Famílias sobre-endividadas recorrem cada vez mais à DECO |
Segundo o Diário Digital de hoje, 86 pessoas por dia pedem ajuda à DECO por
não conseguirem pagar contas. Esta organização foi contatada por cerca de
15.700 portugueses no primeiro semestre deste ano, muitos dos quais funcionários
públicos e reformados que não conseguem pagar as suas contas.
E se pensarmos nos pobres e aflitos que, envergonhados, não dizem nada
a ninguém e até fingem que mal não estão, escondendo o drama terrível em que se
encontram, sem dinheiro que chegue para pagar dívidas que, naturalmente, esperavam poder
atenuar com o subsídio de férias, escandalosamente retirado sem
dó nem piedade?
Escondem dos filhos, da família, dos amigos e dos colegas mais
próximos, a falta de bens essenciais e a sua incapacidade para fazer face ao
dia-a-dia. Sorriem para não chorar e passam uma imagem que publicamente os
proteja de um sofrimento que, solitariamente, arrastam pelos quatro cantos da
casa ou, quando ganham coragem, levam até à DECO ou até um qualquer amigo a
quem confidenciam a sua angústia, amargura e desespero.
Mas a vida é cruel, muito
cruel, tendo sido aos mais pobres e de mais parcos recursos que as medidas de
austeridade mais dramaticamente sorveram alguma da sua pouca tranquilidade,
levando-lhes subsídios e direitos legitimamente e constitucionalmente
adquiridos, com os quais contavam, não para férias nas Caraíbas ou afins, carros ou carrões, roupas ou SPAs mas, simplesmente, para
reorganizar e tentar equilibrar orçamentos familiares já de si tão apertados,
particularmente entre os funcionários
públicos e reformados, cujos rendimentos diminuíram substancialmente devido a
esses cortes, a esses roubos legalizados.
Segundo a coordenadora do Gabinete de Apoio aos
Sobreendividados (GAS), Natália Nunes, em declarações à RR, o número de
sobreendividados aumentou 50% em relação a igual período do ano passado,
salientando que cada vez mais é o crédito pessoal que contribui para
desestabilizar as contas: «45% de todo o crédito que renegociamos é crédito
pessoal, daí o peso que este tem no seio do orçamento das famílias», afirmou.
Em dois anos, mais do que duplicaram os pedidos de
ajuda. No entanto, numa ofensiva cada vez mais imoral e sem limites, o governo fala
de austeridade, de necessidade de austeridade, de valores a atingir, de metas
da troika para cumprir, cada vez mais
de austeridade, de pesada e discutível austeridade, "sem limites", "a torto e a direito", esquecendo que aos poucos vai matando quem a custo sempre
sobreviveu e que, agora, inevitavelmente, sucumbirá face às investidas de políticos
e de políticas desumanas e de um capitalismo selvagem que tem feito das nossas
vidas um inferno mas das vidas de certos lordes
um paraíso.
Há quem mate
sem parecer que o faz. Há quem viva morrendo.
Nazaré Oliveira
Nazaré Oliveira