segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Carlos Alexandre e José Sócrates: Castigar sem julgamento


Anestesiados*



"O juiz, depois do procurador Rosário Teixeira ter pedido a prisão preventiva, afirmou que esta medida de coação, a pecar, não era por excesso." DN de 27/1.

Tente ignorar que esta frase respeita a um processo em que está envolvido José Sócrates. Faça uma tentativa para esquecer que ele foi o homem que arruinou Portugal ou o herói que lutou até ao fim contra a intervenção externa. Desta vez, ponha para trás a sua convicção de que ele foi o melhor político português desde D. Afonso Henriques. Ou o pior. Pode ser complicado, mas assuma que está como praticamente toda a gente: não sabe se ele é culpado ou inocente dos crimes pelos quais está indiciado.
Mais difícil ainda. Tente pensar que é juiz. Que tem de julgar sem preconceitos, de esquecer as suas simpatias e antipatias. Que as suas decisões mudam a vida de qualquer pessoa e que não pode fundar as suas tomadas de posição em "eu cá acho" ou porque "aquilo daquele processo do Centro Comercial" foi muito esquisito ou porque aquelas casas eram de mau gosto ou porque "quem cabritos vende e cabras não tem, dalgum lado lhe vem" ou porque sempre tinha suspeitado que ali havia coisa.
Olhe para si como alguém que tem de ser um garante do Estado de direito, que tem de cumprir escrupulosamente a lei, de ser um bastião dos direitos consagrados na Constituição da República Portuguesa, um ponto de equilíbrio entre quem acusa e quem defende. Que sabe que não pode pactuar com julgamentos na praça pública, que não os pode promover passando ou deixando passar para esgotos a céu aberto, mascarados de jornais, pedaços de informação que devem permanecer confidenciais. Que jamais utilizará esses lodaçais para obter na praça pública as condenações que a lei e os seus procedimentos não permitem. Que não pode permitir que escutas sejam tornadas públicas, nem as que interessam ao processo nem as que não têm pingo de interesse para o que quer que seja senão para achincalhamentos públicos. Mais, que tem de ter um extremo cuidado para que essas não aconteçam e o mais depressa possível sejam destruídas.
Não se esqueça, também, que tem de ter uma exata noção da importância de uma decisão que sujeita a prisão alguém que ainda não foi, de facto, julgado. Alguém que ainda não pode defender-se de uma forma absolutamente cabal. Já imaginou a responsabilidade de tirar aquilo que a civilização ocidental considera o mais precioso bem? É que não há, em qualquer sistema de justiça de uma democracia, maior pena que a privação da liberdade.
Há, no entanto, um juiz que considera que tem indícios tão graves, tão graves, que está tão convicto da culpabilidade de alguém, que não só acha que ele deve estar preso - cumprindo, claro está, os requisitos da lei, ou melhor, estando certo de que esses requisitos se aplicam - que até pensa que devia existir uma medida de coação mais contundente. Dado que no nosso sistema não há nenhuma mais grave, em que é que o juiz estará a pensar? Chicotadas, tipo sharia? Não deve ser isso - é que até para aplicar chicotadas os condenados têm de ser julgados antes.
Aliás, achando que a prisão preventiva, neste caso, peca por defeito, das duas uma: ou o juiz pensa que o ex-primeiro-ministro deva ser amarrado e amordaçado para que não possa fugir, destruir provas ou repetir os crimes pelos quais está indiciado, ou então olha para essa prisão como uma pena e acha--a até leve. Qual das duas possibilidades a pior.
Verdade seja dita, nada se ganha em tentar interpretar aquela frase. Ela fala por si. Basta que fiquemos com a certeza de que há um juiz que pensa que a prisão preventiva não é medida de coação suficiente. Convinha, no mínimo, saber se já o tinha dito para outros casos e qual seria a sua sugestão para algo mais grave que a privação de liberdade sem julgamento. É que se o juiz Carlos Alexandre só fez este tipo de comentário no caso Sócrates, parece evidente que tem um preconceito contra o arguido em causa e que, assim sendo, não está capaz de cumprir corretamente as suas funções neste processo. Mas se também os fez noutros processos tem um problema mais grave, digamos assim.
De tudo, o que mais impressiona é a forma como aquele comentário não causou um tumulto na comunidade. Um juiz que tem os mais importantes processos deste país, faz um comentário daquela gravidade e toda a gente encolhe os ombros. Ouvimos uma ministra da Justiça a dizer que fala para o telefone como se fosse um gravador, vemos peças processuais em segredo de justiça a aparecer nos jornais, escutas circulam como se nada fosse, sentenças são lavradas dizendo que se julga interpretando o sentir da comunidade e tudo é encarado com normalidade: a anormalidade tornou-se normal. Só isso pode explicar que nem um único político tivesse uma palavra sobre o assunto, que nem um editorial tivesse sido dedicado a este assunto, que nem um único representante da justiça se tivesse indignado.
Não, o que se passa no processo Sócrates está longe, muito longe de ser normal. Mas o mal é mesmo maior, muito maior.



* Título original deste artigo de PEDRO MARQUES LOPES
 
in http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=4375059&page=-1

quinta-feira, 27 de agosto de 2015

"Homos sim, sexuais é que não"





Jornais e televisões andam desde quinta-feira a repetir um comunicado do governo segundo o qual os “homossexuais vão poder dar sangue”. Vai-se ver do que se trata e é exatamente o contrário.

Afinal, o que a Direção Geral de Saúde decidiu é que a discriminação continua e que aliás as regras vão ficar piores do que em 2010. 
O Governo anuncia que se um homem tiver tido relações com outro homem nos últimos 6 meses ou no último ano é “excluído temporariamente” de dador, independentemente de se ter protegido ou não. A notícia é por isso espantosa: agora os gays podem dar sangue, mas na condição de serem homossexuais não praticantes.
É isto que propõe o relatório do grupo de especialistas que o Governo invoca para a sua decisão? Não se sabe. Desde 2012 que nos falam do grupo de trabalho criado pelo Instituto Português do Sangue, mas a divulgação dos seus resultados foi sendo sempre adiada. Ainda em junho deste ano, juntamente com outra deputada, requeri formalmente ao Ministério que nos facultasse as conclusões do grupo de trabalho. Mesmo sendo sua obrigação constitucional, até ao momento em que escrevo, nada. Só a Lusa, pelos vistos, teve direito a conhecê-las.
Curioso é que este anúncio pomposo sobre um pretenso “recuo na discriminação” de iniciativa governamental surja ao mesmo tempo em que consultas de rastreio de doenças sexualmente transmissíveis, dirigidas a homens gay, acabam por falta de verbas: um centro único no país e considerado exemplar pela Organização Mundial de Saúde, foi encerrado porque o Ministério da Saúde decidiu deixar de financiá-lo. Sobre a preocupação com a saúde pública, tantas vezes invocada neste debate, estamos conversados.
Mas vale a pena, também por isso, lembrar brevemente a história do sangue.
Nos questionários feitos aos dadores, perguntava-se o seguinte: “se é homem, teve relações com outro homem?”. Quem respondesse que sim, era proibido de dar sangue. Em 2010, o Parlamento aprovou, sem nenhum voto contra, uma resolução do Bloco para acabar com essa pergunta. Fê-lo por duas razões. Primeiro, porque a questão não dava nenhuma garantia, uma vez que não perguntava aquilo que verdadeiramente interessa, que é saber se a pessoa se protegeu ou não. Segundo, porque esse critério de exclusão constituía um desperdício, já que inibia a recolha de sangue de quem, dormindo com homens, não tinha comportamentos de risco.
A decisão do Parlamento mereceu consenso e o problema parecia estar ultrapassado. Mas não estava. Houve técnicos de saúde que continuaram a fazer a pergunta oralmente e a utilizar a orientação sexual para excluir pessoas. Em 2012, o Ministro decidiu suspender a decisão de acabar com a discriminação e criou um grupo de trabalho para empatar, cujo mandato de três meses se prolongou por três anos. Hélder Trindade, o presidente do IPST, expunha no final de abril deste ano, na comissão de saúde, o pensamento do Governo agora vertido em despacho: os homossexuais podiam dar sangue, desde que fossem abstinentes.
Os argumentos para sustentar esta posição são sempre os mesmos. É assim “lá fora” e é uma questão “científica”. Acontece que nem um nem outro são verdade. Em Espanha, por exemplo, esta questão não existe nos questionários. E sobre dados “científicos”, o raciocínio apresentado é uma pura falácia.
Os estudos sobre prevalência do VIH mostram que esta é maior entre “homens que têm sexo com homens” do que entre homens que têm sexo com mulheres, o que se explicaria pela maior perigosidade do sexo anal desprotegido. Os mesmos estudos indicam que em Lisboa a incidência de VIH Sida é mais do dobro (31 casos por 100 mil habitantes) que no Porto (14 por 100 mil). Um e outro dado são estatisticamente objetivos? São. Concluir daí que “morar em Lisboa” é um fator de risco e que, portanto, quem mora na capital (ou ali morou no último ano) deve ser proibido de dar sangue não é científico. É estúpido. O mesmo se passa com a categoria “homens que têm sexo com homens”. Tal como os lisboetas não contraem VIH por serem lisboetas, os homens não contraem o vírus por dormirem com homens. Num caso e noutro, contraem por não se protegerem. Por isso, é sobre esse comportamento que interessa fazer a pergunta (“Nas relações sexuais que teve, protegeu-se? De que forma?”). E é essa que continua a não ser feita.
Mais uma vez, portanto, se insiste no erro e não nos concentramos na saúde pública. E o problema é que, quando se sobrepõe o preconceito ao rigor, as vítimas não são apenas os alvos diretos da discriminação. Somos todos.


Dirigente do Bloco de Esquerda, sociólogo.


22 de Agosto 2015 

Abutres perante a sua própria morte


Os abutres são importantes para o equilíbrio dos ecossistemas.

Todos os animais são importantes para o equilíbrio dos ecossistemas.

sábado, 22 de agosto de 2015

É horrível passar por animais acorrentados..




É horrível passar por animais acorrentados... espaços exíguos, escuros...
É horrível viver sem liberdade e carinho, votado à indiferença e à solidão, e tantas vezes dentro de quintas, de grandes terrenos, jardins, hortas, quintais, fábricas, armazéns, moradias ...
Quando os vejo e posso ir ter com eles, levo-lhes uma "festinha", umas palavras de carinho, de atenção...
Aparecem logo os donos, sorrateiramente, por detrás das cortinas ou por entre as portas, com sorrisos amarelos de hipocrisia e a escorrerem perversidade num olhos maus, muito maus, que revelam bem o que vai naqueles corações de pedra.
"Que se passa?", dizem num tom grosseiro e de ameaça...
Tento sensibilizar, esclarecer... Mas aquela gente é dura. Dura e fria como o aço.
Aquela gente não é gente nem nunca o será: são monstros, monstros que vivem do sadismo e da humilhação constante que aos outros infligem, sobretudo aos mais vulneráveis, neste caso, aos cães que acorrentam e que escravizam, sejam cães de guarda sejam as pobres cadelinhas parideiras com as quais assumem fazer negócio, até ao dia em que, precocemente envelhecidas e já sem força sequer para ladrar, são atiradas para a berma da estrada como um farrapo ou mantidas vivas à custa de um prato negro de comida azeda ou de uma pinga de água suja e lodosa.
Esta gente não é gente nem é bicho: são monstros, monstros de rosto humano, bestas assassinas, cruéis, que infernizam a vida dos animais nesta morte lenta a que os obrigam, porque uma vida sem liberdade vida não é.
Pobres animais! Nunca vos esqueço.
Revolta-me não conseguir tirar-vos das mãos dos carrascos que vos têm presos há anos apesar de tantas vezes lhes pedir que vos tratem com dignidade.
Dói tanto ver-vos assim.
Viver não é assim.
Que o dia da liberdade não tarde. Que a paz chegue depressa às vossas vidas, meus peludinhos, mesmo que essa paz em luz tenha de transformar-se para alcançardes a liberdade merecida e viverdes felizes, finalmente, para sempre, numa estrela brilhante que todas as noites me ilumine e me faça sonhar com um mundo melhor.


Nazaré Oliveira

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

As touradas e a Política - As touradas e a RTP

 



Um touro colhe um cavalo em Abiúl, na "Corrida do Emigrante", que a RTP (Radio Televisão Portuguesa) transmitiu ontem à noite.
Quando acaba esta terrível barbaridade, crueldade, estes malditos e sádicos espetáculos? Que gente, esta, que isto vê, patrocina, promove, como a RTP e este medievalismo sanguinário, irracional, que não serve nem nunca serviu a cultura nem a dignidade que todos os animais merecem, sejam humanos ou não humanos?
E ninguém põe cobro "a isto"...

A RTP não pode continuar a fazer o que quer.
Serviço público?  Público? Que público? Que serviço? Qual a sua utilidade?

Vergonha, meus senhores! Ética, meus senhores!
Anda o nosso pouco e suado dinheiro (também) a subsidiar estes espetáculos de morte! COM QUE DIREITO? QUEM AUTORIZOU?

Isto não é nem nunca será cultura nem desporto.
Isto é tortura, tortura de seres inocentes, sadismo, diversão de e para gente perversa, frustrada, muito frustrada, muito mal consigo própria e com a vida.

Espero sinceramente que as próximas eleições tragam a mudança que há muito desejo para o meu país, particularmente, a mudança de mentalidade e uma nova atitude crítica, cívica, quer do nosso povo quer dos nossos representantes.

Sobretudo, espero seriedade na Política e uma legitimidade democrática que sirva verdadeiramente os interesses de um povo sistematicamente entorpecido pela  ignorância de quem nos tem governado e mentido através de campanhas eleitorais hábil e exclusivamente preparadas para a caça ao voto, vergonhosamente arquitetadas não em função de valores e de princípios mas em função de números e de uma estatística do Poder para a qual têm servido, mal e despudoradamente.

Tudo é Política, pessoal, e a Política é essencial às nossas vidas, ao desenvolvimento ou estagnação do nosso país e à defesa dos valores humanistas nos quais acreditamos ou perante os quais nos mostramos ou não indiferentes. 

Os maus políticos apropriam-se dos votos para chegarem ao hemiciclo de S. Bento ou aos ministérios e secretarias de estado ou outras instituições, caso da RTP e do seu Conselho de Administração, no qual, obviamente, o governo coloca homens da sua inteira confiança.
Os maus políticos só estão interessados na gestão e governo de si próprios e funcionam ou a mando das clientelas que financeiramente os suportam (a si, aos seus partidos, aos seus amigos e familiares), como estas, por exemplo, ligadas à tauromaquia.

Os bons políticos servem com dignidade as funções para as quais foram mandatados mas não se servem delas para se servirem.

Os bons políticos têm de ser bons cidadãos e os bons cidadãos servem boas causas.

Práticas bárbaras, cruéis, como as touradas e outros espetáculos macabros, boas causas não são nem nunca serão.

Têm de acabar.
Por isso mesmo.



Nazaré Oliveira


*Fotos, terríveis, dessa mesma "corrida", in https://www.facebook.com/ONGANIMAL

domingo, 16 de agosto de 2015

Os cartazes do PS







Lamentável! Profundamente lamentável!
Inadmissível.
Indesculpável.

Um partido que isto fez, que das pessoas se serviu - sem a sua autorização - atribuindo-lhes frases que afinal não proferiram e que nada têm a ver, pelos vistos, com a sua própria vida, não está a ser sério com estas pessoas mas, sobretudo, com os milhares de desempregados e de trabalhadores precários, com os que foram realmente obrigados a emigrar, esses sim, verdadeiramente queixosos e profundamente humilhados com a política vigente.

Incrível, este marketing político que da mentira e da demagogia se apropria, afastando cada vez mais as pessoas da Política, dos partidos, das urnas...

Sabendo tudo isto e a forma como isto conceberam, chega a ser humilhante ler as frases que publicaram, como se a realidade fosse uma brincadeira de crianças inocentes ou um jogo, um jogo viciado logo à partida.

Não, não é assim que se faz campanha eleitoral que se pretende (sempre) transparente e credível.

Não é assim que se ganham votos, pelo contrário. 

De demagogia e de mentiras estamos nós fartos! E de impunidades também.



Nazaré Oliveira