segunda-feira, 27 de agosto de 2012

A neutralidade ajuda o opressor, nunca a vítima



“Embora haja muitas pequenas e fáceis ações que possamos realizar para ajudar os animais, duas coisas que já não são aceitáveis são a inação e a indiferença. Atingimos o ponto em que já chega, ou na verdade, em que o que já chega é demasiado - causamos muitíssimo sofrimento e dor desnecessários no mundo. Existem canários em minas de carvão por todo o mundo a dizerem-nos que há algo de profundamente errado.

O laureado Nobel e pacifista Elie Wiesel encoraja-nos: «Tomem partido. A neutralidade ajuda o opressor, nunca a vítima. O silêncio encoraja o torturador, nunca o torturado.» O silêncio é mortal para os animais. Há um sentido de urgência – o tempo não está a nosso favor. A indiferença sai muito cara. Temos de agir agora com compaixão e amor por este magnífico mundo.

Naturalmente, não deveremos deixar que a raiva nos guie. Temos de nos manter ativistas com compaixão, constantemente. É isso que nos dá verdadeiro impacto para influenciar os outros, mas também nos ajuda a nós mesmos. Sermos bondosos faz-nos sentir bem; é uma experiência profunda, e mesmo espiritual, espalhar a compaixão, a bondade e o amor. E também é contagioso. Temos de ser bondosos e simpáticos e cooperarmos uns com os outros, para podermos definir e trabalhar com objetivos comuns, mesmo quando discordarmos a respeito da via exata. Nunca poderemos ser demasiado bondosos, nem ninguém é perfeito. A humildade e a via para avançar é reconhecermos as nossas próprias imperfeições, mesmo quando procuramos a mudança nas ações dos outros. Devemos questionar a ação de uma pessoa e não atacarmos as pessoas em si.

Todos os dias, devemos procurar oportunidades para fazermos algo pelos animais e criarmos oportunidades para que os outros o façam. Quando o fizermos, precisamos de ser pacientes, pois, desde que estejamos a deslocar-nos na direção certa, as coisas melhorarão para os animais e para a Terra. Tal como vimos, o ativismo tem custos – como o assédio, a intimidação e a frustração - , mas estes são o preço de colocarmos as nossas crenças em ação para impedirmos a crueldade e salvarmos vidas. Protestem suave, mas insistentemente; mudem tanto as ações como os espíritos e os corações. As mudanças que são impostas têm em geral pouca duração e fazem pouca diferença.

Muitas vezes, são precisos numerosos esforços para acumular o ímpeto necessário para produzir as profundas modificações na atitude e no espírito que faz verdadeiramente a diferença. É importante ouvir todas as opiniões. Isto é importante para ajudar a encontrar e a resolver as causas na raiz dos problemas, mas é também uma tática inteligente. Temos de dominar os argumentos dos opositores.

Apenas conhecendo as táticas e os argumentos dos vossos opositores é que conseguirão montar uma ofensiva com sucesso. (...) De facto, os problemas respeitantes aos animais são tão vastos que exigem soluções pró-ativas criativas mergulhadas em profunda humildade, compaixão, cuidado, respeito e amor. Não podemos permitir que as nossas preocupações e os nossos medos nos tornem inativos e pessimistas e não podemos ceder ao cinismo. (...) Precisamos de nos concentrar em sermos positivos em tempos difíceis e desafiadores e não deixarmos que a nossa frustração nos leve a melhor. Temos de agir localmente e pensar globalmente.

Finalmente, é essencial lembrar que cada indivíduo conta e que cada indivíduo faz a diferença. Tal como observa Margaret Mead: «Nunca duvidem de que um pequeno grupo de cidadãos refletidos e empenhados pode mudar o mundo. Na realidade, tem sido a única coisa que o tem conseguido.» É também importante lembrar que Gandhi tinha razão – por muito que as pessoas lutem contra vocês, se acreditarem no que estão a fazer, acabarão por vencer.”

 

"Manifesto dos Animais", por Marc Bekoff (2010)

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Palavras de Miguel Portas

Parece que foi ontem, Miguel, que nos despedimos de ti!
Há muito que estava para publicar esta foto que os teus amigos puderam trazer no dia 24 de Abril deste ano. Esta foto e estas palavras.
Palavras de um GRANDE CIDADÃO QUE TAMBÉM SOUBE SER UM GRANDE POLÍTICO.

Não à redução de pena!

Duas das meninas encarceradas e mortas: Julie e Melissa

O assassino
A assassina




Há pouco, na TV, mais uma vez "o caso Marc Dutroux" e a lembrança daquela cave dos horrores. Falavam da redução da pena de Michelle Martin.

Meu Deus, como é possível reduzir-se a pena a alguém que foi cúmplice da crueldade e do assassínio de meninas, mortas lentamente e premeditadamente pelo seu marido, com o qual, inclusive, colaborou neste cenário macabro?

Como é possível (na Bélgica ou onde quer que seja), dar-se hipótese a "gente" assim de viver em liberdade, como se nada de medonho, hediondo e terrivelmente devastador tivesse acontecido? Como é possível fazer-se justiça não a fazendo, isto é, não a obrigando a cumprir? Quem devolve a vida àquelas meninas? Quem imagina o sofrimento e tortura por que passaram? E os seus pais? OS SEUS PAIS?

Quanta dor, quanta revolta, desespero inimaginável e angústia constante!

Numa sociedade que cada vez mais se arvora de igualitária e que cada vez mais prega a justiça, assistimos a casos como este onde os criminosos, simplesmente, passam pelas cadeias e delas saem a sorrir, como este monstro chamado Michelle Martin.

A sociedade atual cada vez engendra mais monstros destes. Que fazer? JUSTIÇA.

JUSTIÇA IMPLACÁVEL E EXEMPLAR PARA PEDÓFILOS!

Esta mulher não pode ver a sua pena reduzida seja sob que argumento for. Nunca!

O seu marido, Marc Dutroux, que ela sempre apoiou no seu macabro trabalho e sobre o qual nunca nem a ninguém denunciou, foi um assassino em série. Sequestrou e  abusou de 6 crianças das formas mais violentas que se possam imaginar.

A sua prisão, em 1996, nem por isso evitou que milhares e milhares de belgas, nesse ano, viessem para a rua e daí estendessem a sua revolta ao mundo inteiro através da "Marcha Branca" de 300.000 pessoas em  Bruxelas, uma vez que consideravam que semelhante (s) ato (s) de horror jamais poderiam  ser atenuados fosse pelo que fosse.

Este terrível assassino  era de tal modo  habilidoso e assustadoramente manipulador que foi capaz de convencer um psiquiatra de que era incapaz. Com isso, imaginem,  passou a receber uma pensão do governo. Recebia, até, sedativos, que mais tarde usou nas meninas sequestradas

Matou-as pela violência continuada dos abusos sexuais, psicológicos… matou-as à fome durante meses, sistematicamente  acorrentadas numa cave, numa cama,  tendo  algumas destas crianças sido enterradas vivas, com conhecimento da mulher .

 Centenas de vídeos pornográficos comerciais foram encontrados nas casas de Dutroux, juntamente com uma quantidade considerável de vídeos pornográficos que o mesmo tinha produzido com a sua mulher  Michelle Martin, a tal que a Justiça belga vai ajudar, reduzindo-lhe  a pena: “O tribunal de Mans, que se reuniu pela quinta vez, desde 2007, para decidir sobre o pedido de liberdade condicional de Michelle Martin acabou por autorizar a entrada da reclusa no convento das irmãs clarissas em Malone, perto de Namur, no sul do país, na condição de não se aproximar dos familiares das vítimas de Dutroux, que se opuseram à decisão judicial. A abadessa Christinne, das irmãs clarissas de Malonne, confirmou à France Presse que o convento está prestes a acolher a ex-mulher de Marc Dutroux.

Michelle Martin, 52 anos, está presa desde 1996 e cumpriu em 2004 metade da pena de trinta anos de cadeia a que tinha sido condenada.”

(Metade, não, pois só cumpriu 8 anos!)

E mais uma vez a ajuda da Igreja, a bênção da Igreja”, em cujo regaço, afinal, todos têm lugar.

Michelle Martin , a tal que cúmplice sempre foi de Dutroux e que como tal foi julgada (Dutroux recebera a sentença de prisão perpétua e Michelle Martin 30 anos).

Em 2011, o pedido de liberdade condicional foi aceite no Tribunal de Mons, facto que se transformou em assunto polémico na Bélgica. De acordo com o programa de reinserção da reclusa, a ex-mulher de Dutroux, que afirmou ter-se tornado "muito religiosa" na prisão, propôs residir num convento em França.

Que “santa”! Que arrependida, esta maldita mulher, figura-chave do caso Dutroux, conivente, presente e colaboradora em todos os seus atos macabros!

NÃO À REDUÇÃO DE PENA NEM À SAÍDA DA PRISÃO DESTA (TAMBÉM) ASSASSINA!

NÃO Á REDUÇÃO DE PENA em casos monstruosos como este, seja na  Bélgica ou em que lugar for! SIM À PRISÃO PERPÉTUA PARA CARRASCOS DE INOCENTES.

A VIDA DESTAS MENINAS JAMAIS voltará e a dos seus pais num inferno para sempre se transformou.

Esta é a União Europeia civilizada? Não, mas já era tempo que o fosse. No Direito e não só.




Nazaré Oliveira

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

If you're going to San Francisco

Scott McKenzie!
Jamais esquecerei a tua "San Francisco", uma canção que ficará para a História dos anos 60,  para a História da Música mas, sobretudo, para a História da juventude no século XX.

Belíssima! Ontem, hoje, sempre!


If you're going to San Francisco
Be sure to wear some flowers in your hair
If you're going to San Francisco
You're gonna meet some gentle people there
For those who come to San Francisco
Summertime will be a love-in there.
In the streets of San Francisco
Gentle people with flowers in their hair.
All across the nation such a strange vibration.
People in motion.
There's a whole generation with a new explanation.
People in motion. People in motion.
For those who come to San Francisco
Be sure to wear some flowers in your hair.
If you come to San Francisco
Summertime will be a love-in there.
If you come to San Francisco
Summertime will be a love-in there.





sábado, 18 de agosto de 2012

Explicações claras sobre um país obscuro

Ontem, mais uma excelente análise sócio-política, desta vez, com Helena Roseta.
Clara, objetiva, pragmática, levanta aspetos cruciais da atual conjuntura quer no âmbito nacional quer europeu, questionando muitas das medidas adotadas pelo PM que, em nome da austeridade, cada vez empobrece mais quem rico nunca foi ou culpa nunca teve deste estado de calamidade a que certa gente nos fez chegar.
Uma brilhante explicação. Gostei muito.

Pôr finalmente os ricos a pagar


Crise do euro

Der Tagesspiegel Berlim -  17.8.12

Para fazer face à dívida soberana, os governos carregam nos impostos da classe média. No entanto, são maus investimentos feitos pelos mais ricos – banca, imobiliário, dívida soberana – que estão por trás da atual crise. Daí a ideia, que o liberal Der Tagesspiegel apoia, de pôr as grandes fortunas a entrar com dinheiro.


Uma vez mais, este ano, o dirigente do Partido Social-Democrata [alemão], Sigmar Gabriel associou-se aos sindicatos para exigir impostos mais altos para os mais ricos, a fim de distribuir mais equitativamente o fardo da crise. Para ele, trata-se de "patriotismo social". Do outro lado do espetro político, os democratas-cristãos e os liberais apressaram-se a criar uma frente para proteger as famílias mais abastadas, acusando-o de estar a recuperar um velho refrão do socialismo. O debate assume tons cansativos de disputa eleitoral.

Mas é uma interpretação errónea. Há muito tempo que as disparidades na distribuição dos rendimentos e da riqueza, que se acentuaram nos últimos anos, deixaram de ser uma simples questão de igualdade. Na realidade, essas disparidades são uma das principais causas da crise atual.

Com uma riqueza cada vez maior concentrada nas mãos de uma pequena minoria, uma proporção crescente do produto nacional alimenta a procura de investimentos financeiros, e já não de bens e serviços. A população abastada da Europa investe o dinheiro em títulos de bancos, atividades imobiliárias e obrigações estatais, emitidos na Irlanda, Portugal, Grécia ou Espanha, acompanhados de suculentas taxas de juros. E assim, financiou gigantescos maus investimentos – habitações e autoestradas vazias, equipamentos aberrantes [profusão de estádios de futebol, por exemplo] – que esses países nunca poderiam criar por si mesmos.

Salvar o património dos mais ricos na Europa

Basicamente, os empréstimos dos fundos de apoio da zona euro são utilizados para ajudar estes Estados e os seus bancos a permanecer solventes para poderem cumprir a dívida para com maus investidores. Não são os alemães (ou os holandeses, finlandeses, etc.) que estão a apoiar os gregos, irlandeses ou espanhóis, mas os contribuintes da classe média que estão a salvar o património dos mais ricos da Europa.

Para além disso, os detentores de altos rendimentos contribuem pouco para o financiamento dos orçamentos nacionais. Os países da zona euro criaram realmente uma união monetária, mas nunca estabeleceram uma política fiscal comum. Em vez disso, envolvem-se numa corrida a baixas de impostos para atrair capital. Resultado: os impostos sobre rendimentos de capital caíram para os níveis mais baixos de que há registo, enquanto, à escala europeia, as fortunas dos particulares aumentaram para níveis equivalentes a duas ou três vezes as dívidas nacionais.

Assim, pretende-se que os mais ricos contribuam para o pagamento dos maus investimentos. Só que esta questão é demasiado importante para ser tratada no quadro de uma campanha eleitoral nacional. É preciso, finalmente, exigir a alteração da atual política de "salvação", que não é correta.

Até agora, os funcionários dos programas de recuperação da UE apenas exigem dos países em crise uma redução das prestações sociais e uma subida dos impostos, à custa das classes médias. Entretanto, os armadores gregos, os magnatas do imobiliário irlandês e multimilionários espanhóis não pagam praticamente impostos e colocam o seu dinheiro em paraísos fiscais. A prioridade de quem quer salvar o euro devia ser lutar contra estas discrepâncias. Assim, os representantes da impopular "troika" europeia ainda podiam tornar-se heróis.

Tendência

Reação contra os ricos torna-se global

“Nunca é muito bom sinal quando os políticos começam a apelar ao patriotismo dos contribuintes”, escreve Gideon Rachman no Financial Times, depois de o Governo francês ter anunciado, pela voz do ministro Pierre Moscovici, que vai subir a taxa máxima de imposto sobre os rendimentos para 75 por cento.

É um equívoco descrever a administração Hollande como dinossauros socialistas. A verdade é que o novo Governo francês está no extremo de uma nova tendência mundial: uma reação internacional contra a riqueza que está a reformular a política da Europa aos EUA e à China. [...]

O Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, na campanha para as eleições de novembro, tem vindo a capitalizar politicamente as suas promessas de taxar “milionários e multimilionários”, enquanto classifica o seu rival republicano, Mitt Romney, como o representante das elites que não pagam impostos. […]

Assim, esse género de mudança é suscetível de provocar uma reação política. Os políticos ocidentais, de Barack Obama a François Hollande estão a tentar captar e canalizar esse novo estado de espírito... Se este novo clima endurecer, pode marcar o fim de uma era de baixa de impostos, desregulamentação e desigualdade crescente, que começou no final de 1970, com a ascensão de Margaret Thatcher e Ronald Reagan, no Ocidente e de Deng Xiaoping na China...

terça-feira, 14 de agosto de 2012

O início da CAUSA ANIMAL

A emergência do Direito Natural e consequentemente a consciência dos Direitos do Homem no panorama filosófico e político na segunda metade do século XVIII fizeram surgir nas elites políticas e intelectuais europeias uma sensibilidade, lenta mas progressiva, relativamente a questões consideradas como dogmas ao longo dos séculos, como por exemplo, a questão da limitação e separação de poderes, as liberdades fundamentais, a abolição da escravatura, a abolição da pena de morte, a emancipação das mulheres, a repartição justa da riqueza, a legitimidade da propriedade, etc. No mesmo contexto filosófico-político alguns filantropos problematizaram e questionaram a relação de domínio do Homem em relação aos animais. No espírito de muitas individualidades o recurso à violência para com os animais, fundamentado na suposta superioridade do Homem perante a Natureza era tida como imoral, quer à luz do Cristianismo, quer à luz da Razão. Os maus tratos aplicados aos animais eram considerados cada vez mais como resquícios da barbárie e da incivilização dos antigos tempos do obscurantismo. O Homem entrara numa nova idade da História, a idade da Razão e do progresso moral, e essa evolução tinha necessariamente de se refletir na relação homem - homem e homem - animal. Não tardaram a surgir propostas para que o poder político adotasse medidas de proteção aos animais.

Os primeiros esforços legislativos contemporâneos para proteção animal contra os maus tratos dos humanos surgem no Reino Unido no início do século XIX. Em 1800, Sir William Pulteney tenta introduzir no código jurídico inglês uma lei que proíbe o bull-baiting, projeto-lei recusado pelo Secretário da Guerra William Windham (1750 - 1810) com o argumento de que tal lei era contra o entretenimento das classes populares da sociedade inglesa. No ano seguinte, William Windham rejeita uma outra proposta legislativa de proteção animal, da autoria de William Wilberforce (1759 - 1833) fundamentando que tal lei tinha sido idealizada pelos metodistas e jacobinos com a intenção de destruir o “antigo caráter inglês pela abolição dos desportos rurais”. Mais uma tentativa surge em 1809 pelo Lord Chancellor Thomas Erskine (1750 - 1823), ao propor uma lei de prevenção da crueldade sobre os animais, aprovada na Câmara dos Lordes mas rejeitada na Câmara dos Comuns. Uma vez mais William Windham insurge-se contra tais propostas legislativas, alegando desta vez que eram incompatíveis com os tão populares divertimentos da caça à raposa e a corrida de cavalos.

Após estas tentativas frustradas, finalmente, surge a primeira lei de proteção animal. É a lei Act to prevent the cruel and improper treatment of cattle (Lei de prevenção ao tratamento cruel e impróprio do gado) mais conhecida pelo nome do seu autor, "Martin's Act". Esta lei, da autoria do deputado Richard Martin (1754 - 1834) foi aprovada pelo parlamento britânico em 1822. A designação “gado” no título da lei apenas incluía boi, vaca, ovelha, mula, e burro, deixando de fora outras espécies como o touro e o cão que foram englobadas na lei em atualizações posteriores (leis de 1835, 1849 e 1876).

O primeiro julgamento ao abrigo do Martin’s Act foi o de Bill Burns, vendedor de fruta ambulante, que agrediu o seu burro de carga. O caso na altura ficou famoso em Inglaterra devido ao facto de o próprio Richard Martin ter acusado Bill Burns e durante o julgamento ter levado o burro à sala do tribunal como prova das agressões para espanto dos juízes e público assistente.


"The trial of Bill Burns" (o julgamento de Bill Burns). O deputado do parlamento britânico, Richard Martin, leva o burro do acusado Bill Burns a uma das sessões do julgamento para demonstrar ao juiz os maus tratos infligidos pelo dono, episódio que causou grande sensação na época, nomeadamente nos jornais. Esta pintura (óleo sobre tela) está atualmente na sala da Royal Society for the Prevention of Cruelty to Animals.

Richard Martin, Willian Wilberforce e outros estiveram envolvidos na fundação da Society for the Prevention of Cruelty to Animals em 1824, a primeira instituição do mundo dedicada à proteção animal. Esta instituição conseguiu fazer com que o Martin's Act de 1822 fosse alargado no seu âmbito pela Cruelty to Animals Act (lei da crueldade sobre os animais) de 1835, que abrangia cães e outros animais domésticos, abolia o bear-baiting e a luta de galos, assim como impunha melhores condições para os animais nos matadouros. A legislação de proteção animal inglesa foi sendo sucessivamente consolidada e ampliada ao longo do século XIX pelas leis de 1849 (Cruelty to Animals Act 1849 ), e de 1876 ( Cruelty to Animals Act 1876 ) de modo a abranger gradualmente mais espécies animais e modalidades de tratamento cruel ( consultar o site Animal Rights History para ter uma noção da produção legislativa inglesa sobre a proteção animal).
O Reino Unido surge, assim, como o "berço" do movimento da causa animal e da legislação de proteção animal na contemporaneidade, sendo em breve trecho imitado por outros países europeus e americanos.

E em Portugal?
Em Portugal pouco se conhece sobre o estado de consciencialização para o bem-estar animal na primeira metade de oitocentos. Percebe-se no entanto que a problemática da proteção animal está intimamente relacionada com as corridas de touros ou touradas.
Existem referências para este período indicadoras de que as corridas de touros seriam mal vistas por certas pessoas. Sabe-se que um dos governadores do reino na ausência da corte no Brasil, o Principal Sousa (17-- 1817) se esforçou por proibir as touradas entre 1810 e 1817.
Nas cortes constituintes (1821-1822) o deputado Borges Carneiro (1774 - 1833) apresentou à câmara constituinte um moção para a abolição das corridas de touros. No debate parlamentar perguntava ele aos seus colegas deputados:

« Ora qual foi o fim da natureza criando estes animaes [os touros]? foi para que o homem se podesse servir delles, e quando muito que sei servissem para seu sustento; mas não foi de certo para que os martyrizasse, os enchesse de flexas, e se divertisse com elles, destruindo-os pouco a pouco por meio do fogo e do ferro. Taes não forão os fins para que a Divindade pôz os outros animaes debaixo do poder do homem

Apesar da sua retórica e eloquência a moção foi rejeitada.



O deputado Borges Carneiro (1774 - 1833) eleito às cortes constituintes de 1821 -1822. No dia 4 de agosto de 1821 foi discutida nas cortes constituintes a sua moção para a abolição das touradas em Portugal. A moção foi rejeitada sob os mais variados argumentos.
Fonte:http://www.arqnet.pt/dicionario/borgescarneirom.html

Com o advento do Setembrismo, o ministro do Reino Passos Manuel (1801 -1862) governando em ditadura, aboliu a 19 de setembro de 1836 as corridas de touros. Porém esta lei foi revogada no ano seguinte com a Carta de 30 de junho de 1837.

Com a Carta de 21 de agosto de 1837 as receitas das corridas de touros realizadas em Lisboa revertiam para a Casa Pia e as receitas das touradas realizadas nos restantes municípios do território português ficavam afetas às Misericórdias ou a outras instituições pias, associando assim as touradas à caridade, o que deu mais um argumento a favor dos defensores da tauromaquia.


Artigo in 
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