sexta-feira, 13 de maio de 2016

O triunfo dos pobres


Volta Keynes! Estás perdoado.



Volta Keynes! Estás perdoado.
Eu hesitei no título a dar a este texto, confesso. Pensei em titulá-lo de “ O nosso Economista”, referindo-me claro a essa pessoa, a tal que diz que “ somos o que escolhemos ser”, assim como que a dizer “ eu escolhi ser rico” e  “ tu escolheste ser pobre”, não por esta “ tonteria” mas por aquela expressiva frase que proferiu penso que num discurso naquele espectáculo comemorativo dos 40 anos do seu Partido em que afirmou/ perguntou “Dar mais dinheiro às pessoas resolve os problemas da economia?, certamente tentando deste modo afrontar a equação alternativa que emana do documento do PS apresentado por aquela equipa de 12 economistas , mas não! Em nome do rigor e da seriedade que quero dar a este texto não o poderia fazer…
Apesar de constar que tem uma licenciatura em Economia, que lhe foi atribuída aos 37 anos certamente porque, apesar de tudo, foi o que escolheu ser, não lhe é reconhecido qualquer pensamento relevante, qualquer estudo ou ensaio publicado ( a não ser aquele “ensaio” da Felícia Cabrita sobre o “ homem invulgar” que ele também escolheu ser…), qualquer análise seja de que variável da economia for, nem mesmo se lhe conhece alguma defesa, falada ou escrita, de qualquer doutrina económica mesmo que seja aquela que mui religiosamente segue e que foi a que escolheu seguir : a ultraliberal. Assim como quem escolhe ser do Benfica…
E recordo aqui uma entrevista dada há cerca de dois anos pelo Dr. Silva Lopes, o reputado economista e homem de finanças há dias falecido, em que ele dizia “Desculpem-se a arrogância mas acho que o governo sabe pouco de Economia…“, referindo-se ao facto de, sendo público e notório que o futuro do País está manifestamente dependente das exportações, ele não vislumbrar qualquer apoio ao seu sector, qualquer programa concreto para o seu incremento e que, mesmo havendo condicionamento Europeu, defendia a possibilidade de o contornar através do apoio a novos investimentos ou concessão de créditos a pequenas e médias empresas exportadoras. E que não bastavam simples proclamações e palavras de circunstância pois o que era preciso eram actos…
Se tivesse intitulado este texto de “ O nosso Economista” estaria a dar, mesmo que ironicamente, uma importância ao dito cuja não lhe reconheço e assim também posso dizer que, afinal, não foi esse o que eu escolhi!
Mas é evidente para mim e penso que para muitos mais que o que decorre da frase/ pergunta por ele proferida ( “ …é dando mais dinheiro às pessoas que se resolve o problema da economia?”) é onde reside precisamente a grande diferença de perspectiva quanto à análise e solução para o futuro do País. De um lado está a via da austeridade como único caminho para a solução, caminho este que se vê ultrapassado pela realidade e pelos seus desoladores resultados. Uma via também cada vez mais criticada e abjurada por grandes pensadores e Economistas de grande renome, incluindo vários Prémios Nobel e apenas dubiamente defendida por algumas organizações ( FMI e CE, por exemplo) simplesmente para não confessarem o fracasso dessa via preferindo que pequenas mudanças, imperceptíveis mudanças, se vão fazendo ao longo dos tempos para não terem que dar o braço a torcer e salvar assim as sua faces. Mas uma via que o nosso “ grande economista” escolheu seguir e para a qual não vê ( nem conhece porque escolheu não conhecer…) qualquer alternativa.
Mas do outro lado está uma via que privilegia o aumento do rendimento disponível das pessoas como forma de cativação das sinergias que conduzem ao aumento do consumo privado e ao consequente aumento da produção de bens de consumo próprios. De um lado está o retirar poder de compra às pessoas pela via da redução dos salários, do corte das pensões e do aumento de impostos como forma do Estado satisfazer os seus compromissos e o equilíbrio das finanças públicas, afectando de forma sistemática a criação de riqueza e do outro lado está uma perspectiva de incremento da actividade económica através do aumento do rendimento disponível, da qual decorra o aumento das receitas necessárias para os mesmos fins: cumprimento das metas orçamentais, equilíbrio das finanças públicas e satisfação dos compromissos assumidos.
São duas vias antagónicas que têm que coincidir nos três aspectos fundamentais atrás referidos mas para mim, e penso que para muitos mais, em defesa do humanismo que defendemos e que o nosso “ grande economista” escolheu não defender e em nome e defesa da dignidade a que as pessoas têm direito, e que ele escolheu não se rever, e do seu envolvimento responsável nos destinos da País, para mim e para muitos mais este é o caminho mais meritório e justo que nos dias de hoje é possível trilhar.
Dar dinheiro às pessoas resolve os problemas da economia?”. Não se trata de “ dar” dinheiro mas sim de “repor” rendimentos que foram cortados mas, adiantando, ele acha que não, ele acha que a única via, não a que ele escolheu mas a que lhe foi imposta e por isso foi por ele escolhida, é a do ajustamento pelo empobrecimento e pela perda de direitos e dignidade das pessoas subestimando, assim, a força que algum poder aquisitivo das pessoas possa ter no necessário crescimento económico. Ele também acha que o equilíbrio das contas externas se faz unicamente pela via da redução das importações, descurando o impacto que isso tem no consumo, e pelo aumento das exportações, mas esquece-se de que quem nos compra, ou faz o favor de nos comprar, exige também que lhes compremos e, por via de compromissos assumidos com grandes e poderosos em troca de bens de grande valor, somos forçados a comprar sem ter a devida força para impor os nossos produtos e os efeitos fatalmente anulam-se.
Eu acho e muitos como eu também acham que algumas políticas restritivas ainda são necessárias porque é forçoso manter as finanças equilibradas, o défice controlado e os compromissos satisfeitos, porque isso é salutar e porque dependemos fortemente do crédito externo não só para nos financiarmos mas também para refinanciarmos a nossa dívida, mas achamos que não nos devemos conformar ao empobrecimento e exclusão como soluções para o nosso futuro.
Muito embora esteja agora muito em moda a visão imposta pelo pensamento único, aquele que é emitido e publicado pelos doutos comentadores arregimentados ao situacionismo, de que, para lá da definição da economia, nada mais tem sentido, existe na verdade agora um campo ideológico e programático que separa as duas correntes, e essa separação não advém, como a Direita gosta de afirmar, de qualquer existência ou ausência de rigor, de um lado ou do outro, mas sim da coordenação e adaptação da economia à vida e necessidades das pessoas e não o contrário. Por isso a Direita não se cansa de dizer que vem aí novamente o despesismo, o descontrolo das contas etc. etc. sem perceber que as projecções evidenciam todo o seu contrário e os números que ela apresenta precisamente o contrário do que afirma…
As diversas posições que vêm sendo tomadas, a que atras me referi, por parte de importantes economistas, reconhecidos pensadores, publicações de referência e académicos renomados acerca dos malefícios da insistência em políticas austeritárias e a necessidade de um novo rumo que privilegie o investimento e a criação de emprego, no fundo políticas mais Keynesianas e tendentes a um maior equilíbrio social, têm esbarrado um pouco em conceitos estabelecidos de inevitabilidade por parte das instituições reguladoras com o argumento de que os “ mercados” podem reagir mal e será, portanto, necessário cumprir as suas vontades. E dizem isto porque são eles precisamente os representantes dos “ mercados” e por estes nomeados para cumprirem as suas prepotentes e insensíveis vontades. E para isso são muito bem pagos e fazem esse nefasto papel. Mas água mole em pedra dura tanto bate até que fura, como diz o ditado, e o que é pena é que tudo tenha que ser sempre reerguido das ruínas, com políticas Keynesianas é evidente, quando seria tão mais fácil esta gente reconhecer as evidências e ter algum sentido social que não tem ou deixou de ter, tão cegos ficaram pelo vil metal. Foi o que escolheram ser…
Mas em tempos de crise profunda e em momentos fulcrais na história do século XX foram as políticas Keynesianas que trouxeram as soluções para as crises, promoveram a recuperação económica e melhoria da qualidade de vida das pessoas a nível mundial e introduziram mais igualdade, mais sentido de justiça e, ainda, políticas de âmbito social nunca antes promovidas. Temos dois exemplos paradigmáticos : o NEW DEAL implementado por Roosevelt a seguir à grande depressão e o PLANO MARSCHAL a seguir à segunda grande guerra.
E foram depois as teoria Neoliberais, implementadas nomeadamente por Reagan e Thatcher e emanadas da Escola de Chicago e de Milton Friedman, quem introduziram a desregulação com o conceito de que o mercado tudo regulava ou acabaria por regular, o livre arbítrio e descaracterização das funções dos Estados como primeiros responsáveis pelo controlo das economias, que conduziram à concentração progressiva da riqueza, ao aumento das disparidades entre ricos e pobres, entre poderosos e famintos e entre detentores de tudo ( cada vez em menor número mas com mais) e os que não têm nada ( cada vez em maior número com cada vez menos) como não há memória. Mas diziam que o “mercado” se encarregaria de corrigir os desequilíbrios e que a lei da oferta e da procura se encarregaria de trazer justeza à economia.
Só que os Estados perderam autonomia, deixaram de ser soberanos nas suas decisões, começaram a ficar reféns dos grandes interesses, passaram a ser governados por “ marionetas” por eles ( grandes interesses) designadas, aquilo que escolheram ser, e começaram a ficar atafulhados em dívidas e dependentes cada vez mais desses credores impiedosos e desconhecidos. E as pessoas começaram a ser chamadas a pagar, a pagar aquilo que não pediram, a pagar aquilo de que não precisavam, a pagar aquilo que não utilizam nem nunca vão utilizar, a pagar aquilo que só serve para matar, a pagar, a pagar. E se não pagarem ou quando já não tiverem por onde pagar…aos infernos vão parar…
E eles cada vez mais poderosos e insensíveis. Tiveram uma crise há uns anos, abalaram um pouco mas no fim, meu Deus no fim, no fim pagaram os Povos. As pessoas. Salvaram-se os Bancos e as pessoas pagaram. Os Banqueiros responsáveis não. Vendeu-se gato por lebre e quem pagou? Os vendedores? Não, os compradores. O Povo. As pessoas, as pessoas por quem é suposto deverem governar. Mas isto tem que acabar. Isto tem que mudar. Tem que mudar. Assim não vamos a lado nenhum…
Alguém nos traz o Keynes de volta? Volta Keynes…estás perdoado!



JOAQUIM VASSALO ABREU in https://aesquerdadozero.wordpress.com/2015/05/08/1964/

sábado, 7 de maio de 2016

Um texto de Paulo Varela Gomes

Paulo Varela Gomes



A lição de Gandhi

A mais conhecida frase de Gandhi é:
«Não há qualquer causa pela qual esteja disposto a matar. Mas há causas pelas quais estou pronto a morrer.»
Estas palavras resumem a perspectiva de luta com que hoje se defrontam centenas de milhões de pessoas em todo o mundo, mas em especial no Ocidente (Europa e continente americano). Estamos na última das extremidades: está em jogo a vida das pessoas. Primeiro seremos reduzidos à pobreza. Depois farão de nós o que bem lhes aprouver.
A maioria das pessoas no Ocidente já há duas ou três décadas percebeu aquilo que a esquerda ocidental mostra extrema relutância em aceitar: que não vale a pena nem é possível combater apenas por meios legais o capitalismo sustentado parlamentarmente.
A maioria das pessoas pensa que os políticos são uns aldrabões ou corruptos, que o sistema judicial está ao serviço deles e que só os ricos e poderosos se safam. O chamado «descrédito do sistema político», assunto sobre o qual se têm tecido profundíssimas reflexões, é simples de explicar: o sistema está desacreditado porque não merece crédito. As pessoas já perceberam. Uma parte delas continua a votar por desfastio, a outra vota com os pés.
A esquerda parece estar convencida de que escapará entre as gotas desta bátega torrencial de desilusões recorrendo à luta dentro do sistema: o discurso parlamentar, as eleições, a ocasional coluna nos jornais ou prestação televisiva, etc. Triste engano. A maioria das pessoas não distingue um deputado do PCP de um do PSD, para referir casos portugueses. Estão todos no mesmo sistema. Dizer coisas como esta pode parecer o regresso a um dos mais velhos debates da esquerda ocidental: como combater o sistema capitalista e o seu parlamentarismo? A partir de dentro ou a partir de fora?
Parece, mas não é. Pela primeira vez desde o século XIX, o sistema não tem alternativa nem teórica nem prática, quer dizer, não pode ser substituído. Mas têm alternativa os seus governos e regimes mais injustos e corruptos. É indispensável resistir-lhes, desgastá-los, desregular-lhe os mecanismos de funcionamento, derrubá-los. Para resistir desta maneira não se pode agir apenas com os meios que o sistema permite. Quando se convoca a greve geral nº 354, a grande manifestação nº 1723, ou se assina o manifesto nº 10 655, só se está a desacreditar a greve geral, a manifestação e o manifesto, respectivamente.
Todavia, as greves e as manifestações podem atingir uma dimensão verdadeiramente surpreendente se pararem de facto o país, se encherem de facto as cidades. É por isso que vale a pena investir em manifestações como a de 15 de Setembro ou a de 2 de Março próximo. Para surpreender e assustar os poderosos. Deve pensar-se que a resistência armada ao sistema está sem qualquer dúvida na ordem do dia e será uma realidade mais cedo do que tarde. Todavia, é muito perigosa tanto do ponto de vista ético como político. O passado demonstrou-o muitas vezes.
Mais importante e efectiva é a resistência desarmada, a resistência passiva. É preciso seguir o lema de Gandhi.
Em vez de termos cinco mil pessoas em frente de S. Bento, é preciso ter cinquenta mil, deitadas nas escadas em levas sucessivas, sofrendo as cacetadas da polícia, aguentando os canhões de água, sendo presas.
Há cinquenta mil pessoas em Portugal dispostas a isto?
Não me parece. Nem sequer cinco mil.
E porquê?
Por muitas razões que todos conhecemos e uma que nos recusamos a reconhecer: porque a esquerda é vítima do seu servilismo parlamentar e acredita só poder existir enquanto tiver lugares no parlamento e aparecer na televisão ou nos jornais a apertar a mão do PR. De facto, a esquerda não promove e até condena a resistência passiva. A primeira coisa que diz um sindicalista ou dirigente da esquerda após convocar uma manifestação é que será «pacífica». A primeira exclamação que lhe sai da boca mal alguém se agita é «calma camaradas!»
Esta é a responsabilidades negativa da esquerda.
Olhemos agora para as suas responsabilidades positivas:
É sua estrita obrigação política e ética apoiar, promover e assumir o rosto da resistência passiva. Se o fizer dará o exemplo e a resistência poderá crescer. Para isso, os seus representantes, e com eles os intelectuais de esquerda e os independentes que estão contra o sistema, terão que estar prontos para resistir.
Se não há cinquenta mil pessoas dispostas a aguentar em frente do Parlamento, há dezenas de deputados que deveriam estar dispostos a: boicotar activamente sessões parlamentares, impedindo o Parlamento de funcionar; não pagar impostos e incitar ao não pagamento; sentar-se numa linha férrea em ocasião de greve dos comboios, etc., etc., etc.
Perdiam o mandato? Iam presos?
Nas presentes circunstâncias, vivendo nós sob um regime ilegítimo eticamente e tirânico politicamente, o lugar mais honroso onde podem estar Jerónimo de Sousa ou Catarina Martins é a prisão.
(Pessoalmente, sentir-me-ia muito mais contente comigo mesmo e com este texto se tivesse saúde para agir em conformidade com o que aqui escrevi.)

Domingo, 17 de fevereiro de 2013

Texto de Paulo Varela Gomes