domingo, 5 de agosto de 2012

A dissolução da Europa


Esta semana, o primeiro-ministro italiano alertava a Alemanha para o risco de "dissolução da Europa". É perturbador ler isto mas não me surpreendeu.

De facto, numa União Europeia que deveria cumprir aquilo a que se destinou e que tanto apregoou, isto é, aproximar a Europa dos seus cidadãos e os povos da União entre si, e que considera primordial assegurar a paz, prosperidade e estabilidade às suas populações, consolidar a reunificação do continente, garantir a segurança dos cidadãos, promover um desenvolvimento económico e social equilibrado, vencer os desafios da globalização e preservar a diversidade dos povos europeus, e ainda, fomentar o desenvolvimento sustentável, a qualidade do ambiente, os direitos humanos e a economia social de mercado, a União Europeia está a falhar na política de solidariedade e de coesão que deveria ser, sempre, a prioridade das prioridades.

A Europa não conseguirá viver unida nem sobreviverá como UE se mantiver a posição atual de subordinação aos interesses dos poderosos que a integram, caso da Alemanha e da França. Afinal, não foi com este espírito que esta União foi criada nem assim se justifica a posição dos que nela sonharam concretizar a formação de um espaço territorial forte, próspero e solidário, económica mas também socialmente.

Nunca o económico deveria impor-se ao social como temos visto, com a clara opressão e dependência dos mais fracos, dos de menos recursos ou dos que maiores adversidades sofrem.

Nesta contabilidade da desgraça, aquilo a que assistimos atualmente é à afirmação nada desejável e até preocupante de países como a Alemanha com um acentuado nacionalismo de má memória, que mais imperialismo parece querer voltar a ser, esquecida que está do mal que fez e dos males que deixou quando também permitiu lideranças de gente obcecada pelo poder a qualquer preço. E esse mal foi o nazismo - o pior dos fascismos -, foi a aceitação de um monstro ao qual serviram e ao qual nunca se opuseram, inebriados pela ideia de um mundo ariano omnipotente assente numa Mein Kamft de horror, sangue e morte e na crença de um mundo que humilhasse (como humilhou) e que escravizasse (como escravizou), agindo pela força das armas mas também pela força da ignomínia e do genocídio que ao desespero e à “solução final” milhões levou.

A Alemanha não tem moral para ter a arrogância que tem tido relativamente aos outros países da UE. A Alemanha (e não só!) deve rever os compromissos a que é obrigada por via das disposições comunitárias e rever, sobretudo, os objetivos dessa união.

A Alemanha atual que é a Alemanha da arrogância e do nacionalismo de pendor ditatorial, nunca cumpriu os seus compromissos desde a 1ª guerra mundial sendo exatamente os seus incumprimentos a razão principal do deflagrar das duas guerras mundiais iniciadas na nossa Europa.

Quando a própria UE diz e reforça a necessidade que os países que a compõem continuem a trabalhar em conjunto, para assegurarem o seu crescimento económico e serem capazes de concorrer a nível mundial com outras grandes economias, quando afirma que isoladamente nenhum país da União tem dimensão suficiente para fazer valer os seus interesses na arena do comércio mundial, quando pretende que o mercado interno europeu proporcione às empresas uma plataforma essencial para uma concorrência eficaz nos mercados mundiais, quando defende que este grande espaço de livre concorrência tem de ter como corolário uma política de solidariedade de dimensão europeia que beneficie de forma clara e concreta os cidadãos europeus, e que os fundos estruturais, geridos pela Comissão Europeia incentivem e complementem os esforços das autoridades nacionais e regionais da União para reduzirem as desigualdades existentes entre as diferentes partes da Europa… Olhamos para a atualidade e que vemos?  

Vemos o servilismo da Europa face à Alemanha, a exigir e a regulamentar financeira e despoticamente todos os outros, esquecida que está da vertente fundamental que a União Europeia jamais deveria secundarizar, e muito menos, alhear-se, que é a da SOLIDARIEDADE entre os seus estados.

A aplicação dos fundos estruturais e dos fundos de coesão é cada vez mais urgente e, numa fase de depressão mundial como a que vivemos, a transferências de fundos dos países ricos para os países pobres é cada vez mais pertinente, sem que isso leve à humilhação de uns países sobre os outros ou de políticas financeiras suicidas, como o que se passa com a Alemanha face à Europa em geral e à do sul em particular.

Robert Schuman, Konrad Adenauer, Alcide de Gasperi e Winston Churchill, quiseram uma nova era para os europeus libertando-os de totalitarismos que desgraçadamente separaram e dizimaram gentes e valores.

Recentemente,  o primeiro-ministro italiano Mario Monti alertou a Alemanha para o risco de um "confronto entre Norte e Sul" na Europa, numa entrevista hoje publicada pela revista alemã Der Spiegel. Este estadista falava em tensões que "contêm "a semente da dissolução psicológica da Europa", considerando "muito preocupante" o aumento das tendências nacionalistas que cada vez se fazem sentir mais. E nós também vemos e sentimos isso. Monti chega a referir que, mais do que financiamento, o sul da Europa precisa de solidariedade, apoio moral. E é verdade, sim.

 Segundo a Lusa desta semana, Draghi, presidente do Banco Central Europeu, afirmou que o "conselho de governadores desse Banco poderá aplicar mais medidas não convencionais para restaurar a transmissão de política monetária”, uma referência à possibilidade de o BCE voltar a comprar títulos de dívida europeia e assim reduzir as taxas de juro pagas por países como a Espanha e a Itália. Acrescentou que qualquer nova compra de obrigações pelo BCE terá de ser precedida por um pedido de ajuda a um dos fundos de estabilidade financeira. No entanto, a ideia de o BCE financiar diretamente os Estados da zona euro não agrada a todos os membros do Banco, particularmente à Alemanha.

"Essas preocupações são infundadas", disse Monti ao Spiegel. "É exatamente essa desconfiança que nos impediu de encontrar uma solução clara para esta crise. Temos que a superar e voltar a confiar uns nos outros."

Só a união fará a força da UNIÃO. Mas uma união séria, onde o compromisso e  a ética por todos seja assumida e não só por alguns, como aconteceu com as disposições do Tratado de Versalhes, lembram-se?


Nazaré Oliveira