Achei que este artigo levava (e leva!) a uma séria reflexão.
Aqui fica.
Manuel Villaverde
Cabral (http://historico.ensino.eu)
Num dos debates organizados pelo MIL e pela PODe o
sociólogo Manuel Villaverde Cabral defendeu a tese de que “a economia funcional
é incompatível com a democracia”. Isso explicaria porque é que alguns dos
países que exibem hoje condições económicas mais prósperas são precisamente
aqueles onde o sistema democrático é mais aparente ou disfuncional: China,
Vietname, Angola, Rússia, entre outros… Tudo se passa como se fosse impossível
viver em democracia, ter direitos cívicos e sociais e conciliar tal liberdade
com o desenvolvimento económico.
Esta aparente incompatibilidade resultaria da “necessidade” de conceder
direitos cívicos, democráticos e laborais aos cidadãos e de manter os custos de
produção baixos, os níveis de contestação social e laboral residuais.
A interpretação pessimista de Villaverde pode levar-nos a crer de que a
curto prazo os poderes económicos haverão de levar as democracias ocidentais à
extinção e irão impor sistemas ditatoriais, um pouco como a resposta de muitos
países europeus à “Grande Depressão” da década de 20 e 30 foi precisamente a
vaga de ditaduras e regimes autoritários que então se impuseram na Europa de
Leste e do Sul. Aplicando desta forma redutora este paralelismo, poderíamos ser
levados a crer na repetição desta resposta. Mas a História nunca se repete de
forma literal… As condições hoje não são propicias a um regresso puro e duro do
mesmo tipo de regimes que se estenderam por boa parte da Europa nessa época: as
populações dispõem do conhecimento dos excessos que esses regimes trouxeram ao
globo e as democracias estão demasiado amadurecidas para que possam subitamente
degenerar em ditaduras.
Mas o processo de transformação das democracias “noutra coisa” está em
marcha. Não serão as ditaduras racistas e de Extrema-direita de antanho, mas
observamos já uma virtualização, uma ritualização vazia, um esvaziamento
efetivo da ação e capacidade dos órgãos eletivos para representarem os seus
cidadãos. No atual contexto, é possível exprimir livremente todas as opiniões,
manifestarmo-nos e publicar praticamente tudo. Mas tudo isso é cada vez mais
irrelevante.
O Ocidente não caminha para uma nova vaga de ditaduras. Caminha – e a
passos largos – para uma Indeferênciatura, a ditadura da indiferença, em que
continuará a ser possível votar e exprimir livremente as suas opiniões, mas que
o controlo dos meios de comunicação pelos interesses económicos, pelas
multinacionais e seus agente, é tão absoluto que apenas os “candidatos do
sistema” estão autorizados a alternarem no poder, e onde sátrapas desses
interesses são instalados remotamente nas democracias em dificuldades
financeiras como a Itália ou a Grécia.
Publicado em 2012/06/30 por Clavis
Prophetarum
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