sábado, 23 de julho de 2011

“bloodsport”

"Há quem diga que as nossas tradições merecem ser preservadas simplesmente devido à sua antiguidade. Para estas pessoas a antiguidade confere um estatuto especial a uma prática ou a um ritual. Entretanto, parece-me uma maneira de pensar muito duvidosa e comprometedora no sentido de que nos impede de avaliar o valor intrínseco dos nossos actos. Por isso, penso que antes de decidir se uma tradição merece ser preservada ou não devemos sempre perguntar se ela encoraja os valores que queremos na nossa sociedade – a solidariedade, a criatividade, o respeito pelo outro, e a curiosidade, por exemplo. Será que vai educar os nossos filhos a serem pessoas sensatas, ajudando-os a realizarem-se e a serem bons cidadãos?

A meu ver, a negligência destas considerações representa uma abdicação da nossa responsabilidade como seres que pensam e sentem.

No que diz respeito à tauromaquia – sem dúvida, uma tradição portuguesa muito antiga – creio que temos que aplicar este mesmo raciocínio. A prática dissemina quais valores? E quais princípios educativos?

A meu ver, a mensagem predominante da tauromaquia é que os seres humanos têm o direito de usar animais como entendem, mesmo se isto implica o seu tormento. Os sentimentos do animal, em particular o seu sofrimento, são irrelevantes. Também transmite a ideia de que podemos – e devemos – divertir-nos com o tormento de outras criaturas, pelo menos quando é ritualizado e publicitado como entretenimento ou desporto.

Entretanto, sei que seria possível argumentar de que outros valores mais positivos são disseminados por esta tradição. Não tenho dúvidas, por exemplo, que confrontar um touro enfurecido requer coragem por parte do toureiro.

A minha opinião é que temos que “pesar” as mensagens negativas transmitidas por um ritual com as mensagens positivas. A minha conclusão é que a tauromaquia causa muito mais danos que benefícios à nossa sociedade. Prefiro viver num país em que os animais são respeitados e bem tratados, e onde nenhum “bloodsport” – um desporto que provoca o sangue e a dor do animal – é classificado como entretenimento. A meu ver, nunca devíamos educar os nossos filhos a tirarem prazer do sofrimento de qualquer criatura. Fazer isso é irresponsável e perigoso."

Richard Zimler