sexta-feira, 20 de maio de 2011

Ainda há escolas e professores

Ainda há escolas e professores que se preocupam em dignificar a palavra democracia e que fazem a diferença pela sua postura cívica interventiva.
Escolas que, com toda a legitimidade, numa desejável colaboração institucional, não só criticam directrizes do Ministério da Educação (ME) como apontam caminhos que tragam urgentemente a harmonia e a motivação a uma classe docente cada vez mais violentada na essência do seu trabalho, com decretos, despachos e orientações absurdas sobre a avaliação do seu desempenho e a pretensa procura do mérito e competência. Mas o ME não as leva a sério e as respostas são sempre desfavoráveis, claramente evidenciadoras de um diálogo que nunca se pretendeu verdadeiramente e redundou em unilateralidade e imposições.
Num torpor e estranho aceitacionismo, há escolas e Direcções que executam apressadamente tudo o que lhes chega, como é o caso das últimas regulamentações sobre a avaliação dos professores, multiplicando-se em dezenas e dezenas de reuniões infindáveis nas quais pouco tem importado o que os professores pensam e dizem. Assustadoramente, invadem-nos com centenas de e-mails e páginas escritas para reflexão orientada superiormente, no entanto, quanto divisionismo e discussões estéreis provocam, quanto desânimo e frustração.
Apesar de legitimadas pelo voto dos seus pares e conhecedoras deste ambiente que tem vindo a degradar-se nas escolas, as Direcções quase nunca ou nunca convocam os professores para, legitimamente, em sede de Reunião Geral ou Conselho Pedagógico, tomarem uma posição de escola. Deveriam denunciar publicamente que o ME continua a não dar resposta aos pedidos das escolas sobre a dificuldade de operacionalização da avaliação docente e dos prejuízos que isso está já a provocar, inevitavelmente, no trabalho com os alunos. Tal como a atitude da maioria dos deputados, cujo servilismo partidário e ascensão social se sobrepõe aos interesses do país real, e até do Presidente da República. Aliás, dois dos candidatos às próximas eleições, que acabaram por pactuar com o governo, cada um à sua maneira, aquando da votação do Estatuto da Carreira Docente, aparecem-nos agora como arautos do Estado Social e Justiça Social! E quantos deputados visitam as escolas do seu círculo eleitoral para verificarem SERIAMENTE como é HOJE o trabalho dos professores e as condições em que o fazem?
Aprendamos com a experiência de 2008/2009 - avaliação de pares por pares -, que não resultou nem resultará se pretendemos qualidade e isenção, excepto para os “habilidosos”, cuja capacidade de encenação lhes permitiu, como sempre, aproveitarem-se do sistema.
Ainda agora, o ME só privilegia a “formação com créditos”, mesmo que essa formação, pedagógica e cientificamente administrada seja comprovadamente de pouco nível. No entanto, rejeita completamente formação acrescida, universitária, que o professor escolheu, pagou e consta do seu curriculum, mas da qual não tem “créditos”.
Este ME está completamente perdido no meio dos atropelos que causou. Demonstra falta de conhecimento da realidade, falta de liderança e honestidade.
É cada vez mais exigente e desgastante uma carreira no ensino que não se compadece da falta de rigor e da complexidade perversa de experiências legislativas. Nem pode continuar a ser um tubo de ensaio onde se doseia e mistura mérito com competência… a qualquer preço. Estão a destruir a paz nas escolas. Instalou-se o medo, a chantagem e a ameaça da estagnação na carreira, sobretudo para os contratados, caso não se cumpra o que sempre pretenderam e que sub-repticiamente acabaram por impor. Instalou-se o conflito de interesses inter-pares, gerador de confusão, parcialidade, grande desgaste psicológico e até físico, com avaliados e avaliadores a concorrerem às mesmas quotas (% de Muito Bons e Excelentes) por escola, e até elementos da Comissão de Avaliação e relatores a concorrem para o mesmo objectivo! Que nome dar a isto? Que legitimidade existe quando coordenadores são obrigados a assistir a aulas de relatores e o Director às dos coordenadores, não avaliando, obviamente, a qualidade científica do trabalho? Quando assistimos a uma aula, não podemos nem devemos separar a dimensão pedagógica da científica, logo, fica desde logo viciada a linha de partida e desacreditado um processo que deveria ser sério e transparente para ser correctamente aplicado. Um processo que tornasse a progressão na carreira justa e motivadora, da qual os alunos, a Escola e o país, naturalmente, sairiam a ganhar.
Não pode haver, outra vez, “acordos de princípios”que vão contra as legítimas aspirações dos milhares de professores que se manifestaram publicamente. «Quando não se aceita a prova da realidade entra-se no reino da irracionalidade». Foi e é o que continua a acontecer e os resultados estão à vista de todos.
Já não se aguenta tanta arrogância e pretensiosismo de um governo que se arvora em defensor do mérito e da competência mas cuja acção continua a envergonhar a democracia e o ideário da primeira República que diz ter comemorado.

Maria Nazaré Oliveira