MINHA CRÓNICA NO "PÚBLICO" DE HOJE:
Quando me disseram não quis acreditar. Um teste nacional para a disciplina de Ciências Físico-Químicas do 9.º ano, depois de indicar os nomes de todos os planetas do sistema solar, perguntava isto: “Actualmente, considera-se que o sistema solar é constituído por quantos planetas?” Passo por cima da péssima construção de português, que indicia autores iletrados. Não quis acreditar porque não achava possível que um teste que, segundo o Ministério da Educação, tem como uma das suas principais finalidades “permitir a cada professor aferir o desempenho dos seus alunos por referência a padrões de âmbito nacional” quisesse verificar se os jovens de 15 anos sabiam contar até oito. Além disso, a pergunta não testava nenhuns conhecimentos nem de Física nem de Química. Poderia tratar-se de borboletas ou de minerais em vez de planetas...
Já sabia da degradação do nosso ensino, mas, ingénuo, não acreditei que ela pudesse ter chegado a um ponto tão extremo. Não há, contudo, neste momento, margem para dúvidas: pedir para contar até oito no final do ensino básico significa que estamos feitos num oito! Digam o que disserem (e o Ministério disse, defendendo o indefensável), exigir tão pouco significa o culminar do processo de estupidificação em curso, um ataque descarado à escola pública, a única acessível aos mais desfavorecidos, que sem ela ficam completamente impreparados para a vida e, portanto, condenados à sua condição. Não pude deixar de pensar que a nossa crise é também a crise da educação. Que a nossa crise é, talvez, principalmente essa.
Não estava sozinho. Um artigo do Wall Street Journal de 25 de Abril último, intitulado “Uma nação de alunos desistentes abala a Europa” tinha posto o dedo na ferida: “O estado da educação em Portugal diz muito sobre as razões da necessidade do resgate financeiro, que será penoso e de custo elevado. Em poucas palavras, Portugal tem de gerar crescimento económico durante bastante tempo para salvar as suas dívidas excessivas ao estrangeiro. Com uma mão de obra pouco qualificada isso torna-se difícil.” Nesse artigo um gráfico relativo à taxa de abandono escolar mostrava, com 37 por cento, o antepenúltimo lugar de Portugal entre 28 países da OCDE, apenas à frente do México e da Turquia. Somos os últimos da Europa (a Irlanda tem 4 por cento e a Grécia 9 por cento, bem à frente da média da União Europeia, que é de 17 por cento).
Pois, confrontado com o grave problema educativo, o que fez o governo ainda em funções, na sequência aliás do que fizeram os governos anteriores da mesma ou de outras cores políticas? Deu mais apoio aos alunos? Formou melhor os professores? Desdobrou o pesado e uniforme sistema escolar? Não. Como a avestruz colocou a cabeça na areia e quis que fizéssemos o mesmo. A areia são os resultados de uma avaliação de faz-de-conta.
Pensou que o problema se resolvia não por mais atenção e esforço de todos, mas baixando progressivamente a fasquia do que é pedido em provas, para além de distribuir diplomas em troca de “histórias de vida” e oferecer Magalhães a esmo aos infantes. Quanto à dignificação dos professores, à sua melhor formação e à deposição de confiança neles, nada disso estava na agenda política: eles foram antes escolhidos como inimigos, sujeitando-os aos tratos de polé de uma avaliação kafkiana e diminuindo-os perante a opinião pública. E ainda há quem proponha, nesta 25.ª hora, piorar a formação dos professores do Secundário.
Dispomos agora de uma excelente ocasião para dizer chega. Não que tenha grandes ilusões sobre a vontade do novo governo, qualquer que ele seja, de colocar como prioridade a questão da educação e enfrentá-la com vigor. Não, não tenho. Mas expressar de modo claro a nossa posição em eleições é um dos direitos de que, num país inundado pela ignorância e pela desinformação, ainda dispomos.
PS) Um aluno finalista do Secundário, por sua própria iniciativa e apenas com o apoio do seu professor, obteve uma medalha de prata nas Olimpíadas Internacionais de Filosofia. Honra ao mérito: A despeito das pedras as flores florescem!
Quando me disseram não quis acreditar. Um teste nacional para a disciplina de Ciências Físico-Químicas do 9.º ano, depois de indicar os nomes de todos os planetas do sistema solar, perguntava isto: “Actualmente, considera-se que o sistema solar é constituído por quantos planetas?” Passo por cima da péssima construção de português, que indicia autores iletrados. Não quis acreditar porque não achava possível que um teste que, segundo o Ministério da Educação, tem como uma das suas principais finalidades “permitir a cada professor aferir o desempenho dos seus alunos por referência a padrões de âmbito nacional” quisesse verificar se os jovens de 15 anos sabiam contar até oito. Além disso, a pergunta não testava nenhuns conhecimentos nem de Física nem de Química. Poderia tratar-se de borboletas ou de minerais em vez de planetas...
Já sabia da degradação do nosso ensino, mas, ingénuo, não acreditei que ela pudesse ter chegado a um ponto tão extremo. Não há, contudo, neste momento, margem para dúvidas: pedir para contar até oito no final do ensino básico significa que estamos feitos num oito! Digam o que disserem (e o Ministério disse, defendendo o indefensável), exigir tão pouco significa o culminar do processo de estupidificação em curso, um ataque descarado à escola pública, a única acessível aos mais desfavorecidos, que sem ela ficam completamente impreparados para a vida e, portanto, condenados à sua condição. Não pude deixar de pensar que a nossa crise é também a crise da educação. Que a nossa crise é, talvez, principalmente essa.
Não estava sozinho. Um artigo do Wall Street Journal de 25 de Abril último, intitulado “Uma nação de alunos desistentes abala a Europa” tinha posto o dedo na ferida: “O estado da educação em Portugal diz muito sobre as razões da necessidade do resgate financeiro, que será penoso e de custo elevado. Em poucas palavras, Portugal tem de gerar crescimento económico durante bastante tempo para salvar as suas dívidas excessivas ao estrangeiro. Com uma mão de obra pouco qualificada isso torna-se difícil.” Nesse artigo um gráfico relativo à taxa de abandono escolar mostrava, com 37 por cento, o antepenúltimo lugar de Portugal entre 28 países da OCDE, apenas à frente do México e da Turquia. Somos os últimos da Europa (a Irlanda tem 4 por cento e a Grécia 9 por cento, bem à frente da média da União Europeia, que é de 17 por cento).
Pois, confrontado com o grave problema educativo, o que fez o governo ainda em funções, na sequência aliás do que fizeram os governos anteriores da mesma ou de outras cores políticas? Deu mais apoio aos alunos? Formou melhor os professores? Desdobrou o pesado e uniforme sistema escolar? Não. Como a avestruz colocou a cabeça na areia e quis que fizéssemos o mesmo. A areia são os resultados de uma avaliação de faz-de-conta.
Pensou que o problema se resolvia não por mais atenção e esforço de todos, mas baixando progressivamente a fasquia do que é pedido em provas, para além de distribuir diplomas em troca de “histórias de vida” e oferecer Magalhães a esmo aos infantes. Quanto à dignificação dos professores, à sua melhor formação e à deposição de confiança neles, nada disso estava na agenda política: eles foram antes escolhidos como inimigos, sujeitando-os aos tratos de polé de uma avaliação kafkiana e diminuindo-os perante a opinião pública. E ainda há quem proponha, nesta 25.ª hora, piorar a formação dos professores do Secundário.
Dispomos agora de uma excelente ocasião para dizer chega. Não que tenha grandes ilusões sobre a vontade do novo governo, qualquer que ele seja, de colocar como prioridade a questão da educação e enfrentá-la com vigor. Não, não tenho. Mas expressar de modo claro a nossa posição em eleições é um dos direitos de que, num país inundado pela ignorância e pela desinformação, ainda dispomos.
PS) Um aluno finalista do Secundário, por sua própria iniciativa e apenas com o apoio do seu professor, obteve uma medalha de prata nas Olimpíadas Internacionais de Filosofia. Honra ao mérito: A despeito das pedras as flores florescem!