Os franceses Edgar Morin, filósofo, e Stéphane Hessel, diplomata que inspirou os movimentos dos Indignados, propõem num manifesto conjunto de soluções contra a «apatia» e as «crises do século XXI» através de reformas e da responsabilização dos Estados.
No livro “O caminho da
esperança – Um apelo à mobilização cívica”, que foi publicado esta semana em
Portugal, os dois pensadores denunciam «a política cega» que «conduz ao
desastre» e sugerem soluções que pretendem acabar com a «apatia e a resignação
fatais».
«A humanidade, que
suportou a barbárie dos totalitarismos do século XX, vê agora cair sobre si a
hidra do capitalismo financeiro e, ao mesmo tempo, toda a espécie de fanatismos
e maniqueísmos étnicos, nacionalistas, religiosos» escrevem os dois autores que
foram membros da Resistência Francesa contra a ocupação nazi e o regime de
Vichy (colaboracionista) durante a Segunda Guerra Mundial.Os autores socorrem-se da Declaração dos Direitos do Homem de que Hessel foi redator, mas sobretudo do Programa do Conselho Nacional da Resistência Francesa, e apontam saídas para a crise, tendo como referência o continente europeu e em particular a situação política, económica e social em França.
«A França republicana
e social parecia afirmar-se definitivamente, mas eis que se assiste ao
renascimento de um vichismo servil, que não pode imputar-se a qualquer desastre
militar, a nenhum colaboracionismo, a nenhum ocupante», sublinham os autores do
manifesto de 66 páginas, em que abordam questões relacionadas com a educação,
política de consumo, trabalho e emprego, política do bem-estar, políticas de
consumo, e reforma política.
Os dois franceses
defendem ainda que a «economia pluralista» deve, neste caso, atuar contra o
capitalismo «porque a social-democracia calou-se face ao seu principal
inimigo».«Temos de instaurar o nosso próprio New Deal (série de programas implementados pelo Governo dos Estados Unidos, entre 1933 e 1937, para reformar a economia norte-americana), lançando grandes obras de infraestruturas que criem empregos, reduzam de forma acentuada o desemprego e relancem a economia, já que a política de rigor, supostamente destinada a reduzir a crise económica, conduz a uma recessão cada vez maior, a um maior desemprego, a salários e retribuições mais baixos e a uma diminuição do consumo», escrevem.
«O Estado-providência está cada vez mais minado pela globalização» e por isso, afirmam, os Estados devem investir na sociedade e «conceder crédito (reembolsável em caso de êxito) a todas as pequenas e médias empresas, assim como se deve reprimir a especulação financeira através de um controlo efetivo dos bancos, da vigilância das agências de notação e de impostos sobre transações diretas», referem Edgar Morin e Stéphane Hessel.
«Não queremos fundar
um partido novo nem aderir a um antigo, desejamos apenas que se opere uma
regeneração a partir das quatro fontes que alimentam a esquerda: a fonte
libertária, baseada na liberdade dos indivíduos; a fonte socialista, baseada na
melhoria da sociedade; a fonte comunista, baseada na fraternidade comunitária,
e a fonte ecológica», propõem os pensadores, que consideram acabados os
recursos dos partidos.
Neste sentido,
defendem «a formação de um poderoso movimento de cidadania, de uma insurreição
de consciências que possa delinear uma política à altura das exigências».Stéphane Hessel, 95 anos, diplomata de origem alemã, foi membro da Resistência Francesa, torturado pela Gestapo e preso num campo de concentração durante a Segunda Guerra Mundial e é autor dos livros Indignai-vos! (2010) e Empenhai-vos! (2011) que venderam milhões de exemplares em todo o mundo e que inspiraram os movimentos dos 'Indignados' em vários países, sobretudo no Sul da Europa.
Edgar Morin, 91 anos,
sociólogo e filósofo francês foi também membro da Resistência contra a ocupação
alemã nos anos 1940.
Lusa/SOL, 22 de Maio,
2012