quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

«Toda a gente ambiciona viver na Corte, sem outra forma de ofício.»

 




Carta enviada de Bruges, pelo Infante D. Pedro, Duque de Coimbra, a seu irmão D. Duarte, em 1426



«O governo do Estado deve basear-se nas quatro virtudes cardeais e, sob esse ponto de vista, a situação de Portugal não é satisfatória. A força reside em parte na população; é pois preciso evitar o despovoamento, diminuindo os tributos que pesam sobre o povo. Impõem-se medidas que travem a diminuição do número de cavalos e de armas. É preciso assegurar um salário fixo e decente aos coudéis, a fim de se evitarem os abusos que eles cometem para assegurar a sua subsistência. É necessário igualmente diminuir o número de dias de trabalho gratuito que o povo tem de assegurar, e agir de tal forma que o reino se abasteça suficientemente de víveres e de armas; uma viagem de inspecção, atenta a estes aspectos, deveria na realidade fazer-se de dois em dois anos. A justiça só parece reinar em Portugal no coração do Rei [D. João I] e de D. Duarte; e dá ideia que de lá não sai, porque se assim não fosse aqueles que têm por encargo administrá-la comportar-se-iam mais honestamente. A justiça deve dar a cada qual aquilo que lhe é devido, e dar-lho sem delonga. É principalmente deste último ponto de vista que as coisas deixam a desejar: o grande mal está na lentidão da justiça. Quanto à temperança, devemos confiar sobretudo na acção do clero, mas ele [o Infante D. Pedro] tem a impressão de que a situação em Portugal é melhor do que a dos países estrangeiros que visitou. Enfim, um dos erros que lesam a prudência é o número exagerado das pessoas que fazem parte da casa do Rei e da dos príncipes. De onde decorrem as despesas exageradas que recaem sobre o povo, sob a forma de impostos e de requisições de animais. Acresce que toda a gente ambiciona viver na Corte, sem outra forma de ofício.»

 ( resumo feito por Robert Ricard e constante do seu estudo «L’Infant D. Pedro de Portugal et “O Livro da Virtuosa Bemfeitoria”», in Bulletin des Études Portugaises, do Institut Français au Portugal, Nova série, tomo XVII, 1953, pp. 10-11).

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Ministério da Educação: mau pagador e sem vergonha

As AEC desenrolam-se fora do horário de aulas Nelson Garrido




Cerca de metade das 32 entidades que celebraram contratos com o Ministério da Educação e Ciência (MEC) para o financiamento das Actividades de Enriquecimento Curricular (AEC) continuam sem ter recebido qualquer verba. 

A 26 de Dezembro, o MEC garantiu que tinha já regularizado os pagamentos com este fim e que apenas restavam “situações pontuais por resolver”.
Na quarta-feira, questionado de novo pelo PÚBLICO, o ministério esclareceu o que entende serem “situações pontuais” neste caso. “As situações pontuais que referimos eram as que, por serem montantes maiores, estavam dependentes de visto do Tribunal de Contas (TdC) para serem regularizadas. São só essas situações que estão pendentes”, informou.

As AEC, que se desenrolam fora do horário lectivo, destinam-se às crianças do 1.º ciclo e têm sido o pilar essencial para que as escolas deste nível de escolaridade estejam a funcionar até às 17h30, o que passou a ser obrigatório desde 2006.

A portaria que dá a conhecer quais as entidades financiadas pelo MEC para garantirem as AEC neste ano lectivo foi só publicada a 26 de Dezembro. 

Estão atribuídos cerca de 16 milhões de euros a 32 entidades. Destas, 17 têm um financiamento superior a 350 mil euros, o que obriga a que estes processos sejam sujeitos a visto prévio do Tribunal de Contas. Em pelo menos um caso, isto já foi feito: a Câmara de  Vila Nova de Gaia recebeu no passado dia 5 a tranche que faltava relativa ao cerca de 435 mil euros prometidos para o primeiro período de aulas. A outra parte chegou a 31 de Dezembro, indicou a assessora de imprensa desta autarquia.

A maior parte (28) das entidades com quem o MEC celebrou acordos para o financiamento das AEC são câmaras municipais. Entre estas, as que têm mais verbas prometidas para 2014/2015 são as autarquias de Sintra (cerca de um milhão e 900 mil euros), Vila Nova de Gaia (cerca de um milhão de euros) e Loures (935 mil euros).
“Neste momento está em falta o pagamento de 687 mil euros relativos ao primeiro período do ano lectivo de 2014/2015. A informação que temos é que está a aguardar visto do Tribunal de Contas”, informou o vereador da Educação da Câmara de Sintra, Rui Pereira. Tem sido a autarquia a garantir o pagamento dos professores envolvidos nas AEC, acrescentou. O mesmo se passa em Loures, com pagamentos em atraso de cerca 328 mil euros.

O MEC enviou para o Tribunal de Contas 80 contratos de financiamento de colégios do ensino especial, escolas profissionais e do ensino artístico especializado e entidades promotoras das AEC, entre outros. Segundo informação do TdC, dois destes contratos foram enviados em Outubro e os restantes chegaram a partir de 15 de Dezembro. Todos foram devolvidos ao MEC por faltarem elementos.
Em relação aos dois que chegaram em Outubro, a situação ficou resolvida no princípio de Dezembro. Mas até quarta-feira passada, o MEC só tinha sido reenviados para o tribunal 12 dos outros 78 contratos que haviam sido devolvidos.

“Já financiámos o Estado em cerca de 200 mil euros. A nossa capacidade, enquanto instituição, esgotou-se”. O desabafo é do director da instituição particular de solidariedade social Know How - Aprender a Brincar, Mário Nobre, que garante as AEC em 60 escolas da zona de Lisboa e região Centro. Têm a cargo 4271 alunos e contratos com cerca de 300 professores. Têm um financiamento prometido de cerca de 647 mil euros, dos quais 263 mil deveriam ter sido pagos no princípio do ano lectivo. Até agora não receberam nenhuma verba do Estado. 
“Estamos com pagamentos em atraso a professores. Toda esta situação está a pôr em causa o trabalho que temos vindo a desenvolver. Na verdade, já não sabemos o que fazer”, lamenta Mário Nobre.



 in http://www.publico.pt/sociedade/noticia/estao-por-pagar-quase-metade-dos-contratos-garantidos-pelo-mec-para-as-actividades-de-enriquecimento-curricular-1681627


segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Às vezes é no meio de tanta gente que descubro afinal aquilo que sou
















 

Ao longe, a Rádio traz-me à lembrança este  poema*, um dos mais bonitos cantados em português, da autoria de Maria Guinot que também é a autora da música.
Quem me dera que houvesse sempre este casamento perfeito entre música e poema!



*
Às vezes é no meio do silêncio
Que descubro o amor em teu olhar
É uma pedra
Ou um grito
Que nasce em qualquer lugar

Às vezes é no meio de tanta gente
Que descubro afinal aquilo que sou
Sou um grito
Ou sou uma pedra
De um lugar onde não estou

Às vezes sou também
O tempo que tarda em passar
E aquilo em que ninguém quer acreditar

Às vezes sou também
Um sim alegre
Ou um triste não
E troco a minha vida por um dia de ilusão
E troco a minha vida por um dia de ilusão

Às vezes é no meio do silêncio
Que descubro as palavras por dizer
É uma pedra
Ou um grito
De um amor por acontecer

Às vezes é no meio de tanta gente
Que descubro afinal p'ra onde vou
E esta pedra
E este grito
São a história d'aquilo que sou





Pelas crianças e adultos mortos em conflitos por todo o mundo







Sem retirar a relevância às recentes manifestações que em todo o mundo ocorreram em defesa da liberdade de expressão, direito maior das democracias, necessidade basilar da existência humana, é impossível que não pensemos nas crianças utilizadas como detectores de minas ou escudos humanos, ou bombas, como nos recentes atentados provocados por Boko Haram, ou como escravos sexuais ou soldados que as drogas ou o medo, ou a dependência grupal, tornam temerários guerreiros.