Como é que a sociedade portuguesa vê a corrupção? A Fundação lança um novo barómetro para compreender o fenómeno, considerado um dos problemas mais graves que o país enfrenta. A maioria dos inquiridos acredita que a política corrompe, considerando a integridade dos candidatos fundamental na hora de ir às urnas. Entre nesta experiência interativa e conheça os resultados do inquérito. infografia está disponível no final da página.
Caro professor: compreendo a sua situação. Foi contratado para ensinar uma disciplina e ganha para isso. A escolha do programa não foi sua. Foi imposta. Veio de cima. Talvez tenha ideias diferentes. Mas isso é irrelevante. Tem de ensinar o que lhe foi ordenado. Será julgado pelos resultados do seu ensino – e disso depende o seu emprego. A avaliação do seu trabalho faz-se por meio da avaliação do desempenho dos seus alunos. Se, de uma forma sistemática, os seus alunos não aprenderem, é porque não tem competência.
O processo de avaliação dos alunos é curioso. Imagine uma pessoa que conheça uma série de ferramentas, a forma como são feitas, a forma como funcionam – mas não saiba para que servem. Os saberes que se ensinam nas escolas são ferramentas. Frequentemente os alunos dominam abstractamente os saberes, sem entretanto conhecerem a sua relação com a vida.
Como aconteceu com aquela assistente de bordo a quem perguntei o nome de um rio perto de Londrina, no norte do Paraná. Ela respondeu-me: Acho que é o São Francisco. Apanhei um susto. Pensei que tinha apanhado o voo errado e que estava a chegar ao norte de Minas… Garanto que, numa prova, a rapariga responderia certo. No mapa saberia onde se encontra São Francisco. Mas não aprendera a relação entre o símbolo e a realidade.
É possível que os alunos acumulem montanhas de conhecimentos que os levarão a passar nos exames, sem saber para que servem. Como acontece com os “vasos comunicantes” que qualquer pedreiro sabe para que servem sem, entretanto, conhecerem o seu nome. O pedreiro seria reprovado na avaliação escolar, mas construiria a casa no nível certo. Mas você não é culpado. Você é contratado para ensinar a disciplina.
Cada professor ensina uma disciplina diferente: Física, Química, Matemática, Geografia, etc. Isso é parte da tendência que dominou o desenvolvimento da ciência: especialização, fragmentação. A ciência não conhece o todo, conhece as partes. Essa tendência teve consequências para a prática da medicina: o corpo como uma máquina formada por partes isoladas. Mas o corpo não é uma máquina formada por partes isoladas.
Às vezes, as escolas fazem-me lembrar o Vaticano. O Vaticano, 400 anos depois, penitenciou-se sobre Galileu e está prestes a fazer as pazes com Darwin. Os currículos, só agora, muito depois da hora, estão a começar a falar de “interdisciplinaridade”. “Interdisciplinaridade” é isto: uma maçã é, ao mesmo tempo, uma realidade matemática, física, química, biológica, alimentar, estética, cultural, mitológica, económica, geográfica, erótica…
Mas o facto é que você é o professor de uma disciplina específica. Ano após ano, hora após hora, ensina aquela disciplina. Mas, como ser de dever, tem de fazer de forma competente aquilo que lhe foi ordenado. A fim de sobreviver, faz o que deve fazer para passar na avaliação. A disciplina é o deus a quem você e os alunos se devem submeter. O pressuposto desse procedimento é que o saber é sempre uma coisa boa e que, mais cedo ou mais tarde, fará sentido.
São sobretudo os adolescentes que, movidos pela inteligência da contestação, perguntam sobre o sentido daquilo que têm de aprender. Mas frequentemente os professores não sabem dar respostas convincentes. Para quê aprender o uso dessa ferramenta complicadíssima se não sei para que serve e não vou usá-la? A única resposta é: Tens de aprender porque sai no exame – resposta que não convence por não ser inteligente mas simplesmente autoritária.
O que está pressuposto, nos nossos currículos, é que o saber é sempre bom. Isso talvez seja abstractamente verdade. Mas, nesse caso, teríamos de aprender tudo o que há para ser aprendido – o que é tarefa impossível. Quem acumula muito saber só prova um ponto: que é um idiota de memória boa. Não faz sentido aprender a arte de escalar montanhas nos desertos, nem a arte de fazer iglos nos trópicos. Abstractamente, todos os saberes podem ser úteis. Mas, na vida, a utilidade dos saberes subordina-se às exigências práticas do viver. Como diz Cecília Meireles: O mar é longo, a vida é curta.
Eu penso a educação ao contrário. Não começo com os saberes. Começo com a criança. Não julgo as crianças em função dos saberes. Julgo os saberes em função das crianças. É isso que distingue um educador. Os educadores olham primeiro para o aluno e depois para as disciplinas a serem ensinadas. Os educadores não estão ao serviço de saberes. Estão ao serviço de seres humanos – crianças, adultos, velhos. Dizia Nietzsche: Aquele que é um mestre, realmente um mestre, leva as coisas a sério – inclusive ele mesmo – somente em relação aos seus alunos. (Nietzsche, Além do bem e do mal).
Eu penso por meio de metáforas. As minhas ideias nascem da poesia. Descobri que o que penso sobre a educação está resumido num verso célebre de Fernando Pessoa: Navegar é preciso. Viver não é preciso.
Navegação é ciência, conhecimento rigoroso. Para navegar, são necessários barcos. E os barcos fazem-se com ciência, física, números, técnica. A própria navegação se faz com ciência: mapas, bússolas, coordenadas, meteorologia. Para a ciência da navegação é necessária a inteligência instrumental, que decifra o segredo dos meios. Barcos, remos, velas e bússolas são meios.
Já o viver não é coisa precisa. Nunca se sabe ao certo. A vida não se faz com ciência. Faz-se com sapiência. É possível ter a ciência da construção de barcos e, ao mesmo tempo, o terror de navegar. A ciência da navegação não nos dá o fascínio dos mares e os sonhos de portos onde chegar. Conheço um erudito que tudo sabe sobre filosofia, sem que a filosofia jamais tenha tocado a sua pele. A arte de viver não se faz com a inteligência instrumental. Ela faz-se com a inteligência amorosa.
A palavra amor tornou-se maldita entre os educadores que pensam a educação como ciência dos meios, ao lado de barcos, remos, velas e bússolas. Envergonham-se de que a educação seja coisa do amor-piegas. Mas o amor – Platão, Nietzsche e Freud sabiam-no – nada tem de piegas. O amor marca o impreciso círculo de prazer que liga o corpo aos objectos. Sem o amor tudo nos seria indiferente – inclusive a ciência.
Não teríamos sentido de direcção, não teríamos prioridades. A inteligência instrumental precisa de ser educada. Parte da educação é ensinar a pensar. Mas essa educação, sendo necessária, não é suficiente. Os meios não bastam para nos trazer prazer e alegria – que são o sentido da vida. Para isso é preciso que a sensibilidade seja educada. Fernando Pessoa fala, então, na educação da sensibilidade.
Educação da sensibilidade: Marx, nos Manuscritos de 1844, dizia que a tarefa da História, até então, tinha sido a de educar os sentidos: aprender os prazeres dos olhos, dos ouvidos, do nariz, da boca, da pele, do pensamento (Ah! O prazer da leitura!). Se fôssemos animais, isso não seria necessário. Mas somos seres da cultura: inventamos objectos de prazer que não se encontram na natureza: a música, a pintura, a culinária, a arquitectura, os perfumes, os toques.
No corpo de cada aluno encontram-se, adormecidos, os sentidos. Como na história da Bela Adormecida… É preciso despertá-los, para que a sua capacidade de sentir prazer e alegria se expanda.
in https://contadoresdestorias.wordpress.com/2012/02/19/caro-professor-rubem-alves/
Rubem Alves Gaiolas ou Asas - A arte do voo ou a busca da alegria de aprender
"Os governantes estão fartos de ser avisados". Portugal tem um Sistema de Alerta Precoce de Sismos "construído" mas está "em fase de testes" desde 2021
Não se trata apenas de enviar SMS de alerta como a Proteção Civil já faz quando há risco de incêndios ou de cheias. Sem registo de vítimas nem danos, o sismo da madrugada de segunda-feira, o mais forte a atingir o território continental desde 1969, deixou a descoberto o que ainda está por fazer para o país estar mais bem preparado para um sismo potente, incluindo melhorar as infraestruturas e efetivar o chamado Sistema de Alerta Precoce de Sismos - que começou a ser instalado em 2021 ao largo de Sagres, mas cuja implementação ainda não está concluída
Existem mecanismos para emitir alertas preventivos de sismo, mas Portugal ainda não tem implementados os instrumentos necessários para tal. O sismo de 5,3 de magnitude na escala de Richter que abalou Portugal continental na madrugada desta segunda-feira veio relançar o debate sobre o que falta cumprir para o país estar mais bem preparado para um sismo de grandes dimensões – incluindo a implementação de um Sistema de Alerta Precoce de Sismos (EEWS, na sigla inglesa), que começou a ser instalado há alguns anos no barlavento algarvio, mas que continua por concretizar por “falta de investimento”, indica à CNN Portugal um especialista em risco sísmico.
“Um alerta preventivo seria uma possibilidade se houvesse em Portugal instrumentos para isso, instrumentos que Portugal não tem, aquilo a que chamamos Sistemas de Alerta Precoce, ou Earthquake Early Warning Systems”, diz Francisco Mota de Sá, investigador de risco sísmico do Instituto Superior Técnico (IST). “Já temos esse tipo de avisos para tsunamis, mas não para sismos. Nós quisemos instalar um desses sistemas para sismos, mas as coisas não andaram para a frente porque não havia financiamento.”
Países com elevada atividade sísmica, como o Japão, têm já em vigor os seus próprios Sistemas de Alerta Precoce de Sismos, que conseguem emitir um alerta de risco de tremor de terra entre cinco a 10 segundos antes do abalo. “O Japão tem isso tudo e mais alguma coisa, mal deteta que vai ocorrer um episódio envia imediatamente avisos para os telemóveis, para os media e por aí fora”, explica o engenheiro. “O México também tem, consegue enviar alertas com entre cinco e 10 segundos de antecedência, e os Estados Unidos também têm o seu sistema. Por cá, os governantes estão fartos de ser avisados, muitos dos meus colegas desta área, de várias universidades, já fizeram vários avisos a vários governos e ainda nada aconteceu, ninguém parece interessado…”
Em fase de testes desde 2021
Em março de 2021, a Universidade de Évora anunciava a instalação dos primeiros quatro sismómetros do país a entre 20 e 30 metros de profundidade ao largo de Sagres, no Algarve, para detetar potenciais abalos gravosos, incluindo sismos gerados “na região atlântica adjacente ao território português”, naquela que seria a primeira fase de implementação de um EEWS no país.
Na altura, a instituição sublinhou em comunicado que a ideia era “capacitar a rede nacional de monitorização sísmica” através da instalação desse sistema de alerta precoce, que viria reforçar os sismómetros já existentes à superfície, um passo que definiu como “fundamental não só para Portugal, mas também para a Europa”. Mas mais de três anos depois, o projeto continua em fase de testes.
“Creio que o Sistema de Alerta Precoce está seguramente em fase de testes, entretanto saí do instituto e perdi o contacto com o projeto, mas sei que está construído, está desenvolvido, e quando se considerar que é fiável será colocado em funcionamento”, garante à CNN Portugal Miguel Miranda, ex-diretor do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). “Num sismo como este, a cerca de 60 quilómetros da costa de Sines, provavelmente não ganhávamos grande coisa com esse sistema, porque um sismo de 5,3 tem um tempo de desenvolvimento curto”, adianta o sismólogo. “Mas num com magnitude de 8 ou mais, que é aquilo que nos aterroriza, já podemos perder logo um quarto de hora na rutura, porque as ondas sísmicas são instantâneas, e com esse Sistema de Alerta Precoce ganhamos uns bons minutos entre sabermos que é um sismo importante e esse mesmo sismo atingir zonas mais críticas.”
Ter um EEWS em vigor permitiria, entre outras coisas, emitir alertas de risco sísmico, à semelhança do que a Proteção Civil já faz quando há risco de incêndios ou de cheias, através do envio automático de mensagens SMS à população. “Pelas nossas contas, conseguiríamos enviar um aviso entre cinco a 10 segundos antes [do sismo]”, explica Francisco Mota de Sá. “Cinco segundos parece pouco tempo mas dá para muita coisa, sobretudo no que toca a sistemas automatizados, por exemplo, dá para interromper processos que envolvem máquinas variadas e que estão a acontecer” quando é emitido o alerta.
Para Miguel Miranda, o sismo desta madrugada provou que os sistemas de observação sísmica “estão a funcionar muito bem”, mas acima de tudo deve servir para “impulsionar uma melhoria dos sistemas”, nomeadamente concretizar a implementação do primeiro EEWS em Portugal, e adaptar as infraestruturas para que esse sistema seja eficaz. “O sistema de alerta precoce ainda precisa de uma outra coisa, que é infraestruturas preparadas para, por exemplo, de uma forma automática, ligarem geradores de emergência, cortarem pipelines de gás natural, diminuírem a velocidade dos comboios de alta velocidade – infelizmente ainda não os temos, mas quando tivermos, esse sistema será absolutamente essencial.”
"Um sismo no mesmo sítio com magnitude superior a 6 seria diferente"
O sismo desta madrugada, o mais forte a atingir o território continental em mais de meio século, foi localizado com rapidez, mas é incerta a profundidade do seu epicentro. O Serviço Geológico dos EUA fala em 10,7 quilómetros de profundidade, o Centro Sismológico Euro-Mediterrânico refere uma profundidade de cinco quilómetros, a rede nacional sísmica aponta para 19 quilómetros de profundidade. Como refere Francisco Mota de Sá, “normalmente é o IPMA que tem equipamentos para calcular esses dados, mas seria preciso ter uma rede sísmica mais bem montada para conseguir localizar o epicentro de forma mais rápida”.
“Falta precisão e, para isso, precisamos de estações no fundo do mar, e isso não temos, porque é muito caro”, acrescenta Mourad Bezzeghoud, professor catedrático da Universidade de Évora que esteve envolvido no projeto de instalação das quatro estações sísmicas em furos ao largo de Sagres. “Essas quatro estações foram instaladas no âmbito de um projeto europeu, graças aos fundos europeus conseguimos comprar as estações, mas não há investimento a longo prazo do próprio Estado, só a curto prazo, o prioritário é o dia a dia, mas não se olha para o futuro.”
Confirmando que o EEWS português está ainda em fase de testes, Bezzeghoud destaca que “os alertas precoces são obviamente importantes em qualquer evento catastrófico, mas o mais importante é a prevenção, é ter a população preparada e os edifícios preparados” e aí Portugal continua atrasado. Zonas com elevada atividade sísmica, como o Japão e a Califórnia, lidam com sismos como o desta madrugada e com magnitudes superiores “com poucos danos porque tudo está preparado, e o problema aqui em Portugal, e na Europa de forma geral, é esta falta de preparação”, refere o geofísico.
“O mais problemático nem são os SMS, porque acho que a população hoje em dia já está mais preparada do que há 10, 20 ou 30 anos, com as alterações climáticas acho que toda a gente já está sensibilizada para estes fenómenos. Agora, ouvimos o Governo a dizer que está tudo bem, mas não está tudo bem, desta vez tivemos um sismo de 5,3 a 19 quilómetros de profundidade, por isso não aconteceu nada, mas um sismo no mesmo sítio com magnitude superior a 6 seria diferente, há uma ordem de grandeza diferente.”
“Atualmente”, refere Francisco Mota de Sá, “a Proteção Civil não tem meios para enviar alertas prévios à população, só consegue depois de o sismo já ter ocorrido” – o que também não foi o caso esta madrugada. Sentido às 05:11 da manhã, com epicentro a 58 quilómetros a oeste de Sines, a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) só emitiu um primeiro comunicado pelas 05:40, tendo “privilegiado o Facebook” para passar informações à população.
“O sismo foi sentido às 05:11 e às 05:40 foi quando tivemos a confirmação dos diferentes comandos regionais e subregionais de que, de facto, não houve danos pessoais nem materiais”, indicou o porta-voz da ANEPC, André Fernandes, numa conferência de imprensa durante a manhã. No rescaldo imediato do sismo, foi detetado um “pico de chamadas” para os serviços de Proteção Civil, período durante o qual o site do IPMA esteve em baixo, levando o grupo Iniciativa Cidadãos pela Cibersegurança a alertar para as “fragilidades” da morada online do único organismo capacitado para detetar e recolher dados precisos sobre sismos em território português. “Numa ocorrência deste tipo seria de esperar que o site do IPMA fosse a principal, mais fiável e segura fonte de informação, [mas] infelizmente não foi”, referiu o grupo, notando que o site esteve em baixo “entre as 05:11 e, pelo menos, as 05:40/05:55”.
Ao longo desse período de mais de meia hora, apenas os utilizadores Android receberam alertas para o abalo que acordou inúmeras pessoas em sobressalto, sobretudo na região de Lisboa e Vale do Tejo. O Google também disponibilizou de imediato informações sobre o sismo e recomendações à população para quem recorreu ao motor de busca no rescaldo do tremor de terra.
Os responsáveis da ANEPC dizem que foi dada primazia ao Facebook para a divulgação das primeiras informações sobre o sismo porque os dados mostram que “as pessoas acorrem mais a essa rede social” nestes eventos. Também adiantaram que a comunicação imediata com a população só está prevista quando estão em causa sismos com uma magnitude mínima de 6,1 na escala de Richter, por acarretarem maior risco de tsunamis – mas “a questão não se limita à magnitude”, destaca Francisco Mota de Sá.
“Não é só a magnitude que, por si só, torna útil o envio de um alerta, é a magnitude e a localização, a que distância está o epicentro. Este sismo de 5,3, se tivesse sido em terra ou muito próximo de alguma povoação, poderia ter causado danos muito graves – 5,3 de magnitude debaixo dos pés já causa muitas chatices.”
"Surpreendidos por um sismo moderado"
Os especialistas são unânimes a considerar que é preciso concretizar um sistema de alerta precoce também para sismos, nas palavras de Mourad Bezzeghoud “para que as autoridades, as forças de emergência e de segurança, possam rapidamente preparar o país para esse impacto e minimizar a destruição e as consequências” do abalo – incluindo emitir um aviso imediato à população que permita reduzir o número de feridos, de vítimas mortais e de danos à propriedade.
“Seria bom melhorar o sistema de alerta via SMS que, aliás, já existe, mas é sabido que não podemos impedir a ocorrência de um sismo”, observa o especialista da Universidade de Évora. “O que podemos fazer é tomar as devidas precauções para minimizar as suas consequências, quer no plano económico, quer no plano humano. A redução do número de vítimas durante um sismo passa por adaptar as estruturas dos edifícios e de outros tipos de obras” – e aqui ainda há trabalho a fazer. “O Estado faz auditorias, há planos de construção, mas não me parece que haja cuidado com isto. Há, aliás, poucos países com este cuidado, só aqueles com grande sismicidade. Acompanho a sismicidade nesta zona, o IPMA faz um acompanhamento automático também, e sabemos que esta é uma zona com sismicidade fraca a moderada, o que não significa que não vamos ter sismos mais fortes no futuro. Este sismo veio confirmar a suspeita de que há falhas geológicas também nesta zona, e acabámos por ser surpreendidos por um sismo moderado quando antes havia sismos de mais fraca magnitude nesta zona.”
Numa visita à sede nacional da Proteção Civil esta manhã, Paulo Rangel, o ministro de Estado e da Presidência que está a acumular funções como primeiro-ministro durante as férias de Luís Montenegro, disse que o sismo sentido esta madrugada foi “um teste real às nossas capacidades de resposta no caso de uma catástrofe grave” e sublinhou que esteve em contacto “estreitíssimo” com a Proteção Civil desde o primeiro momento.
“Sobre aquilo que são os planos que estão já testados e vistos há muito tempo, que têm de ser constantemente atualizados e renovados, houve aqui alguma projeção para o futuro no sentido de preparar as estruturas portuguesas, a proteção civil nacional e regional, e a população em geral para termos capacidade de resposta”, disse Rangel. Questionado sobre o eventual resultado desse teste, o ministro fez uma “avaliação muito positiva quanto à capacidade de resposta, à prontidão da resposta, à forma como a informação circulou”.
Em declarações aos jornalistas, o Presidente da República teceu os mesmos elogios à “capacidade de resposta muito rápida” das autoridades e à “muito boa coordenação entre o Governo e a Proteção Civil”, adiantando que o Palácio de Belém foi informado do sucedido minutos depois de o abalo se ter feito sentir. “Funcionou aquilo que devia ter funcionado”, assegurou Marcelo Rebelo de Sousa.
Ecoando a mesma ideia de Miguel Miranda, o engenheiro Francisco Mota de Sá admite que, na zona onde foi registado este sismo, “no vale inferior do Tejo, um Sistema de Alerta Precoce, mesmo que avançado, não conseguiria avisar com antecedência, porque as ondas sísmicas chegam sempre mais depressa do que os alertas”. Contudo, destaca que a instalação desse sistema em Sagres “faria todo o sentido” – “devia haver pelo menos um sistema no sul de Portugal, no sudoeste algarvio, no cabo de Sagres, que tem uma localização ótima para instalar um sistema destes”, refere o especialista.
A CNN questionou a ANEPC e o IPMA sobre em que fase se encontra o Sistema de Alerta Precoce de Sismos no território continental e como respondeu durante este sismo, mas não obteve resposta até à publicação deste artigo. Também não recebeu resposta do Governo sobre se vão ser dados passos para melhorar os sistemas de comunicação de risco sísmico após o abalo desta madrugada.
Mulheres, em casa, a reproduzir filhos e preconceitos
Bárbara Wong
Passaram quase 30 anos. Estávamos sentadas no bar da faculdade, a um semestre de terminar o curso, cheias de dúvidas sobre o que iríamos fazer a seguir, se iríamos trabalhar, onde, a fazer o quê. Ela, com uma écharpe e umas argolas pejadas de pérolas disse, segura, com a sua voz anasalada: "Eu vou casar, bem, e ficar em casa a educar os meus filhos." Houve quem se risse, quem gozasse. Eu fiquei atónita porque percebi que aquele era mesmo o plano: casar, "bem", ficar em casa e ter filhos.
Anos depois, encontrei-a na praia, num fato de banho preto com bolas brancas, escondido por detrás de um páreo branco, não trazia pérolas nas orelhas, mas ao pescoço, e tentava controlar uma ninhada, toda vestida aos quadradinhos, eles de azul-bebé, elas de rosa clarinho e folhos. Atrapalhadíssima e nuns decibéis acima das ondas que batiam na areia, chamava, com a sua voz anasalada, petit nom atrás de petit nom, tratando-os por "você"— já se sabe, como contam Ana e Isabel Stilwell, há sempre guerras entre irmãos. Com os olhos varri a praia, à procura do pai (que não conhecia), percebi mais tarde que estava sentado debaixo do toldo da família.
Reconhecemo-nos, mas não falámos. Eu só tinha uma pergunta em mente, "sempre cumpriste o teu plano?", e achei por bem não a fazer. Sorrimos e acenámos. Mas tinha de colocar a questão a alguém. Liguei a uma amiga comum, que me respondeu que o marido da colega das pérolas era um advogado de sucesso, que eram uma família ultraconservadora (a indumentária de mãe e filhos já o tinha denunciado) e que, quando ela tinha um jantar de amigas, ele ligava e mandava mensagens a pedir-lhe para voltar para casa, que ele e os filhos estavam "cheios de saudades".
Vivemos um momento em que, aparentemente, os homens se sentem inseguros e têm medo das mulheres, têm medo da sua inteligência (elas estudam mais que eles, é certo), da sua independência e, Liliana Carona acrescenta, da sua beleza. Na sua crónica, a jornalista cita estudos norte-americanos que revelam que "os homens distanciam-se e mostram menos interesse pelas mulheres que os ultrapassavam, a nível de inteligência/capacidades". E assistimos a este movimento entre os jovens rapazes, muitos votantes na extrema-direita não democrática.
Lembrei-me da colega das pérolas quando, nesta semana, se deu a apresentação do livro Identidade e Família — é possível que ela lá estivesse —, e ouvimos tantas palavras vindas do passado, sobre famílias tradicionais e da função da mulher dona de casa. Lembrei-me dela ao ler o texto de Monica Hesse sobre mulheres que ficam em casa e o lazer feminino. A jornalista norte-americana destaca as mulheres que perceberam que a vida pode ser mais fácil se ficarem dependentes de alguém. Se casarem "bem", acreditam que não terão problemas. Há um movimento de influencers nas redes sociais que louvam os benefícios de ser dona de casa. O que Hesse não refere é que muitas destas mulheres são evangélicas ou apoiadas por movimentos evangélicos, os mesmos que apoiam Trump, os mesmos que, por cá, aparentemente estão por detrás do ADN, como escreveu Carmen Garcia há umas semanas.
Mas Hesse foca também a falta de tempo das mulheres trabalhadoras para o lazer (queixa que os homens também terão). No fundo, tudo isto é um pau de dois bicos. Por um lado, conquistámos o direito ao trabalho fora de casa; por outro, o de dentro de casa mantém-se. Por um lado, conquistámos o direito a uma carreira; por outro, somos mal remuneradas — é entre os jovens que o fosso salarial é mais grave. Por um lado, sonhamos com promoções; por outro, estamos exaustas quando chegamos a casa. Diz Monica Hesse: "As mulheres que foram educadas sobre as virtudes da independência feminina foram enganadas. Sim, podemos ter carreiras de sucesso. Mas ninguém diminuiu a quantidade de roupa suja ou de tarefas que ainda precisam de ser feitas. Ninguém acrescentou mais horas ao relógio."
Fomos enganadas porque ainda há homens que "ajudam" lá em casa e não percebem que têm de dividir tarefas. Monica Hesse dá exemplos de mulheres que optaram pela casa até sonharem com um trabalho. "E ela é feliz?", perguntei à minha amiga sobre a colega das pérolas. Fez-se um silêncio: "Eu acredito que o feminismo também é isto, o teres liberdade para viveres a vida que planeaste." Sem dúvida, eu concordo que tens liberdade para viveres o teu sonho, mas não tens de o impor aos outros, não tens de pôr em causa todos os direitos conquistados e quereres que todas tenhamos de ficar em casa, a reproduzir filhos e preconceitos. Além disso, não foi isso que perguntei. "Não a vejo a ter momentos de dúvida. Eles são ultraconservadores", responde a nossa amiga comum.
Assustam-me sempre as pessoas que não têm dúvidas (ou raramente as têm), como é o caso do "cara valente" sobre o qual Ana Lázaro escreve, em mais um dos seus contos. É um homem capaz de tudo, menos de viver emoções — porque os homens não são educados para falarem sobre as suas emoções. "Faltava-lhe o atrevimento, a coragem para o amor. Porque para o amor é preciso bravura. É preciso audácia para mergulhar no desconhecido de uma escuridão profunda que se esconde para dentro de nós." Foi mais uma relação que não resultou na vida da nossa narradora.
16
de junho de 2023 - Memorial aberto sem inauguração. Seis anos depois, Pedrógão
Grande sente-se esquecido
Para espanto e mágoa dos que ainda choram a tragédia do fogo de 2017, a
abertura do memorial às vítimas aconteceu sem a presença dos mais altos
representantes da nação
Memorial aberto sem
inauguração. Seis anos depois, Pedrógão Grande sente-se esquecido
Silêncio, lágrimas e suspiros. A primeira reacção de quem perdeu familiares ou
amigos no fogo de 2017, assim que dá de caras com o muro no qual foram gravados
os nomes das vítimas, oscila entre a saudade e o respeito. “Ainda mexe muito,
está tudo muito presente”, confessava Maria Graciete, depois de reconhecer
vários nomes de amigos e vizinhos, de Castanheira de Pêra, cravados naquele
bloco de pedra cinzenta. Não que eles estivessem esquecidos. Pelo contrário.
“Não temos outra estrada para passar e não há dia em que não me lembre deles”,
reforçava, com os olhos postos no grande lago artificial que, juntamente com o
mural, constitui o memorial de homenagem às vítimas dos incêndios de 2017.
Estará a democracia a morrer? Que desafios enfrenta hoje? E como poderá vencê-los? Para responder a estas questões, Pedro Pinto entrevista o professor da Universidade de Harvard e perito em democracias Daniel Ziblatt, neste episódio de «Isto Não É Assim Tão Simples».
Nesta conversa, o autor do livro «How Democracies Die», um best-seller do «The New York Times», os sinais de alerta de uma democracia que está sob ameaça, não através de um golpe de estado, mas por parte de políticos autoritários que «minam» os seus alicerces a partir do poder.
Ziblatt dá também exemplos de países onde a democracia está de boa saúde. Analisa ainda o impacto da guerra da Rússia contra a Ucrânia nas democracias mundiais e o que poderá acontecer no futuro. Ziblatt aborda também as tentativas fracassadas – nos EUA e no Brasil – de anular o resultado das suas eleições presidenciais, e o que essas tentativas nos dizem sobre o futuro da democracia. Finalmente, Ziblatt debruça-se sobre Portugal e o crescimento da extrema-direita populista, discutindo como os principais partidos nas democracias ocidentais podem lidar com essa ameaça, numa conversa que vale a pena ouvir.
Na sessão de 4 de agosto de 1821 das Cortes Constituintes, as
touradas estiveram em debate.
Borges Carneiro apresentou um projeto de lei para a proibição
dos espetáculos tauromáquicos, entendidos como contrários “às luzes do século,
e à natureza humana”. Em causa, estava um entretenimento baseado no sofrimento
dos animais, criados para servir o homem, mas não para serem martirizados.
“Os homens não devem combater com os brutos, e é horroroso
estar martirizando o animal, cravando-lhe farpas, fazendo-lhe mil feridas, e
queimando-lhe estas com fogo: tão bárbaro espetáculo não é digno de nós, nem da
nossa civilização.”
Também o Deputado Teixeira Girão classifica as touradas como
um” bárbaro divertimento”, uma “tolice em expor a vida sem fim útil, sem
necessidade, uma “traição em inutilizar aos touros as armas que lhes deu a
natureza” e uma “crueldade e cobardia em atormentá-los depois”.
Em sentido contrário, vários Deputados argumentam com a
tradição e popularidade do espetáculo, mas também pela existência de outros
costumes que agridem os animais, como a caça ou, noutros países as “carreiras
de cavalos e o combate dos galos”. Referindo-se ao projeto de lei de Borges
Carneiro, Lemos Bettencourt afirma:
“Admira-me, como levado de tão filosóficas tenções, não
incluiu no mesmo projeto a proibição da caça, pois sendo todos os animais e
aves entes sensitivos, não deviam ser objeto de divertimento do homem; e não
devia o caçador matar a ave inocente”.
Outros Deputados entendem que a sociedade portuguesa não está
ainda preparada para a decisão de extinguir as corridas de touros. Assim pensa
Serpa Machado, que defende ainda a diminuição da barbaridade do espetáculo e a
abolição dos “touros de morte”:
“Eu não seria de opinião que desde já fossem proibidas as
festas de touros, porque ainda não é tempo; é necessário ir preparando os
costumes. Entretanto apoio que o projeto vá à discussão, não para se abolir
esse espetáculo, senão para diminuir a sua barbaridade. Vamos por ora
preparando os costumes, que lá virá tempo em que ele caia por si mesmo.”
Manuel Fernandes Tomás, confessando ser “amigo deste
divertimento” e espetador semanal de touradas, refere que não se pode, de
repente, transformar o país numa “Nação de filósofos”, sendo necessário
preparar a sociedade:
“Para extinguir-se aqui este espetáculo, é preciso que os
costumes se vão preparando, querer de repente reduzir uma Nação a Nação de
filósofos não me parece correto, nem sensato; este costume há de acabar entre
nós, quando se extinguir na Espanha. Eu o declaro francamente, sou amigo deste
divertimento; não é por ser valoroso, nem deixar de o ser, nem querer que os
outros o sejam, senão porque fui criado com isso. Na teoria sou dos mesmos
sentimentos filantrópicos; mas na prática não posso. Confesso a minha fraqueza:
vou ver os touros todos os domingos. Eu não pugnarei porque os haja; mas tão
pouco me oporei diretamente a que deixe de havê-los."
O projeto de lei de Borges Carneiro para a extinção das
touradas seria rejeitado.
Santa ignorância, quer do autor quer, até, da apresentadora!...
Este jornalista, que habitualmente faz um programa sobre Economia/Finanças na SIC, anda agora a vestir a roupagem de historiador e a revisitar a História, à sua maneira, claro, criticando a torto e a direito (como é habitual nas suas intervenções) desconhecendo, efetivamente, os programas atuais de História/os conteúdos e a forma crítica como os mesmos são dados e até referenciados pelo Ministério da Educação.
Nem 8 nem 80!
Não escondemos a verdade histórica mas também não mentimos aos nossos alunos nem mascaramos a realidade histórica ao nosso gosto ou ao gosto da nossa ideologia político-partidária.
A visão deste jornalista, que revela o desconhecimento daquilo que se faz neste âmbito, integra-se claramente numa perspetiva saudosista, imperialista, colonialista… Já é o 2º livro que escreve desta forma sensacionalista-nacionalista, como se o que ele escreve ("investigou") tenha que ser, agora, uma verdade científica comumente aceite e uma espécie de cartilha para o seguidismo de má memória.
Que pedantismo! Que desconhecimento da realidade!
Fala em manuais, manuais... Que manuais? De que anos de escolaridade?
Que fontes históricas consultou para apresentar este discurso?
Leu as orientações do Ministério da Educação relativamente ao ensino da História?
Por exemplo:
- as aprendizagens essenciais da História A - 10º ano
A minha
esperança é que uma revolução que venha de dentro da própria Rússia, traga a
mudança efetiva de regime e devolva o poder ao povo. Verdadeiramente.
A
contestação de rua, sobretudo de jovens, nas principais cidades, e apesar da
dura repressão, são um sinal inequívoco de uma mudança anunciada.
"A ONU
apresentou como confirmados desde o início da guerra 5.916 civis mortos e 8.616
feridos, sublinhando que estes números estão muito aquém dos reais".
Infelizmente, agravar-se-á este número com a mobilização de milhares de russos
decidida por Putin para continuar o seu programa de crueldade e morte contra
ucranianos e contra os que, mesmo russos, se opõem ao seu ideário extremista e
belicista.
Esta guerra que Putin iniciou, porque de guerra se trata, também nos diz
respeito e nos merece a maior atenção e apreensão, uma vez que estão em causa
valores e princípios completamente espezinhados pelo mesmo, como o respeito
pela soberania das nações, pela sua independência, pelas disposições da Carta
das Nações Unidas, pelos Direitos Humanos e pelo Direito Internacional.
Nada justifica o que está a acontecer, exceto o desejo imperialista de um homem
que, pela violência e pela força, negando a História recente da Europa a a
partir de 1989, quer fazer renascer os horrores pelos quais passaram as ditas
democracias populares e ressuscitar a velha e prepotente URSS.
Quem não critica abertamente Putin por tudo isto que tem feito também é como
ele.
Neste contexto, e perante os factos e esta terrível realidade, não há lugar
para os que, estranha e cobardemente se escondem na "abstenção" ou
comodamente se viram contra os países que estão a ajudar a Ucrânia.
Isto nunca foi operação militar especial, mas guerra. Guerra!
"Não há volta a dar-lhe": ou se é pela Rússia ou se é pela Ucrânia.
Imaginem que ardia tudo desde o Parque da Nações até Cascais!!!
O combate aos incêndios passa pela prevenção, com muitas mais campanhas DURANTE TODO O ANO, nas escolas, junto das populações, mass media mas, sobretudo, por mais e melhores equipamentos e melhores salários dos bombeiros.
Se o recente contratado Sérgio Figueiredo vai ganhar mais do que o Medina, quanto deveria ganhar um bombeiro? Um professor? Um médico? Um enfermeiro? Um polícia?
Uma tristeza e uma revolta, estas decisões "vindas de cima"! Esta inversão de prioridades, esta falta de visão e sensatez política e social.
A extrema direita aproveitar-se-á de tudo isto para engrossar cada vez mais as suas hostes, para infortúnio da nossa democracia.
A quem pedir responsabilidades pelos próximos números da abstenção, pelos desafetos políticos, pela quebra de confiança no sistema pluripartidário?
Continuarei a lutar pela Democracia e pelo Estado de Direito. Sempre.
Detalhe da miniatura de um aluno lendo em seu quarto.
A Europa é o lar de muitas
das universidades mais antigas e renomadas do mundo. A primeira
instituição europeia deste tipo foi fundada em Bolonha no século XI, e logo foi
seguida por estabelecimentos semelhantes em Paris e Oxford, levando a uma ampla
rede de universidades em todo o continente. Hoje, as universidades
europeias recebem dezenas de milhões de estudantes todos os anos, vindos de
vários cantos do globo. Estas instituições têm desempenhado um grande
papel no desenvolvimento do ensino superior e da investigação, tanto à escala
europeia como internacional.
O ponto de partida deste
desenvolvimento – a fundação da Universidade de Bolonha e outras universidades
medievais – é, portanto, um fenômeno histórico significativo. Foi o
resultado de uma combinação complexa de diferentes fatores e teve muitos
efeitos elaborados tanto na vida medieval quanto em nossa sociedade
moderna. Para ajudar os alunos a desvendar essas complexidades, este
webinar explora uma variedade de ferramentas e fontes digitais que os professores
podem usar nas salas de aula e nas aulas on-line. Ao aprender sobre as
universidades medievais, os alunos também podem discutir instituições modernas
– em particular, a relevância do ensino superior hoje.
Durante o webinar, os
participantes desempenharam o papel de estudantes universitários, que
experimentariam o fascinante plano de aula de Gijs. A primeira questão que
Gijs explorou com a turma foram as causas por trás do surgimento das
universidades medievais europeias. Que necessidades essas universidades
atendiam? – o anfitrião perguntou. Os 'alunos' enviariam suas
respostas por meio de um portal digital chamado LessonUp.
Para enfrentar a questão, os
participantes foram convidados a explorar várias fontes sobre os contextos
históricos que cercam essas universidades. Gijs organizou as fontes usando
a Discovering Tool do Historiana eActivity Builder, uma ferramenta que permite
aos alunos visualizar as conexões entre diferentes fenômenos históricos.
Por exemplo, a fonte sobre as
rotas comerciais europeias dos séculos 11 e 12, que descreve a prosperidade
econômica da Europa naquela época, direcionaria os alunos para uma fonte sobre
o crescimento das cidades europeias e os novos desafios da vida
urbana. Essa fonte é então conectada a outra que descreve a necessidade de
uma nova classe de profissionais capacitados, que ajudariam a enfrentar os
desafios urbanos, cumprindo cargos na administração, instituições religiosas,
legisladores, medicina, entre outros. Por meio disso, os alunos
compreenderão como diferentes processos históricos estavam ligados entre si e
como esse vínculo resultou no surgimento das universidades medievais.
Ao se envolver com esta ferramenta de
descoberta, os alunos não apenas podem descobrir cada processo histórico em seu
próprio ritmo, mas também estarão cientes da multiperspectividade da história. Gijs
permitiu que os alunos escolhessem livremente entre três pontos de partida,
cada um desvendaria uma explicação diferente para o surgimento das
universidades. Segundo ele, as relações causais na história são sempre
múltiplas. Em vez de fornecer uma narrativa única, os professores precisam
permitir que os alunos observem um desenvolvimento histórico de diferentes
ângulos e descubram todas as diferentes rotas que podem tê-lo causado.
Depois
de identificar várias causas possíveis, os professores podem perguntar aos
alunos: “Você pode decidir por si mesmo qual causa foi a mais importante?” A
ferramenta de classificação no Historiana eActivity Builder é muito útil para
esta pergunta. Quanto mais importante um aluno encontrar um fator, mais
próximo ele poderá arrastar o fator para o centro dos círculos (veja a Imagem
2). Para incentivar a multiperspectividade, um participante levantou uma
sugestão criativa: os professores podem repetir essa atividade de classificação
várias vezes, cada vez pedindo aos alunos que se coloquem no lugar de um novo
ator histórico. É mostrar que o significado histórico não é um fato, mas
construído, e irá variar quando se trata de diferentes classes de pessoas.
Efeitos das universidades medievais na Europa
“Como a vida das universidades
contribuiu para as sociedades e a cultura medievais?” é outra questão que
Gijs queria discutir com a turma. Da mesma forma que a primeira pergunta,
todos procurariam novamente as respostas explorando as Ferramentas de
Descoberta. Várias interpretações foram dadas, nomeando diferentes
elementos como o humanismo, a escolástica, o Renascimento, o nascimento
das ciências, a melhoria da vida urbana e assim por diante. Gijs destacou
em particular as consequências sobre a religião: embora no início a Igreja
fosse central no currículo das universidades, foi paradoxalmente o pensamento
crítico e a força intelectual nutridas por essas universidades que,
eventualmente, levaram à fragmentação da Igreja.
Para elaborar a lógica por
trás desse desenvolvimento, Gijs baseou-se em um fragmento de “In Praise of Folly”
(1517) – uma obra satírica de Erasmus de Rotterdam. Os participantes foram
solicitados a analisar o texto usando a Ferramenta de Anotação da Historiana –
que é útil para os alunos trabalharem com fontes primárias. O texto
revelou como o pensamento crítico de Erasmo e sua crítica à vida da Igreja
medieval se fortaleceram. Assim, lendo Erasmus, os alunos podem
compreender melhor como a educação universitária pode fomentar a crítica contra
a Igreja.
Reflexões
Gijs propôs concluir a aula
com uma sessão de reflexão, na qual os alunos relacionariam o tema com a
sociedade moderna. Na Idade Média, a ascensão das universidades medievais
melhorou a compreensão das pessoas sobre a vida humana, ajudou-as a lidar com
novos desafios e promoveu o conhecimento e a pesquisa científica.
No entanto, o que vemos hoje,
especialmente à luz da pandemia de Covid-19, é uma crescente desconfiança em
relação à ciência e uma crescente ameaça de
desinformação. Quais são os valores da pesquisa e das atividades
acadêmicas neste contexto contemporâneo? O que seria exigido das
universidades de hoje? Devemos continuar investindo em educação
(superior)? Essas são algumas questões que os professores podem discutir
com seus alunos, para incentivá-los a olhar para as questões contemporâneas a
partir de perspectivas históricas.
A sessão gravada deste webinar estará disponível em breve em
nosso canal do YouTube!
Nossa próxima edição da série acontecerá no dia 22
de março . Ute Ackermann Boeros apresentará uma
sessão sobre “ Pinturas da Vida Cotidiana ”. Você pode se inscrever para a sessão neste link: https://bit.ly/3K6Jo4b .