sábado, 26 de janeiro de 2013

Europa em risco de desagregação


Intelectuais avisam Europa ou Caos
António Lobo Antunes é um dos signatários de um manifesto pela integração política contra a desagregação do sonho europeu

 
Filósofos e escritores, entre os quais o português António Lobo Antunes, assinam um texto em que defendem a necessidade da Europa acelerar o processo de integração política como único meio de combater o fim da Europa idealizada pela geração pós-segunda Guerra Mundial

Um grupo de filósofos e de escritores, preocupado com os sinais de desagregação que ecoam na Europa, decidiram juntar-se para alertar os responsáveis políticos europeus para o perigo do desaparecimento da Europa sonhada no pós segunda guerra mundial.

Nomes sonantes da literatura e da filosofia, entre os quais se salientam Vassilis Alexakis, Hans Christoph Buch, Juan Luis Cebrián, Umberto Eco, György Konrád, Julia Kristeva, Bernard-Henri Levy, Claudio Magris, Salman Rushdie, Fernando Savater, Peter Schneider e o português Antonio Lobo Antunes, juntaram-se para alertar que a Europa ou se une politicamente ou corre o risco de morrer.

Do pensamento destes intelectuais saiu um manifesto que será tornado público na próxima segunda-feira.

Começam o seu manifesto por considerar que a “Europa acorda com o espírito elogiado por Edmund Husserl nas grandes conferências de Viena e Berlim, em vésperas da catástrofe nazi”.

“A Europa como vontade e representação, como sonho e como construção, esta Europa posta em pé pelos nossos pais, esta Europa que soube transformar-se numa ideia nova, que foi capaz de trazer aos povos que acabavam de sair da segunda guerra mundial uma paz, uma prosperidade e uma difusão da democracia sem precedentes, mas que, perante os nossos olhos está a desfazer-se uma vez mais”, dizem os autores.

O texto continua explicando que “se desfaz na Grécia, uma das suas cunhas, pela indiferença e pelo cinismo das nações irmãs; Houve tempos, o do movimento filo helénico dos princípios do século XIX, no tempo desde Chateaubriand até Biron de Missolonghi, Desde Berlioz até Delacroix, desde Pushkin até ao jovem Vitor Hugo, todos os artistas, poetas, grandes mentes da Europa, coaram em seu auxílio e militaram a favor da sua liberdade. Hoje estamos longe disso. E a impressão que os herdeiros daqueles grandes europeus, nomeadamente os helenos levam a cabo uma nova batalha contra outra forma de decadência e sujeição, não tendo melhor a fazer do que repreende-los, estigmatizá-los, depreciá-los e, - com o plano de rigor imposto como programa de austeridade, de que se acusa a seguir – despojá-los do princípio da soberania que, há tanto tempo, eles próprios inventaram”.

Os autores continuam o seu inventário afirmando que “desfaz-se em Roma, a sua outra cunha, o seu outro pedestal, a segunda matriz (a terceira é o espírito de Jerusalém) da sua moral e do seu saber, o outro lugar em que se inventou esta distinção entre a lei e o direito, entre o ser humano e o cidadão, que constitui a origem do modelo democrático que tanto se desenvolveu, no solo da Europa, um sinal ao mundo”

“Essa fonte romana contaminada pelos venenos de um berlusconismo que ainda não desapareceu, essa capital espiritual e cultural, junto com Espanha e Portugal, Grécia e Irlanda, nos famosos “PIIGS” fustigadas por instituições financeiras sem consciência nem memória, esse país que ensinou a embelezar todo o mundo na Europa, e que agora parece, som razão ou sem ela, a doente do continente. Que miséria! Que ridículo!”, bramam em uníssono.

“Desfaz-se em todas as partes, de este a oeste, de norte a sul, com a ascensão dos populismos, dos chauvinismos, das ideologias de exclusão, e ódio que a Europa tinha precisamente como missão marginalizar e debilitar, e que regressam vergonhosamente a levantar a cabeça” continuam.

“Que longe está a época em que nas ruas de França, em solidariedade com um estudante insultado por um responsável de um partido de memória tão escassa como as suas ideias, cantavam “todos somos judeus alemães.” lamentam os intelectuais que apuseram o seu nom e no final deste texto.

“Que longínquos parecem hoje os movimentos solidários, em Londres, Berlim, Roma, Paris, com os dissidentes daquela outra Europa que Milan Kundera apelidava de Europa cativa e que parecia o coração do continente! E enquanto na Internacional de espíritos livres lutavam, há já 20 anos, por essa alma europeia, que encarnava Sarajevo, debaixo das bombas e presa de uma desapiedada “limpeza étnica”. Onde está? Porque é que já não se ouve?” perguntam.

“Além do mais, Europa vem abaixo por culpa desta interminável crise do ouro, que todos sentimos que não está de todo resolvida. Não é uma quimera essa moeda única abstrata, flutuante, que não está unida às economias, aos recursos e às fiscalidades convergentes? Não é evidente que as únicas moedas comuns que funcionaram (o marco depois de Zollverein, a lira da unidade italiana, o franco suíço e o dólar) são as que se apoiam num projeto político comum? Não existe uma lei de cão que diz que, para que haja uma moeda única, tem de haver um mínimo de pressupostos, regras de contabilidade, princípios de inversão, quer dizer políticas partilhadas?”

“O teorema é implacável” acrescentando “Sem federação não há moeda que se sustenha” e “sem unidade política, a moeda dura uns quantos decénios e depois, aproveitando uma guerra ou uma crise, dissolve-se” vaticinam.

“Por outras palavras, sem um sério avanço na integração política, obrigatória de acordo com os tratados europeus, mas que nenhum responsável parece querer tomar a sério, sem um abandono de competências por parte dos estados nacionais, sem uma franca derrota portanto, desses soberanistas, que empurram os seus cidadãos para o abismo, o euro se desintegrará como se teria desintegrado o dólar se os sulistas tivessem ganho há 150 anos a guerra da Secessão” esclarecem.

“Antes dizia-se socialismo ou barbárie”, “hoje deve-se dizer, união política ou barbárie” avisam explicitando ainda melhor o seu pensamento, “melhor dito, federalismo ou explosão e com a loucura da explosão, regressão social, precariedade, desemprego sem controlo, miséria”, e reforçando a ideia, escrevem “melhor dito ainda: A Europa dá um passo mais e decisivo pela integração política, ou sai da história e some-se no caos”. Os subscritores não têm a menor dúvida em afirmar que “já não existe outra opção: ou a união política ou a morte”.

Os autores do manifesto não têm quaisquer dúvidas e no final do seu manifesto que amanhã será conhecido deixam claramente um aviso aos europeus. Poderá demorar mais ou menos tempo mas conforme dizem rematando o seu texto “chegará. A Europa sairá da História. De uma ou de outra forma, se não fizer nada desaparecerá. Esta deixou de ser uma hipótese, um vago temor, uma ameaça que se brande face aos europeus recalcitrantes. É uma certeza, Um horizonte insuperável e fatal. Tudo o demais – truques de magia de uns, pequenos acordos de outros, fundos de solidariedade por aqui, bancos de estabilização por ali – só serve para atrasar e no fim entreter o moribundo com a ilusão da prorrogação”.


in http://www.rtp.pt/noticias/index.php?article=622639&tm=4&layout=121&visual=49