terça-feira, 21 de junho de 2011

Ensinar bem é um processo extremamente complexo...

"Mais de trinta anos de ideologia dos direitos adquiridos e uma propaganda sindical falsamente naïve, alicerçada em visões patetas sobre a distribuição da igualdade entre os seres humanos, conduziu a uma defesa irracional da ideia de que todos os professores são bons – quando não são,
nem serão, porque ensinar bem é um processo extremamente complexo, amplo e difícil, acessível apenas a alguns e totalmente dependente daquele factor, indeterminado e potente, que se chama vocação – conduziram, a meu ver, a um sistema de quotização deficiente e injusto.

Tenho visitado muitas escolas e parece-me evidente que, no nosso país, a distribuição da competência educativa é muito pouco normativa. De facto, há escolas que, mesmo operando em zonas socialmente complexas e, por vezes, explosivas, beneficiam de um corpo docente estável em que a maioria dos professores é muito competente e, por isso, um grande número merece ser avaliado como muito bom ou excelente.
De um modo geral, esse grupo exerce uma influência positiva e estruturante nos colegas mais jovens, nos “flutuantes” e naqueles que já estão a perder a pedalada, equilibrando competências e vigiando os processos mais decisivos, reproduzindo, pois, a competência e o empenho. Recentemente aplicaram o novo sistema de escolha dos seus actores e não se terão arriscado a escolhê-los mal.
Em contrapartida, tenho visto escolas que, independentemente de trabalharem em circunstâncias adversas como favoráveis, fazem, na generalidade, um trabalho perfeitamente medíocre. Nestes casos, a própria liderança não só é absolutamente desprovida de critério, método e reflexão, como muitas vezes é refém de um grupo de docentes que controla metodicamente os privilégios disponíveis, como os horários e as turmas especiais, fazendo dos professores mais inexperientes uma carne para canhão que roda continuamente à procura de melhores condições. É evidente que, nestas escolas, quase nenhum professor merece chegar aos escalões mais elevados. (…) escolas repentinamente esvaziadas pela reforma súbita de muitos dos seus melhores só querem paz e um projecto de futuro que lhes devolva alguma autoridade e espaço de maneio suficiente para resolverem os problemas quotidianos. (…) falta, mesmo, não ter receio de pagar melhor a quem é mesmo bom e de penalizar aqueles que não são capazes de avançar para além dos mesmos mínimos que propõem, com grande desrespeito, aos seus próprios alunos.
Já agora, também não se deveria perder a oportunidade de rever os vários sistemas de formação inicial e contínua de professores."
Cristina Sá Carvalho in Página 1 de 26.1.2010, Rádio Renascença