pelo contrário: deve existir uma tensão criadora entre a ética cristã e a realidade política.

Henrique Raposo

sábado, 27 de agosto de 2011

Música portuguesa

Adoro poesia e música mas, quando há trabalhos que ligam magnificamente as duas coisas, com cantores e interpretações que marcaram e marcam os meus dias, é fascinante!
Estive em muitos destes concertos. Pura e simplesmente fabuloso assistir ao vivo a estes temas!
(Esta publicação é feita de forma aleatória, claro!)








 

Educação Sexual

Este trabalho ganhou um prémio da OMS - Organização Mundial de Saúde - no tema Educação Sexual. Muito bom!
A divulgar. Para crianças, jovens e adultos.


quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Os simpatizantes de Hitler jamais adormeceram!

Noruegueses acendem vela para a ilha de Utoya (ao fundo) no amanhecer de 23 de julho, um dia após o ataque em Oslo

Focada em descobrir o que se passa na cabeça de imigrantes morenos, barbudos e que não se separam do Alcorão, a Europa deixou passar despercebida a ameaça que representam os loiros de olhos azuis nascidos sobre o seu solo. O massacre de 77 pessoas na Noruega, cometido por um norueguês "puro" - como os nacionalistas europeus gostam de chamar os filhos de pais arianos -, acordou o Velho Continente para o terrorismo de extrema-direita.

Não que as polícias nacionais ignorassem a atividade dos militantes neonazistas - pelo contrário, sabem que os xenófobos simpatizantes de Hitler jamais adormeceram. Mas no último relatório do Serviço Europeu de Polícia (Europol) sobre o terrorismo, a atividade de extremistas de direita ocupava apenas duas páginas. No entendimento dos especialistas europeus, no século XXI esta vertente política deseja se infiltrar na sociedade através de conquistas nas urnas, um passo atrás do outro, e não pela força, embora a polícia tenha interrompido a organização de grupos neonazistas na França, Hungria, República Tcheca e Alemanha entre 2008 e 2009.

Os atentados promovidos por Anders Behring Breivik bagunçaram esta lógica. E se o maior perigo não fossem as organizações, mas os radicais isolados, que mesmo sozinhos, são capazes de provocar 10, 20, 77 mortes de inocentes? Para estes, aliás, os partidos de extrema-direita são vistos como moderados demais na luta contra a imigração e a abertura cultural, como foi o caso do extremista norueguês. Depois de ser filiado por sete anos ao ultraconservador Partido do Progresso, ele optou por batalhar sozinho pelas suas ideias.

"Quem precisa de um grupo quando se tem internet? Com um computador, Breivik garimpou aqui e ali todos os elementos necessários para imaginar, planejar e executar os seus atentados. E ainda encontrou respaldo para fortalecer as suas ideologias, que na cabeça dele, legitimam a sua ação", explica Sylvain Crépon, autor de La Nouvelle Extrême Droite (A Nova Extrema Direita, em tradução livre) e pesquisador na Universidade Paris-Nanterre.

No seu manifesto de mais de 1,5 mil páginas, enviado a amigos e agora publicado na internet, Breivik agradece a seus "irmãos e irmãs que o apoiaram no Reino Unido, na França, Bélgica, Alemanha, Suíça, Itália, Espanha, Finlândia, Suécia, Dinamarca, Holanda, etc". A questão que a Europa se pergunta é se ele vai conseguir inspirar à ação outros tantos nacionalistas que, como ele, se sentiriam na obrigação de livrar a Europa da invasão estrangeira.

Na opinião de Crépon, existe um paralelo entre o terrorista norueguês e os radicais islâmicos que ele tanto despreza: a percepção de que está em curso uma guerra de civilizações e, portanto, é preciso evitar a invasão do inimigo - sejam os ocidentais que se intrometem nos países árabes, por um lado lado, ou sejam as famílias muçulmanas que decidem viver na Europa, por outro. "Para pessoas como Breivik, a social-democracia vigente na maior parte a Europa é a grande responsável de uma abertura para todos, algo que ele rejeita com todas as forças. Se os adeptos das ideias dele se engajarem nesta guerra, teremos um verdadeiro problema."

Resposta europeia é crucial para barrar ações extremistas

Neste sentido, as reações da Europa à tragédia na Noruega são determinantes para evitar novos atentados, alertam especialistas. Porém, por enquanto, poucas foram as vozes que ousaram cutucar de frente a avalanche que pode estar por trás das ações do norueguês. A maior parte dos líderes europeus condenou os ataques, mas não abordou o problema do extremismo de direita ou do aumento da tensão entre nacionalistas e muçulmanos.

O imobilismo suscitou reclamações da comissária europeia das Relações Interiores, Cecilia Malmström. "Muito poucos dirigentes se levantaram para defender a diversidade cultural na Europa", declarou. Exceção à regra foi o chefe de governo da Espanha, o socialista José Luis Zapatero: ao lado do premiê britânico, o conservador David Cameron - que não o acompanhou nas críticas -, o espanhol disse que o massacre foi "um dos acontecimentos mais preocupantes já vistos no solo europeu". "Foi algo extremamente grave que precisa de uma resposta, uma resposta europeia, uma resposta comum para defender a liberdade e a democracia", afirmou. "Isso pede que as pessoas se levantem, combatam o radicalismo e reajam face à xenofobia."

O cientista político Jean-Yves Camus, especialista em extrema-direita do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris), em Paris, destaca que a tragédia trouxe à tona as consequências de uma política adotada por parte dos governantes europeus: a de responsabilizar indiretamente a imigração muçulmana pelas dificuldades enfrentadas no continente - sejam econômicas ou sociais.

"Muitos dirigentes brincam com fogo. Quanto mais anunciam medidas como a restrição de fronteiras e o aumento das expulsões de imigrantes ilegais, mais a extrema-direita se sente estimulada. Até o momento em que ela quer ir além", adverte. "Chega um ponto em que os extremistas de direita deixam as organizações políticas para agir além delas, ao perceberem que os governantes têm um limite nas ações anti-Islã que eles tanto desejam."

LÚCIA MÜZELL (em Paris)

Estação de S.Bento (Porto)

  

  





  



Segundo a revista norte-americana Travel+Leisure a Estação de comboios de S. Bento considerada uma das 14 mais belas do mundo.

A fachada e os azulejos da estação portuense deram-lhe o título de uma das mais belas (Foto: Adriano Miranda)

A estação de comboios de São Bento, no Porto, foi considerada uma das 14 mais belas do mundo pela revista norte-americana Travel+Leisure. Os painéis de azulejos azuis e brancos de Jorge Colaço, que enchem as paredes desta estação da Linha do Minho, colocaram o edifício na mesma lista de outras paragens ferroviárias como a neoclássica Gare du Nord, em Paris, ou Atocha, em Madrid.

Na lista das 14 estações de comboio mais belas, a de São Bento é destacada pela sua fachada em pedra e telhados de mansarda, bem como pelos “20 mil esplêndidos azulejos” criados por Jorge Colaço e produzidos pela Fábrica Cerâmica Lusitana, um trabalho que, segundo a Travel+Leisure, fará qualquer visitante “suspirar”.

O projecto chegou às mãos do artista em 1905 mas só dez anos depois era apresentado ao público, que nas paredes da estação pode ver alguns episódios da história de Portugal como a entrada de D. João I no Porto, para celebrar o casamento com D. Filipa de Lencastre, ou o torneio de Arcos de Valdevez.

Além de São Bento, a Travel+Leisure destaca ainda a beleza da estação de Maputo, em Moçambique, a única escolhida no continente africano, bem como os jardins interiores da estação de Atocha, em Madrid, ou ainda as estações de Kanazawa, no Japão, a Southern Cross Station, em Melbourne, na Austrália, de Sirkeci, em Istanbul, na Turquia, ou a neogótica S. Pancras Internacional, em Londres.

Os Estados Unidos lideram a lista com três estações – a Union Station, em Los Angeles; a Union Station, em Washington; e a Grand Central Terminal, em Nova Iorque.

Na Europa, destaque ainda para a estação central de Antuérpia, na Bélgica. A arquitectura e a decoração da estação Chhatrapati Shivaji, em Bombaim, na Índia, e da estação de Kuala Lumpur, na Malásia, também as colocaram na lista da revista.

E a Estação de Maputo, que eu também conheço! 



A identidade europeia e o terrorismo

O assassinato de Oslo é um alerta para os que desvalorizam o multiculturalismo ou desconfiam da sua eficácia. Os atentados de 11 de Setembro de 2001, em Nova Iorque, e depois em 11 de Março de 2005 em Madrid e 7 de Julho do mesmo ano, em Londres, praticados por extremistas islâmicos, espalharam por todo o mundo o medo e a insegurança, exigindo dos estados meios eficazes ao seu combate, mas sem pôr em causa as liberdades e garantias dos direitos individuais dos cidadãos.

No passado dia 22 de Julho, um cidadão norueguês, de 32 anos, Anders Breivik, depois de ter colocado uma bomba em Oslo junto do edifício governamental, matando oito pessoas, dirigiu-se à ilha de Utoya, onde decorria um encontro de cerca de 500 jovens do Partido Trabalhista no poder, disfarçado de polícia, matando a tiro mais 69 jovens, alguns deles quando nadavam no mar para tentar fugir da morte. E ao que consta uma outra bomba tinha já sido preparada para o mesmo efeito.

Estes factos demonstram que a Europa se encontra sujeita a duas ameaças terroristas de sinal contrário: o terrorismo fundamentalista islâmico (jihadista) e o de extrema-direita anti-islâmico (antijihadista).

No primeiro interrogatório policial, o jovem assassino confessou os factos, mas negou a culpa, alegando que a acção que levou a cabo era um mal necessário para impedir o avanço do multiculturalismo e da imigração muçulmana.

Antes de levar a cabo a sua acção, o jovem norueguês colocou na Net um longo manual teórico e explicativo, intitulado Declaração de Independência Europeia, onde augurava uma revolução europeia em 2083. Nos termos dessa declaração "o grande inimigo a que a Europa se encontra subjugada é o Islão", o que teria alienado da sua monogenealogia cultural, isto é, dos autênticos valores cristãos. Como adjuvantes e colaboradores deste inimigo, provisoriamente vitorioso, colocou uma longa lista de nomes, instituições e concepções teórico-ideológicas, tais como a União Europeia, as Nações Unidas e o multiculturalismo, enquanto dimensão de um "marxismo cultural".

Como se vê, a matança na Noruega significou a execução de um plano de um fanático que julgou estar a assumir a tarefa de salvar a Europa dos seus inimigos e reconduzi-la pelos caminhos de uma suposta "Europa independente", prometida para 2083. O mundo ficou estupefacto, interrogando-se como foi possível um acto destes ter sido praticado num país que é um dos mais elevados modelos europeus.

Os governantes noruegueses reagiram com firmeza ao acto tresloucado, prometendo uma luta sem tréguas contra todos os que possam pôr em causa a democracia e os valores do multiculturalismo. Para dar um sinal nesse sentido, o primeiro-ministro assistiu a uma cerimónia religiosa, celebrada numa mesquita, em memória das vítimas.

O acto terrorista do jovem norueguês, mesmo que possa ser isolado, merece profunda reflexão, uma vez que pretende representar uma visão histórica da Europa enquanto "civilização unitária e espaço geopolítico, desenhados por reacção a entidades ou ameaças exteriores".

Se recordarmos a evolução histórica da Europa através dos tempos encontramos em primeiro lugar a "Europa cristã contra o Islão. Depois, a Europa branca, imperial e civilizada oposta ao mundo colonial e "selvagem". No período da Guerra Fria, temos, no plano religioso, uma Europa católica e protestante; no plano económico, uma Europa capitalista; no plano político um Europa liberal e democrática, oposta a uma Eurásia ortodoxa, muçulmana e soviética. E foi nesta evolução que a Europa, além das suas especificidades e antagonismos nacionais, vem ganhando uma consciência de si, enquanto civilização definida pela sua vocação universal" (secção Ideias e Debates do suplemento Actual do semanário Expresso, edição 6.8.11).

O assassino de Oslo revelou-se como um fanático duma falsa identidade europeia homogénea, ignorando que a verdadeira identidade europeia é de natureza heterogénea e pelo encontro com outras alteridades.

Há cerca de dois anos, uma afirmação de Angela Merkel, no sentido de que o multiculturalismo na Alemanha tinha sido um enorme fracasso causou uma grande polémica. E em França, embora nenhum governante tenha feito idêntica confissão derrotista, as medidas tomadas nos últimos anos têm como pressuposto as dificuldades de organização e coexistência numa sociedade multicultural. O assassinato de Oslo é um alerta para os que desvalorizam o multiculturalismo ou desconfiam da sua eficácia. As posições extremas contra o multiculturalismo, como as reveladas pelo assassino de Oslo, pretendem recuperar uma pureza que nunca existiu e apenas como mito pode ser reactivada. É preciso que os políticos europeus se lembrem que o projecto europeu, segundo os seus fundadores, vai no sentido de se alcançar uma sociedade caracterizada pelo pluralismo, pela solidariedade, pela tolerância, pela não discriminação. Neste aspecto, Merkel e Sarkozy têm-se revelado de uma ignorância perturbadora. As capitais europeias da cultura deverão também elas cumprir esta missão de promoção do multiculturalismo e de diálogo intercultural, ajudando a derrotar o terrorismo, seja ele de que natureza for.

Narciso Machado - 24-08-2011 PÚBLICO
Juiz desembargador jubilado

terça-feira, 23 de agosto de 2011

El gran debate de la agricultura mundial

“La agricultura moderna, tal como hoy se practica en el mundo… está explotando excesivamente el suelo, nuestro recurso natural básico, y es insostenible porque hace un uso intensivo tanto de la energía proveniente de los combustibles de origen fósil como del capital, al mismo tiempo que básicamente no tiene en cuenta los efectos externos de su actividad”, declaró Hans Herren, copresidente del IAASTD. “Si seguimos con las actuales tendencias en materia de producción de alimentos agotaremos nuestros recursos naturales y pondremos en peligro el futuro de nuestros hijos.”

La agricultura es la actividad más importante de la humanidad, en términos ecológicos al igual que económicos. Según algunos estimados, el 70% del agua que utilizamos va a cultivos y animales de finca, y la agricultura ocupa más espacio que cualquier otra actividad humana. Según la Organización de las Naciones Unidas para Agricultura y la Alimentación (FAO), la agricultura emplea al menos la mitad de la fuerza trabajadora del planeta, por lo que debemos concluir que no hay ni habrá ninguna actividad económica que genere tantos empleos como el agro. Es por esto que entendemos que la agricultura debe estar en el centro de todo proyecto de cambio social revolucionario, no puede ser una nota al calce ni uno de muchos items de agenda.La agricultura es el factor más importante en el cambio climático. Según la organización no gubernamental GRAIN: “El modelo de agricultura industrial que abastece al sistema alimentario mundial funciona esencialmente usando petróleo para producir comida y, en el proceso, cantidades enormes de gases con efecto de invernadero. El uso de inmensas cantidades de fertilizantes químicos, la expansión de la industria de la carne, y la destrucción de las sabanas y bosques del mundo para producir mercancías agrícolas son en conjunto responsables de por lo menos el 30% de las emisiones de los gases que causan el cambio climático.

Convertir los alimentos en mercancías mundiales e industriales entraña también una tremenda pérdida de energía fósil al transportarlas por el mundo, procesarlas, almacenarlas, congelarlas y llevarlas adonde las consumen. Todos estos procesos contribuyen a la cuenta climática. Al sumarlas, entendemos que el actual sistema alimentario podría ser responsable de cerca de la mitad de las emisiones de los gases con efecto de invernadero.” (1)

Según “Cocinando el Planeta”, un extenso documento conjunto de varias organizaciones europeas, incluyendo GRAIN y Veterinarios Sin Fronteras: “Cuando consideramos la dupla cambio climático y sistema alimentario, en general pensamos en términos de transporte de alimentos o, en alguna ocasión, a la deforestación asociada a la agroganadería. Pero lo cierto es que pocas veces tomamos conciencia de que el manejo de los suelos agrarios, la utilización de fertilizantes sintéticos, la fabricación de piensos industriales, o la destrucción de los mercados locales de alimentos constituyen el núcleo central de las emisiones planetarias de gases de efecto invernadero. Al mismo tiempo las industrias procesadoras y de distribución de alimentos -que incluyen transporte, empaque, refrigeración y comercialización- son también grandes emisoras. Se calcula que el sistema agroalimentario llega a generar hasta un 50% de estas emisiones. El actual modelo de producción y consumo industrial de alimentos es un gran consumidor de energía, que contribuye significativamente al calentamiento global, además de profundizar la destrucción del medio ambiente y de las comunidades rurales. (2)

Para entender el sistema agroalimentario industrial, los problemas que éste causa y las alternativas que existen es necesario saber lo que fue la revolución verde. En breves palabras, la revolución verde fue la exportación al tercer mundo del modelo industrializado y mecanizado de agricultura de Estados Unidos. Este proceso, que tomó lugar a lo largo de la guerra fría, fue impulsado y financiado por las fundaciones Rockefeller y Ford, el Banco Mundial, el gobierno de Estados Unidos y agencias de la ONU. Según Helena Paul et al: “La revolución verde fue una transformación de la práctica agrícola desarrollada para el Sur por científicos, gobiernos y agencias donantes del Norte. Esencialmente involucró el desarrollo de variedades de ciertos cultivos de mayor importancia- como trigo, arroz y maíz- que en respuesta a insumos aumentados producirían mayores rendimientos.” (3) La revolución verde fue uno de los emprendimientos no militares más grandes del siglo XX. En lo que se refiere a la utilización masiva de recursos humanos, peritaje científico de primera, y fondos públicos, fue comparable con el Proyecto Manhattan y el programa espacial Apolo.

Esta revolución agrícola comenzó en México en la década de 1940 con el Programa Agrícola de México (PAM) de la Fundación Rockefeller. Este programa desarrolló variedades de trigo y maíz de alto rendimiento. Los resultados de este programa fueron espectaculares, las cosechas batieron todas las marcas, y estudiosos y académicos de toda América Latina fueron a México a estudiar las técnicas desarrolladas por el programa. El PAM fue dirigido por el fitopatólogo J. George “Dutch” Harrar, quien luego sería presidente de la Fundación Rockefeller y es recordado como el padre de la revolución verde. Pero el personaje más destacado del programa lo fue el carismático y energético agrónomo Norman Borlaug, quien con el pasar de los años se convirtió en la figura más visible y conocida de la revolución verde. Borlaug, quien ganó el Nobel de la Paz por sus labores, fue el relacionista público número uno de la revolución verde, viajando por el mundo entero predicando las virtudes de la nueva agricultura científica que él propugnaba y solicitando el apoyo de los gobiernos del mundo hasta su muerte en 2009 a la edad de 95.

En 1966 el programa fue transformado en el Centro para el Mejoramiento de Maíz y Trigo (CIMMYT), considerado la máxima autoridad mundial en la investigación y desarrollo de ambos cultivos. El CIMMYT, cuyo primer director fue Borlaug, fue el primero de más de una docena de Centros Internacionales de Investigación Agrícola (IARC, en inglés) que fueron establecidos alrededor del mundo para emprender la revolución verde. Estos centros, que usaron el CIMMYT como modelo, incluyen el Centro Internacional de la Papa en Perú y el Instituto Internacional de Investigación del Arroz en Filipinas. En 1971 los financiadores de la revolución verde establecieron un secretariado permanente, el Grupo Consultivo Internacional sobre Investigación Agrícola (CGIAR), para coordinar las operaciones de los IARC.

El periodista e historiador Mark Dowie dedicó un capítulo entero de su libro sobre las fundaciones estadounidenses a la revolución verde. Dice Dowie: “La masiva reestructuración global de la agricultura conocida como la revolución verde es quizás el emprendimiento internacional más ambicioso de la filantropía estadounidense… El programa fue vasto, técnicamente complejo y en muchos modos verdaderamente revolucionario. Sin embargo su meta fue simple: alimentar el mundo. La estrategia… fue bastante predecible: transferir tecnologías agrícolas científicas occidentales a paises ‘subdesarrollados’, aumentando así rendimientos mundiales de cultivos alimentarios básicos y poniendo fin al hambre.” “La historia de este masivo emprendimiento es un valioso estudio de caso de un esfuerzo filantrópico sincero y de largo plazo para resolver un problema complejo y aparentemente insoluble sin atender las razones fundamentales de su existencia.” (4)

Las últimas palabras de esta cita son de máxima importancia. La revolución verde no atendió las causas de la pobreza y el hambre. En varias ocasiones sus administradores y científicos lo admitieron abiertamente. La idea de que se puede erradicar el hambre con simplemente aumentar la productividad agrícola sin atender asuntos de índole social, política y económica fue uno de varios mitos de la revolución verde.

En las palabras del especialista en desarrollo rural Peter Rosset: “El mito de la revolución verde va algo así: las semillas milagrosas de la revolución verde aumentan rendimientos de granos y por lo tanto son claves para poner fin al hambre en el mundo. Rendimientos elevados significan más ingreso para los agricultores pobres, ayudándoles a subir de la pobreza, y más alimento significa menos hambre. Encargarse de las causas en la raíz de la pobreza que contribuyen al hambre toma mucho tiempo y la gente sufre hambre ahora. Así que debemos hacer lo que podemos, aumentar la producción.”(5)

La revolución verde fracasó. Hoy día hay tanta o más gente hambrienta en el mundo que cuando ésta comenzó. Si se tiene en cuenta la vasta cantidad de recursos que ésta gastó, entonces hay que concluir que fue uno de los fracasos más grandes del siglo XX. Y sin embargo, hasta el día de hoy los protagonistas y portavoces de este emprendimiento dicen y repiten de manera obcecada que fue todo un éxito, que fue uno de los esfuerzos humanitarios más nobles y exitosos de todos los tiempos. En vista de la persistencia de este discurso triunfalista que no guarda relación alguna con la realidad, no exageramos al afirmar que la revolución verde fue uno de los mayores fracasos de intelecto y uno de los más grandes engaños del siglo pasado.

Según Pat Mooney y Cary Fowler, ambos ganadores del Nobel Alternativo en 1985, la revolución verde fracasó “porque el problema no era simplemente uno de demasiado de poco alimento y no podía ser resuelto simplemente produciendo más. El problema era y es uno de mala distribución y en última instancia una falta de poder y oportunidad entre los hambrientos en países del tercer mundo para participar en el proceso de producción y consumo de alimentos.”(6)

“Una de las mayores debilidades de la revolución verde fue su estrecho enfoque en la semilla”, plantean Helena Paul et al. “No pudo ver la finca como un sistema complejo, donde la semilla es sólo un elemento que contribuye a la productividad total. Como resultado, áreas enteras de investigación sobre fertilidad de suelos, cultivos mixtos, manejo de agua y otras prácticas sustentables, que posiblemente podrían duplicar los rendimientos, fueron pasadas por alto a medida que los científicos se enfocaban en encontrar la combinación genética perfecta, un enfoque con grandes limitaciones.” (7)

Las críticas a la revolución verde no son nada nuevo ni novedoso. A principios de la década de los 60, Rachel Carson y Murray Bookchin estaban advirtiendo de los peligros a la salud humana y el ambiente de uno de los mayores pilares de la revolución verde: los pesticidas. En la siguiente década los activistas estadounidenses Frances Moore Lappé y Joseph Collins fundaron la organización no gubernamental Institute for Food and Development Policy, conocida comúnmente como Food First, la cual se ha dedicado a producir materiales educativos acerca del hambre, como artículos y libros, con una visión explícitamente crítica hacia la revolución verde y las políticas neoliberales. En 1977 Lappé y Collins, con la colaboración de Cary Fowler, escribieron “Food First: Beyond The Myth of Scarcity” (publicado en español por la editorial Siglo XXI bajo el título “Comer Es Primero: Más Allá del Mito de la Escasez”). Este importante libro fue de los primeros en hacer una atrevida crítica frontal a todos y cada uno de los supuestos de la revolución verde, en especial el cálculo Malthusiano de sobrepoblación y escasez. En 1981 Food First publicó “Circle of Poison”, un libro acerca de los peligros de los pesticidas que llevó a la creación del Pesticide Action Network (Red de Acción sobre Plaguicidas), una red global que hoy está compuesta de más de 600 organizaciones no gubernamentales, instituciones e individuos en 90 países.

A lo largo de las décadas de los 80 y 90 se sumaron nuevas voces a las críticas a la revolución verde, quienes proponen lo que ha llegado a llamarse agricultura orgánica, o ecológica. La Federación Internacional de Movimientos de Agricultura Orgánica (IFOAM), define esta agricultura de la siguiente manera: “La agricultura orgánica es un sistema de producción que sustenta la salud de los suelos, ecosistemas y la gente. Se sirve de procesos ecológicos, la biodiversidad y ciclos adaptados a condiciones locales, y no en el uso de insumos con efectos adversos. La agricultura orgánica combina tradición, innovación y ciencia para beneficiar el ambiente compartido y promover relaciones justas y una buena calidad de vida para todos los involucrados.” (8)

Entre los referentes más importantes en la crítica a la agricultura de revolución verde y el apoyo a la agricultura ecológica cabe mencionar también a las investigaciones pioneras realizadas por Fowler y Mooney (Mooney luego fundó la organización Grupo ETC); el trabajo educativo de la organización internacional GRAIN; el agroecólogo chileno Miguel Altieri; el científico cubano Fernando Funes; la profesora puertorriqueña Ivette Perfecto; la ecofeminista india Vandana Shiva; y un número creciente de organizaciones de pequeños agricultores del Sur y el Norte, agrupados bajo la red mundial Vía Campesina.

Pero los artífices de la revolución verde, viéndose bajo ataque, no soltaron prenda y retaron a los críticos en debate en cada oportunidad que tuvieron. Argumentaron que la agricultura orgánica no es más que un ideal romántico que nunca tendrá los rendimientos necesarios para alimentar un mundo hambriento que urgentemente necesita propuestas prácticas. Borlaug lanzó ataques particularmente vehementes y acérbicos a los proponentes de la producción orgánica. Dijo al New York Times que algunos ambientalistas “son elitistas. Nunca han experimentado la sensación física del hambre. Hacen su cabildeo desde cómodas oficinas en Washington o Bruselas. Si vivieran sólo un mes entre la miseria del mundo en vías de desarrollo, como yo lo he hecho por 50 años, estarían pidiendo a gritos tractores y canales de irrigación y estarían escandalizados por elitistas de moda que están tratando de negarles esas cosas.” (9)

El debate continuó tras el comienzo de un nuevo siglo, y en 2002 la ONU y el Banco Mundial anunciaron que convocarían un cuerpo investigativo de alto nivel que realizaría una minuciosa evaluación de la ciencia y tecnología agrícolas, la cual adjudicaría la controversia revolución verde vs. orgánico de una vez y por todas. El informe final de este esfuerzo, titulado Evaluación Internacional del Conocimiento Agrícola, Ciencia y Tecnología para el Desarrollo (IAASTD), es comúnmente conocido por su nombre corto: la Evaluación Agrícola, y fue publicado en 2008.

Este informe es el resultado de un estudio concienzudo, basado estrictamente en evidencias, que se propuso encontrarle respuesta a la pregunta: “¿Qué debemos hacer para conquistar la pobreza y el hambre, lograr desarrollo sustentable y equitativo, y sostener una agricultura productiva y resistente frente a las crisis ambientales?” Se propone nada menos que determinar la agenda de la agricultura mundial para los próximos 50 años.

“A la Evaluación se le asignó la ambiciosa tarea de contestar la pregunta central de cómo la agricultura en el año 2050 contribuirá a una humanidad bien alimentada y saludable a pesar de los retos de vasta degradación ambiental, crecimiento poblacional y cambio climático, y que lo haga de modo que el potencial para producir alimento no se haya perdido debido a cómo hacemos agricultura”, dice Jack Heinemann, profesor de genética y biología molecular de Nueva Zelanda. “La manera como hacemos agricultura ahora fracasará en hacernos llegar a esta meta. Cómo deberíamos hacer agricultura no era una pregunta fácil de contestar.” (10) Esta exhaustiva evaluación es a la agricultura mundial lo que el Panel Intergubernamental sobre Cambio Climático (IPCC) es al clima. La similitud entre ambos emprendimientos es más que casual. El director del IAASTD fue Robert Watson, quien presidió el IPCC de 1997 a 2002.

El IAASTD fue redactado por sobre 400 expertos -de agencias internacionales, la comunidad científica, organizaciones no gubernamentales y la empresa privada- que recopilaron datos e informaciones de miles de otros colegas de todas partes del mundo, y fue sometido a dos procesos independientes de revisión por los pares. La evaluación fue financiada por organismos intergubernamentales como el Banco Mundial, el Programa Ambiental de las Naciones Unidas, la UNESCO y la FAO.

El proceso de realizar el informe fue uno sin precedentes pues los gobiernos, instituciones de investigación, la industria y la sociedad civil todos compartieron igual responsabilidad por su diseño y redacción. “El éxito de este experimento da apoyo al valor de la participación de la sociedad civil como socios en condición de igualdad en procesos intergubernamentales y futuras evaluaciones internacionales”, según Lim Li Ching, científica del programa de bioseguridad de la Red del Tercer Mundo y uno de los principales autores del IAASTD (11).

En resumidas cuentas, el informe concluye que el modelo dominante de agricultura moderna está devorando el patrimonio del planeta y poniendo en peligro el futuro de la humanidad. “La agricultura moderna, tal como hoy se practica en el mundo… está explotando excesivamente el suelo, nuestro recurso natural básico, y es insostenible porque hace un uso intensivo tanto de la energía proveniente de los combustibles de origen fósil como del capital, al mismo tiempo que básicamente no tiene en cuenta los efectos externos de su actividad”, declaró Hans Herren, co-presidente del IAASTD. “Si seguimos con las actuales tendencias en materia de producción de alimentos agotaremos nuestros recursos naturales y pondremos en peligro el futuro de nuestros niños.”

Al ser publicado el informe en una actividad en Johannesburgo, Robert Watson declaró categóricamente que mantener el estatus quo en la agricultura no es una opción. “Nuestro cometido era el de analizar no sólo la producción de alimentos aisladamente sino también en relación al hambre, la pobreza, el ambiente y la equidad en relación”, explica Herren. “De modo que nos propusimos estudiar de qué modo la sabiduría agrícola acumulada de la humanidad –conocimientos, ciencia y tecnología- nos ha conducido durante el último medio siglo a la actual situación. También debíamos sugerir opciones para enfrentar los conocidos desafíos de cómo alimentarnos de un modo sostenible tanto social como ambientalmente en los próximos 50 años. Hemos llegado a la conclusión de que sin cambios radicales en el modo en el que el mundo produce sus alimentos el planeta sufrirá daños duraderos.” (12)

La Evaluación Agrícola “enfatiza la importancia de enfoques localmente basados y agroecológicos a la agricultura”, comenta Eric Holt-Giménez, director ejecutivo de Food First. “Las ventajas claves de este modo de agricultura- aparte de su bajo impacto ambiental- son que provee alimento al igual que empleo a los pobres del mundo, además de un excedente para el mercado. Calculando libras por acre estas pequeñas granjas familiares han demostrado ser más productivas que fincas industriales a gran escala. Y usan menos petróleo, especialmente si la comida es comerciada localmente o sub-regionalmente. Estas alternativas, que están creciendo por todo el mundo, son como pequeñas islas de sustentabilidad en mares que cada vez son más peligrosos en lo económico y lo ecológico. A medida que la agricultura industrializada y los regímenes de libre comercio vayan fallándonos, estos enfoques serán las claves para brindar resiliencia a un sistema mundial de alimentos disfuncional”. (13)

“El informe IAASTD pide una redirección sistemática de la inversión, financiamiento, investigación y enfoque de política pública hacia las necesidades de los pequeños agricultores”, dice Lim Li Ching. “Esto involucra el crear espacio para diversas voces y perspectivas, particularmente aquellas que han sido marginalizadas en el pasado, incluyendo los pequeños agricultores y las mujeres. El informe IAASTD dice que se necesita un mayor énfasis en salvaguardar los recursos naturales y prácticas agroecológicas, al igual que en utilizar la amplia gama de conocimiento tradicional que mantienen las comunidades locales y agricultores, que pueden funcionar en asociación con la ciencia y tecnología formales. La agricultura sustentable que es basada en la biodiversidad, incluyendo la agroecología y la agricultura orgánica, es beneficiosa para los agricultores pobres, y necesita obtener el apoyo de marcos apropiados de política pública y regulación. (14)

“El informe refleja un creciente consenso entre la comunidad científica global y la mayoría de los gobiernos de que el viejo paradigma de agricultura industrial, intensiva en energía y tóxica es un concepto del pasado”, dice una declaración conjunta de varias organizaciones de sociedad civil, incluyendo IFOAM, la Red de Acción sobre Plaguicidas y Greenpeace. “El mensaje clave del informe es que los agricultores de pequeña escala y los métodos agroecológicos proveen el mejor camino hacia adelante para evitar la corriente crisis de alimentos y satisfacer las necesidades de las comunidades locales. Por primera vez una evaluación global independiente reconoce que la agricultura tiene una diversidad de funciones ambientales y sociales y que las naciones y los pueblos tienen el derecho a democráticamente determinar las mejores políticas alimentarias y agrícolas. (15)

Hablamos de la revolución verde en tiempo pasado porque desde la década de 1990 hemos estado presenciando lo que podríamos clasificar como una segunda revolución verde. Es importante distinguir las similitudes y diferencias entre ambas. La primera revolución verde se fundamentó sobre semillas convencionales híbridas distribuidas libre de costo, mientras que la nueva revolución verde se sirve de semillas transgénicas patentadas. La primera fue llevada a cabo por instituciones del sector público y fundaciones filantrópicas, mientras que la segunda es obra de corporaciones transnacionales motivadas solamente por el lucro. La líder de estas corporaciones es la estadounidense Monsanto, actualmente la compañía de semillas más grande del mundo, que tiene alrededor del 90% del mercado mundial de semilla transgénica; y están además un pequeño puñado de competidores: las estadounidenses Dow Agroscience y Dupont-Pioneer, y las europeas Bayer Cropscience y Syngenta. A esto hay que añadir la llegada de un nuevo actor en la escena: la Fundación Bill y Melinda Gates, la cual está canalizando grandes sumas de dinero a la agricultura en el Sur, especialmente en el continente africano.

La nueva revolución verde no surge en oposición a la primera. Al contrario, pretende complementarla y adelantarla. Sus artífices y portavoces aceptan el mito del éxito de la primera revolución verde, y las instituciones de ambas revoluciones agrícolas a menudo trabajan en conjunto. El más destacado ejemplo de esta cooperación es la Alianza por una Revolución Verde en África (AGRA), la cual surge de una colaboración entre las fundaciones Gates y Rockefeller. Las instituciones de la primera revolución verde aún existen y continúan haciendo su labor, pero hoy con menos ímpetu que en el siglo pasado. Hoy día el CGIAR y sus centros de investigación agrícola sufren una crisis de financiamiento, al igual que las demás instituciones del sector público en estos tiempos de neoliberalismo. En respuesta, están estableciendo alianzas público privadas con corporaciones de biotecnología. Estos arreglos no están exentos de controversia, pues implican entre otras cosas el patentamiento de colecciones de semilla y el abandono de la investigación y desarrollo de semillas convencionales en favor de las transgénicas.

El gran debate sobre la agricultura continúa. Los aliados de la revolución verde siguen polemizando en la academia y los medios noticiosos a favor de ésta y en pro de las nuevas biotecnologías transgénicas, que son vistas como la continuación lógica de la agricultura industrializada. Están empeñados en condenar los importantes hallazgos de la Evaluación Agrícola al silencio y al olvido. Tan recientemente como en julio de 2011 el blog de la prestigiosa revista Scientific American publicó un artículo que ataca la agricultura ecológica con viejos argumentos e ignorando el IAASTD y numerosas otras referencias valiosas que apuntan a la necesidad y viabilidad práctica de una nueva agricultura ecológica (16).

En conclusión, no hay actividad humana tan importante como la agricultura. Por lo tanto, los esfuerzos por la protección ambiental- en especial contrarrestar el cambio climático- y los movimientos alternativos que procuran transformar las relaciones sociales y económicas tienen que otorgarle máxima importancia. La evidencia muestra abundantemente que el modelo actual de agricultura industrializada está literalmente poniendo en peligro el planeta entero y lejos de ayudar a combatir el hambre ha hecho lo contrario. Y por otro lado existen alternativas ecológicas viables y prácticas para enfrentar con éxito los retos gemelos del ambiente y de alimentar el mundo.

www.ecoportal.net

Carmelo Ruiz Marrero es periodista investigativo, educador ambiental y director del Proyecto de Bioseguridad de Puerto Rico (http://bioseguridad.blogspot.com/). Es autor de “Balada Transgénica: Biotecnología, Globalización y el Choque de Paradigmas”.

Notas:

1- GRAIN. “El fracaso del sistema alimentario transnacional” Revista Biodiversidad, Sustento y Culturas, octubre 2009. http://www.grain.org/…

2- GRAIN, Entrepueblos y la Campaña “No Te Comas el Mundo”, conformada por el Observatori del Deute en la Globalizació, la Xarxa de Consum Solidari y Veterinarios Sin Fronteras. “Cocinando el planeta” 13 de noviembre 2009 http://www.biodiversidadla.org/…

3- Helena Paul y Ricarda Steinbrecher con Devlin Kuyek y Lucy Michaels. “Hungry Corporations” Transnational Biotech Companies Colonise the Food Chain” Zed Books, 2003.

4- Mark Dowie “American Foundations: An Investigative History” MIT Press, 2002.

5- Peter Rosset et al. Citado en H. Paul et al, página 4.

6- Pat Mooney y Cary Fowler. Citados en H. Paul et al, página 14.

7- Helena Paul et al.

8- IFOAM. Definición de agricultura orgánica. http://www.ifoam.org/…

9- Citado en John Tierney. “Greens and Hunger”. New York Times, 19 de mayo 2008. http://tierneylab.blogs.nytimes.com/…

10- Jack Heinemann. “Hope Not Hype: The Future of Agriculture Guided by the IAASTD”. Third World Network, 2009.

11- Lim Li Ching. “Overhaul of agriculture systems needed” South-North Development Monitor #6457, 17 de abril 2008.

12- Hans Herren. “La agricultura moderna conduce al desastre ecológico y humano” Agencia IPS, 24 de abril 2008 http://other-news.info/….

13- Eric Holt-Gimenez. “Pouring fuel on the food” Food First, 16 de abril 2008 http://www.foodfirst.org/….

14- Lim Li Ching. “Overhaul of agriculture systems needed” South-North Development Monitor #6457, 17 de abril 2008.

15- “Civil society statement from Johannesburg, South Africa: A new era of agriculture begins today” 12 de abril 2008

16- Christie Wilcox. “Mythbusting 101: Organic Farming > Industrial Agriculture” 18 de julio 2011 http://blogs.scientificamerican.com/…; Tom Philpott “3 ways Scientific American got the organic ag story wrong” 25 de julio 2011 http://motherjones.com/…; Pesticide Action Network “Scientific American fact-checkers on holiday” 25 de julio 2011.http://www.panna.org/….

 
Carmelo Ruiz Marrero

"O que me interessa é o que está acontecendo"

Um obrigada ao meu amigo António Vasconcelos, por me ter enviado este tesouro magnífico:

Eduardo Galeano, na Praça da Catalunha, aquando do grande acampamento de jovens em Madrid, dia 24 de Maio de 2011, tal como no nosso 12 de Março (no qual também estive presente), numa entrevista informal, riquíssima, com afirmações que nos prendem completamente a atenção.
Que lucidez! Que nível! Que verdades!

Que lição!

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Dia de Silêncio


Mais um livro que recomendo vivamente. De um escritor que, a partir do momento em que li esta obra (há tantos anos!), passou a fazer parte da minha lista de autores preferidos. Tahar Ben-Jelloun.
Simplesmente apaixonante. Pelo humanidade, pelo realismo mas também pela forma sublime e melodiosa como nos fala daquele homem, daquele velho, no seu quarto, mergulhado na vida das suas recordações mas que se mantem atento e interessado a tudo quanto ouve, julga ouvir ou parece ver.
Neste homem, nesta sua forma de se agarrar à vida, quantos de nós julgarão ver (e verão!) a realidade a nossos olhos colocada, diariamente, quando olhamos para os velhos, perscrutando o dia, a rua, as gentes que passam, através da vidraça, ou então, para sempre acamados, revivendo pelos sons que lhes chegam do exterior, sentem nos olhos, no coração, uma vida que lhes passa devagar, muito devagar, solitariamente, ás vezes sorrindo e outras vezes chorando.

* O meu exemplar é da Bertrand Editores. Como não consigo imagem deste, vai a capa da ed. espanhola, que acrescenta "Tânger" ao título. 

Boas leituras!

Consultas que sugiro sobre este autor:

Trás-os-Montes, uma estrada no meio dos bosques.











É uma região surpreendentemente bela. Uma espécie de lugar sitiado pelos montes que se cobrem de neve nos Invernos impiedosos e que se amansa de ervas no pino do Verão. É, pois, uma terra de sombras e de casas dispostas como num gigantesco presépio. E tudo longe do mar.
(Para Manuel Hermínio Monteiro)
Antigamente esta estrada era praticamente um trilho para animais ou para carros que não temiam a lama, a poeira ou as sombras tenebrosas dos arvoredos que dominavam o vale noite e dia, sem falar dos precipícios, enormes, cobertos de neve durante o Inverno, amansados de ervas durante o Verão. Havia dois, sobretudo: um, quando se deixava para trás a pequena vila onde só se parava por obrigação - e, outro, quando o Tuela mostrava a sua face magnífica, prateada, reflectindo a floresta de choupos, negrilhos, freixos, pinheiros, carvalhos e castanheiros que subia pela encosta acima na direcção das aldeias da colina, Nunes e Romariz, até se chegar ao brevíssimo planalto de Ousilhão. Daí, sendo o fim da tarde, podia ver-se o céu luminoso de Trás-os-Montes, saborear-se a água que corria nos regatos principais do monte do Souto, ouvir o chiar dos carros de bois, ver a palha remexida pelo vento nas eiras, e sentir-se que, de certo modo, não havia mais mundo. Tudo estava ali esgotado ou, pelo menos, sitiado pelos bosques, pelos montes e pelo céu.

Esta foi a minha introdução a Trás-os-Montes desde a primeira infância. Houve muitas, depois desse primeiro instante em que um velho Taunus nos descarregava no planalto depois de atravessar as colinas de Vinhais. Houve nevões intensos e corridas aos pássaros, entretanto. Houve gente a morrer e recordações deixadas ao abandono. Mas este fragmento de um filme não deixa de passar na memória sem se falar na dificuldade de viver sem ele. Há um movimento lento da câmara a partir do céu: montes, rios, florestas, sombras, pedras soltas, caminhos no planalto, veredas e muros, casas dispostas como num presépio, rios escondidos entre nomes de outras paisagens. E tudo volta aqui, a este lugar.
Depois de ver o mar pela primeira vez, as montanhas da minha terra, logo de manhã, acabavam por parecer-se com essas neblinas azuladas dos grandes areais. O grande mar de Trás-os-Montes era essa geografia plana das geadas e das veredas onde de uma cancela se passava a um campo aberto de, e uma hora se passava para a eternidade. Nessa adolescência que lia Miguel Torga e que só depois leu João de Araújo Correia ou Bento da Cruz, Trás-os-Montes era a peça de um puzzle onde as lições de geografia física e da então geografia humana (que havia de se transformar em demografia ou sociologia) cabiam como um recitativo: os socalcos do Douro, as florestas, as estradas romanas e os planaltos, os vales, o Marão e o Alvão, a transição para o Minho ou para a Beira, a pequena propriedade e o emparcelamento rural, a agricultura e a pecuária, a olivicultura e o granito, a serra da Nogueira e o Larouco, a emigração, os sotaques e os dialectos, as aldeias sem água canalizada, electricidade ou rede de esgotos, Pitões das Júnias e a Galafura, a fruticultura acidental e o «reino maravilhoso».

Anos depois, muitos anos depois, o «reino maravilhoso» é uma memória que separa o Douro de Trás-os-Montes e que já não tem geografia fixa. Há, ali, uma magia surpreendente que vagueia pela recordação do que foi antigo e hoje é apenas velho e decomposto. Desilusão dos anos? Nem tanto. Portugal, o resto de Portugal, compôs de Trás-os-Montes um retrato cordato e nostálgico que o tempo não confirmou nem desmentiu: prosseguiu a sua história e reinventou os seus caminhos - encheu-se do mesmo cimento das outras províncias, revoltou-se contra as distâncias e pôde, com a gente que vinha de África, por exemplo, construir uma nova ordem na economia e na vida urbana.

O que um estrangeiro - um não-transmontano - vem buscar a Trás-os-Montes é muitas vezes esse retrato que condizia com um país de rolas nas oliveiras e ruídos de carros de bois, com o fumo das chaminés de Inverno e aquela Primavera única do Douro, distribuída pelos amendoais e pelo renascimento das vinhas e dos choupos que protegem a sua face encolhida entre falésias.

Vem também buscar a gastronomia e os romances orais, essa tradição que os professores de Antropologia veneram e situam como um testemunho de sobrevivência daquilo que nem teve direito à sua própria morte. Mas esse Trás-os-Montes, esse país de serras e granitos, de nevoeiros melancólicos e de literatura com sujeito, predicado e complemento directo, de analfabetismo varrido pelas estatísticas e de antigos contrabandistas que atravessavam os campos de Verín para Vila Verde da Raia ou para Vilarelho - esse país vestido de negro, cinza e verde-escuro, mudou surpreendentemente. A sua paisagem conserva os mesmos momentos mágicos, sobretudo quando os ermos são mais desabitados e os bosques de carvalhos, castanheiros e abetos aguardam a vinda da neve de Janeiro. E a velha e antiga (aqui sim, coincidem velho e antigo) ironia do homem transmontano, essa sabedoria camponesa, rural e saborosamente provinciana, contagiou-se também do cinismo moderno. Mas podia ser de outra maneira?
Há uns romaces de Agustina, como havia de Camilo, onde a paisagem e a sabedoria dos homens e mulheres se encontravam para construir personagens de génio, inesquecíveis e atravessados por essa seta maiúscula do milagre e do maravilhoso. Mas o grande milagre era a sobrevivência num mundo ignorado e afastado do Poder, do brilho das luzes e da velocidade do tempo. O comboio da Linha do Corgo, que fazia a ligação perfeita entre a pequena civilização do Douro (partia da Régua) e a então longínqua Chaves fronteiriça, demorava quatro horas de caminho no início dos anos 80, antes de sucumbir definitivamente, arrastando consigo locomotivas que já não eram deste tempo e carruagens que não deviam ser desta gente, porque a humilhava. A linha estreita do Sabor, que ia de Pocinho às portas de Miranda, em Duas Igrejas, mal suportava o peso e a agitação das velhas automotoras inglesas, azuis e vagarosas.
E o comboio da Linha do Tua, partindo do Douro para Bragança, foi conhecendo a devassidão do deserto a partir da Vilariça, essa mancha que devia ser tenebrosa e que, afinal, nessa orografia, foi alastrando como uma mancha esbranquiçada onde nada foi crescendo, poucos foram vivendo, e quase ninguém foi passando senão nesse cerimonial da visitação à província e ao «reino maravilhoso». Tenho, por isso, saudades dessa Barca d'Alva e da ponte que se atravessava a jeito para um dia nas festas de Freixeneda, em Espanha. E tenho saudades dos perfumes de romaria em redor de certas capelas e ermidas, dos aromas de comida de feira (com a posta mirandesa ou a vitelinha barrosã a entreter-nos o almoço), dos picos de xisto tenebroso da Lousa, essa aldeia empoleirada e sempre vista da margem do Douro e do Sabor, dos pássaros da Senhora da Assunção, entre Vila Flor e Mirandela (andar de cavalo e saborear chupa-chupas?).
E saudades das histórias que fixaram na terra homens e mulheres espantosos: de Antónia Adelaide Ferreira, a rainha do Douro que converteu a região à sua sombra protectora, até António Granjo, o político que na hora da morte, às mãos de uma revolução ignorante e perversa, em Lisboa, não esqueceu aquelas luzes e aquelas flores da sua veiga de Chaves (Boninas da Veiga, assim se chamava o seu livro). Como não se há-de ter saudades das amendoeiras à beira do Douro e da sombra magnífica das colinas que descem de Alijó para o Pinhão e que se prolongam até à outra margem, na mais bela das estradas ribeirinhas e que segue até à Régua? E dessa estrada assombrada pela floresta, entre Vinhais e Bragança, por onde se davam - pela janela do carro em andamento - lições de fauna, flora, orografia, literatura, história antiga & moderna, geometria sagrada & profana, meteorologia, filosofia da mais rara?
Ou das margens alcantiladas do Douro, entre o Pocinho - que outrora foi mágico e cheio de esplendor, antes de ser rasgado por barragens, muros, subestações - e Barca d'Alva, passando por Figueira de Castelo Rodrigo, Almendra, Mazouco? Ou das águias de Miranda, vistas do castelo pendurado sobre o rio que entra de Espanha? Ou da estrada que segue de Boticas para Montalegre, rente aos abetos frondosos que escondem o céu e nos protegem da ventania, até que se chega a um miradouro de onde o mundo (o mundo que se vê daí, de Alturas do Barroso: Montalegre, Pitões, as colinas da Xironda) parece ainda intocado e intocável, incólume, mas inquieto como uma alma cheia de vida que chega e parte, se aproxima e afasta? Ou dos trilhos na serra, partindo de Vila Pouca de Aguiar na direcção do Douro, o mundo que corre do outro lado - passando nos altares naturais de Jales -, rodeados do frio agudíssimo de um planalto que já era solitário antes de partirmos para sempre?
Mas não se pode exigir a Trás-os-Montes que fique como uma recordação de viagem, sobre a qual se lêem livros antigos, romances históricos e folhetos de turismo. Eu compreendo a pressa dos meus conterrâneos e o modo como resistiram a tudo: ao silêncio, ao isolamento, à humilhação da pobreza transformada em folclore inútil, à vida difícil, até ao frio - e, sobretudo, ao estrangeiro que via em Trás-os-Montes o «reino maravilhoso» sem direito a maravilhar-se. O resultado, por vezes, não é brilhante, mas deve compreender-se, e essa compreensão não se oferece como uma face demasiado visível à mitologia agora corrente sobre a glória perdida da natureza, do equilíbrio, da eternidade. Poderíamos falar sem cessar, provavelmente, do silêncio dos pinhais de Oura e da melancolia dos caminhos que levam a Nuzedo, da neve da Bolideira e da lã doméstica das aldeias de fronteira, das ermidas que já anunciaram o fim do mundo e da pobre paisagem que foi sendo devorada pelo deserto - na passagem de Duas Igrejas para o sul, na direcção de Carviçais, Felgar ou Moncorvo. Mas são folhas de calendário, estampas para guardar no coração ou para vender nas feiras. Mais do que o «reino maravilhoso» que se suspeita como um sinal de suspeitíssimo patriotismo local, o que existe do lado de lá Marão só pode compreender-se por dentro, como se Trás-os-Montes fosse, como é, uma ilha no interior da terra, uma explosão de violência e de tranquilidade em simultâneo, uma casa para os sabores mais perfeitos ou para as saudades de um tempo em que o mundo seria perfeito para quem o sabia viver.
Eu amo Trás-os-Montes naquele silêncio das florestas e das estradas afastadas que aguardam ora a neve, ora o pavor do Verão. Amo-o ainda mais quando vejo a cor da terra e a sombra dos seus castelos em ruínas, quando suspeito o fundo dos rios, os recantos junto dos açudes e a altura das árvores. E perco-me desse mal de paixão, quando, de longe, Trás-os-Montes se assemelha vagamente a uma terra prometida aos seus filhos mais distantes, ou mais expulsos, ou mais ignorados, ou mais mortos apenas. E amam-se aquelas árvores porque vêm do interior da terra, justamente, sem invocar a sua antiguidade ou a sua grandiosidade. Ama-se o frio, até, o esplendor das geadas sobre os lameiros, o sabor da comida que nunca perdeu a intensidade nem a razão. E amam-se os rios, os areais, os poços das hortas, as cancelas de madeira que vão perdendo a cor, e talvez se amem o fogo das lareiras, os dias de caça, os ramos mais altos dos freixos e das cerejeiras, os jardins abonecados das suas cidades, o granito das casas, o cheiro das aldeias onde ao fim da tarde se chama paz ao silêncio e se dá o nome de chuva à água do céu.
Muitos anos antes, por isso, eu passava nesta estrada e não sabia que seria a estrada da minha infância, a estrada onde havia de me perder de alguma maneira enquanto andávamos - em bando, com as calças sujas e os dedos feridos - a procurar ouriços dos castanheiros e cotovias que tinham sobrevivido ao Inverno. Tive a sorte, aliás, a sorte mais despudorada, de poder ter vivido duas infâncias, por isso: uma, junto à neve do Nordeste e, outra, junto às margens do Grande Rio, onde se aprende a nadar sem tocar na água, porque esse é um dos grandes segredos do Douro: nadar nele como se se voasse entre as falésias que descem de Numão para o Vezúvio, passar rente aos pomares, tocar ao de leve as flores das serras, os socalcos que se desfazem se não se é cuidadoso. E há essas quintas magníficas do Douro, as elevações dos ciprestes que as delimitam, os muros onde as heras, as azedas, a serralha e as silvas se entretêm para enobrecer as ruínas. São quintas que marcam definitivamente a história da região: em muitas delas fixaram-se economias que revolucionaram o nosso gosto e paladar pelos vinhos excepcionais que produziram, que enterneceram a nossa imaginação pelas histórias fantásticas que geraram. O próprio vinho do Douro (ah, não falo da diferença entre Vinho do Porto e Vinho Fino...), os vinhos do Douro, são a prova desse génio demolidor que pôde transformar uma paisagem e aproveitar um rio, abrigar nas suas fronteiras os ingleses que trouxeram e levaram os sinais desse génio, conciliar a doçura da terra com o carácter agreste da paisagem.
De qualquer modo, eu passava nesta estrada e chegava ao planalto. À noite ouviam-se os mochos invisíveis entre a folhagem dos castanheiros, os grilos, os pássaros que continuam a pressentir-se nas latadas, os lobos nos caminhos do monte, os pombais entre manchas de zimbros, entre amendoeiras. Digamos que poderia, muitos anos depois, ainda, escutar o ruído dos cinzéis esculpindo o céu para o encher de estrelas e nuvens e chuva e neve e granizo e vento. Qualquer que seja o lugar para onde se vá, por isso, esses ruídos da noite hão-de perseguir o fugitivo. O ruído das cigarras, o ruído do pavor das cigarras durante a tarde, há-de ser sempre ameaçador. E o cheiro da terra entre as oliveiras, como uma pousada onde se adormece no interior da tarde. Na extremidade da vida, estas paisagens vão e vêm, uma palavra há-de nelas criar um parentesco inexplicável com a terra e a sua altivez, os muros no meio dos prados, as ervas ainda sem designação, as sebes junto dos quintais, os voos das rolas e tarantolas, os charcos deixados pelas chuvas junto dos tanques, dos canais que atravessam os campos.
O resto, que é sempre bastante e se esquece, é o folclore natural do mundo. O viajante mete-se à estrada e talvez lhe ocorra que esta estrada não tem fim, em breve chegará ao Zoio e à serra da Nogueira, e aonde for, como for, persegui-lo-á uma sensação irremediável de perda - porque num universo onde os relógios não param, talvez só em certas ilhas, no Alentejo e em Trás-os-Montes, se encontrem lugares que desta maneira resistem ao tempo. Há neles, nesses lugares, uma magia que só é acessível quando se pára realmente à beira da estrada, ou longe dela, e se absorvem os sinais: uma pedra antiga, uma necrópole milenar escondida numa clareira ou no pico de um monte, uma velha fortificação, uma ermida e uma peregrinação, um castelo que ensina metade da história da paisagem, um outeiro que anuncia uma aldeia, as máscaras das festas de rapazes em Ousilhão (a imagem do terror mais completo, nessa minha infância), um açude onde uma velha barca se move de vez em quando, uma canção que vem do princípio dos tempos, uma clareira. E, então sim, entra-se no «reino maravilhoso» quando se entendem esses traços da paisagem e das neblinas que cobrem as madrugadas e manhãs desse mapa inquieto e turbulento. E escrevo «turbulento» porque essa é uma das marcas mais perfeitas do espírito transmontano: uma turbulência que se solta, e que, quando se solta, é genial e explosiva, tem a marca de um génio quase perfeito, quase desconhecido porque esteve mascarado - antes - da bonomia rural de um homem que aceita o destino para o ludibriar sempre que pode.
Por isso, quando se chega a este ponto da estrada e o prado se encontra delimitado pela pequena capela de paredes brancas, pelos bosques que crescem desordenadamente, pelos muros dos campos cultivados ou entregues à pastagem - nessa altura desfazem-se as ilusões sobre o que é o regionalismo transmontano. É apenas uma paisagem? Será? É provável que se trate, antes, de uma larguíssima extensão de cor, de texturas, de afectos, de distâncias, de brilho das estrelas, de força humana resistindo ao isolamento e ao afastamento. Mas era a estrada de uma das minhas infâncias. Podia falar-vos da outra, da que descia de Moncorvo e que se detinha diante do Douro como se repousasse naquela curva de alecrins e giestas, junto à velha Quinta do Campo (de Almaçae), nos arredores do Pocinho, a fronteira com a Beira Alta. Podia. Mas temos sempre de escolher um caminho. Às vezes escolhe-se um, das outras escolhe-se o que parte em sentido contrário, como uma «tentação irresistível», uma barca que nos atravessa para o outro lado do rio e que nos devolve mais tarde, só muito mais tarde. Exactamente como acontece com Trás-os-Montes, devolvendo-nos ao interior da terra e aos seus segredos, aos seus muros e bichos invisíveis.
Sigamos, pois, por esta estrada. Agora vem esta curva: há um outro bosque e outro ribeiro que desce para a aldeia, e este pedaço de céu. E assim por toda a eternidade em que a soubermos conservar.

Texto de FRANCISCO JOSÉ VIEGAS - Expresso - Fotografias de RUI OCHÔA

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Contra as touradas, Barrancos, e outros que tais... Boicote!



A s pessoas que são contra as touradas, sabendo como sabem quais as terras onde esta crueldade e tortura é apoiada e aprovada pelas Câmaras Municipais, com o caso vergonhoso de Barrancos no topo do rankink sanguinário, para quem a lei abriu uma excepção, apadrinhada por políticos e figuras públicas que há muito perderam a minha consideração… quem é contra as touradas e conhece gente que publicamente as promove e defende, tudo fazendo para sair nas capas das revistas cor-de-rosa ou nos pasquins habituais, mesmo diários nacionais, em poses e sorrisos de um cinismo inqualificável, a troco de borlas, sempre as borlas e a publicidade que desesperadamente procuram seja onde for, para dar nas vistas, para se tornarem aquilo que pensam ser mas que nunca o serão: pessoas com classe, carácter e postura cívica...

BOICOTEM! BOICOTEM!

NÃO COMPREM PRODUTOS DE BARRANCOS NEM DE OUTRAS TERRAS ONDE SE PROMOVEM E FAZEM TOURADAS!

NÃO VISITEM TERRAS ONDE A TOURADA É APOIADA DESCARADAMENTE E UTILIZADA “PARA O TURISMO”!

NÃO COMPREM LIVROS DOS ESCRITORES/ESCRITORAS QUE SORRIEM MARAVILHADOS E EXCITADOS NO CAMPO PEQUENO E EM TANTOS OUTROS CAMPOS PEQUENOS ESPALHADOS PELO NOSSO PAÍS!

NÃO COMPREM REVISTECAS BALOFAS COM AQUELAS CARAS QUE NÓS CONHECEMOS, DE GENTINHA DECADENTE, PRESUNÇOSA, BALOFA POR DENTRO E POR FORA!

NÃO COMPREM JORNAIS QUE PATROCINAM AS CORRIDAS DA MORTE!

NÃO VÃO A TEATROS OU OUTROS ESPECTÁCULOS ONDE OS ACTORES/ACTRIZES SEJAM PUBLICAMENTE CONHECIDOS PELA SUA AFICCION À TAUROMAQUIA!

NÃO VEJAM CERTOS CANAIS DE TV NOS DIAS EM QUE TÊM AGENDADAS TRANSMISSÕES DE TOURADAS!

NÃO ASSISTAM A PROGRAMAS CUJOS APRESENTADORES ASSUMEM, DESCARADAMENTE E OFENSIVAMENTE, O SEU AMOR ÀS TOURADAS!

NÃO COMPREM CERVEJAS DE MARCAS QUE PATROCINAM OSTENSIVAMENTE ESTA BARBARIDADE!

UTILIZEM AS REDES SOCIAIS E A FACILIDADE E RAPIDEZ QUE ELAS PERMITEM, SOBRETUDO EM FÉRIAS, PARA DIVULGAR AS CRUELDADES QUE SE COMETEM CONTRA TOUROS E ANIMAIS EM GERAL!

DENUNCIEM OS CRIMINOSOS E COBARDOLAS QUE COMETEM ATROCIDADES CONTRA OS ANIMAIS, LIGANDO DE IMEDIATO PARA A GNR, PSP, SEPNA...

COMENTEM ARTIGOS NOS JORNAIS, FACEBOOK E OUTROS! TODO O ANO!

DIFUNDAM, DIFUNDAM E ASSINEM AS PETIÇÕES QUE VOS CHEGAM PARA A DEFESA DOS ANIMAIS, PARTICULARMENTE, CONTRA AS TOURADAS E PARA QUE HAJA, URGENTEMENTE, LEGISLAÇÃO QUE DEFENDA OS ANIMAIS E PUNA EXEMPLARMENTE OS SEUS AGRESSORES E ASSASSINOS!

COMPAREÇAM NAS ACÇÕES DE RUA QUE AS ORGANIZAÇÕES DE DEFESA ANIMAL ORGANIZAM, MESMO QUE ISSO VOS CUSTE!

FAÇAM-SE SÓCIOS DE UMA DESSAS ORGANIZAÇÕES PAGANDO UMA QUOTA SIMBÓLICA MAS QUE MUITO PODE AJUDAR!

SEJAM UNIDOS E PARTILHEM AMIZADES (NO FB, POR EXEMPLO!) COM PESSOAS QUE ESTÃO NESTA LUTA PELA DIGNIDADE PARA TODOS OS ANIMAIS, PARA QUE HAJA MAIS MOTIVAÇÃO ENTRE NÓS E MAIS FORÇA PARA A VITÓRIA!

NÃO TENHAM VERGONHA NEM MEDO DE DEFENDER QUEM SÓ DE NÓS DEPENDE!


Por algum lado temos que começar a endurecer a luta, não acham? E quem é contra as touradas não pode ficar-se "pelo sofá", pelas palavras e intenções!

Tem que dar, deve dar também testemunho público, inequívoco da sua posição, seja no seu local de trabalho, no seu bairro, no seu grupo de amigos, no seu blogue, no Facebook…

"Querer é poder", sim, mas AGIR é que é preciso. E depressa!

Em torno das organizações de defesa dos animais que existem por esse país fora, com um trabalho notável e que muito admiro.

RAZÃO JÁ ATEMOS, MAS, SÓ A UNIÃO TRARÁ O QUE DESEJAMOS!

Custa? Sim, muito, como todas as lutas contra a estupidez e os mentecaptos.

No caso da luta contra as touradas não pode haver meio-termo: ou somos ou não somos a favor. Se somos contra, lutemos, caso contrário, também esperaremos 48 anos que alguém faça alguma coisa por nós, quer dizer, pelos pobres animais barbaramente torturados muitas e muitas vezes e muitos e muitos meses antes da “lide” e barbaramente humilhados e lentamente assassinados no dia do terror, no principal mês do terror – Agosto - com carrascos cujo sorriso prenuncia o sacrifício e a imolação de inocentes.


Nazaré Oliveira