domingo, 23 de outubro de 2016

Bob Dylan


              Not Dark Yet

sábado, 22 de outubro de 2016

Ainda sobre os incêncios



Incêndios de hoje e palavras de anteontem


Eu sei que ninguém terá paciência para ler um post com esta extensão e ainda por cima referente a declarações feitas feitas em 2003. Mas lembrei-me de como, ao ouvir as notícias e comentários sobre a tragédia em curso dos incêndios, se sentirá, o meu camarada Agostinho Lopes que, ao longo de anos e anos, na AR e fora dela, se pronunciou dezenas de vezes com rigor e qualificação (é só consultar o Google ou a página do PCP) sobre as questões estruturantes que rodeiam este problema. Naturalmente que muita coisa se terá passado depois de 2003 mas não fica mal dar este testemunho de há 13 anos. Aguenta, Agostinho, é nossa sina ser preciso passar muito tempo para, de vez em quando, nos darem razão.


A pequena propriedade florestal, bode expiatório da política agro-florestal de direita
Causas e responsabilidades políticas

O ano de 2003 fica assinalado, infelizmente, pela pior tragédia de que há memória em matéria de fogos florestais: 423 949 hectares de área ardida, valor nunca antes atingido, dos quais 86% foram grandes incêndios; 20 mortos; mais de 5 mil agricultores atingidos; aldeias devastadas pelas chamas; edifícios e patrimónios, culturas e animais destruídos; centenas de postos de trabalho liquidados.Perante a tragédia, para lá das medidas de urgência de resposta aos problemas mais imediatos, a primeira tarefa de qualquer governo, seria a procura e identificação séria, rigorosa, objectiva, das causas do acontecido, do que falhou no combate aos incêndios, da determinação das responsabilidades políticas – determinação dos erros e omissões das políticas agro-florestais, do aparelho do Estado que tutela aos áreas florestais, etc..Ora, não é isso que vem sendo feito desde o passado mês de Setembro. Bem pelo contrário. Ao que temos assistido é ao desenvolvimento de uma estratégia mistificadora sobre o assunto e com objectivos políticos bem claros (embora em alguns casos ainda não suficientemente explicitados): a desresponsabilização do Governo PSD/CDS-PP e da política da direita pela tragédia ocorrida no Verão de 2003.Três decisões governamentais são particularmente relevantes e significativas nessa estratégia de manipulação e mistificação políticas das causas, das responsabilidades políticas e na decisão sobre as medidas a tomar: a nomeação do eng. João Soares para a recuperada Secretaria de Estado das Florestas (9 de Outubro de 2003); a publicitação do Livro Branco do Ministério da Administração Interna (15 de Outubro de 2003); a Resolução do Conselho de Ministros de 30 de Outubro de 2003.A indicação do eng. João Soares para a coordenação governamental da política florestal é uma peça central da estratégia do Governo. Com um currículo que não deixa lugar a dúvidas, e se dúvidas houvesse, as suas últimas intervenções públicas esclarecem em definitivo as suas opções e a sua estratégia para a floresta portuguesa.Com a sua nomeação, os grupos industriais (celuloses, aglomerados, cortiça, etc.) que monopolizam a fileira florestal, vêem (certamente com agrado) fechado um importante triângulo de amigos no Poder: Sevinate Pinto no Ministério da Agricultura, Álvaro Barreto na Comissão de Agricultura da Assembleia da República, e agora João Soares, o todo poderoso coordenador da tutela do Governo na floresta portuguesa.Para esses grupos, é claro, a floresta é fundamentalmente, se não exclusivamente, um produtor de matéria-prima, que deve estar acessível em quantidade e qualidade e a baixo preço, para abastecimento das suas indústrias. É disso que trata a estratégia florestal posta em marcha por João Soares e o Governo PSD/CDS-PP.Para João Soares, a causa principal para a existência de incêndios florestais é a ausência de uma gestão profissional da floresta. Di-lo de forma explícita: «A questão fulcral da actual floresta portuguesa é a ausência de uma gestão activa e profissional. Sem ela, os espaços florestais estão abandonados e apenas são objecto de uma exploração “mineira”. Com esta situação vem o maior risco e a maior susceptibilidade ao fogo e nunca é possível gerar as mais valias associadas às (ausentes) práticas técnicas de gestão.». (Expresso, 18 de Outubro de 2003)E porque é que não há a tal gestão profissional da floresta»? Resposta de João Soares: porque «(...) a gestão florestal exige uma área mínima de intervenção silvícola. É por isso que importa garantir essa área mínima (...).»! Logo, a actual estrutura minifundiária, dominante na propriedade florestal em Portugal, é de facto a razão primeira para os fogos florestais e outros males decorrentes da actual ausência da tal gestão florestal «profissional e activa»!O Livro Branco sobre os incêndios florestais é outra peça significativa, pela sua origem, pelo que diz e pelo que não diz sobre a matéria que é o seu objecto. Em primeiro lugar, é apenas um livro branco sobre as operações de combate aos incêndios florestais. E já diz muito sobre a táctica governamental, o confinar a sua elaboração ao Ministério da Administração Interna, afastando o Ministério da Agricultura dessa abordagem.O Governo, que desde o início tentou minimizar a dimensão da tragédia, não fez no Livro Branco qualquer hierarquização ou abordagem profunda das causas dos incêndios, limitando-se a uma amálgama onde mistura alhos com bugalhos, e de onde resulta o excessivo relevo dado aos fenómenos climatéricos. A Resolução do Conselho de Ministros sobre uma alegada «Reforma Estrutural do Sector da Floresta», e a consequente criação no Orçamento do Estado para 2004 de um Fundo Florestal Permanente, são a terceira peça da resposta do Governo à tragédia dos incêndios e aos problemas das matas portuguesas.Reproduzindo as teses do secretário de Estado João Soares, a Resolução atribui à «ausência de gestão florestal» e ao «excessivo parcelamento fundiário» (a par dos «desequilíbrios na constituição dos povoamento», do «desordenamento da sua implantação» e do «abandono a que se encontram votadas extensas áreas florestais»), as razões centrais dos incêndios. Igualmente se releva na determinação dos «quatro estrangulamentos principais» do sector: «a estrutura da propriedade» (a par da «descoordenação da acção pública sobre a floresta», da «complexidade dos actos e procedimentos de acesso aos financiamentos públicos», e da «elevada taxa de risco associada aos incêndios»). A evidente utilidade política das análises e soluções do Governo PSD/CDS-PPA tese do secretário de Estado das Florestas e do Governo PSD/CDS-PP de que a causa dos incêndios florestais em Portugal (e valeria a pena reflectir sobre o problema em outras paragens) resulta da ausência de gestão profissional das áreas florestais, e de que não há gestão, dada a dominância da pequena propriedade/estrutura minifundiária, na estrutura fundiária florestal do País, tem uma evidente oportunidade e utilidade políticas.Perante a comoção colectiva que varreu o País durante o Verão, desresponsabiliza-se inteiramente o actual Governo e a política agro-florestal de direita de sucessivos governos do PSD, PS e a cumplicidade mais ou menos activa do CDS-PP, e apaga-se a causa principal da tragédia. E aproveitando a disponibilidade da opinião pública portuguesa, avança-se com soluções que em outras ocasiões se mostraram inviáveis ou saíram goradas pela luta das populações rurais.Aquela tese – responsabilizando a pequena propriedade e o pequeno proprietário pelo abandono das matas e bouças – absolve este e outros governos por políticas agro-florestais e não só, que desertificaram e desertificam o mundo rural e o interior do País, que retiraram coerência produtiva e ambiental à simbiose terras de cultivo/pecuária/matas ou bouças metas das explorações agrícolas familiares do Norte e Centro do País, que prosseguiram, praticamente desde o 25 de Abril, uma política atentatória da Constituição e de rotura com os compartes dos baldios, impedindo que estes utilizassem plenamente o acesso aos fundos comunitários, tudo fazendo para boicotar a sua autogestão.Aquela tese – responsabilizando a pequena propriedade – desresponsabiliza o Governo pela falta de ordenamento da floresta portuguesa. No entanto, é sabido que a Lei de Bases da Política Florestal foi aprovada em 1996, mas que os governos (PS e PSD/CDS) não a puseram em prática, inclusive não disponibilizando os meios orçamentais e humanos necessários, não promoveram a elaboração dos Planos Regionais de Ordenamento Florestal (PROF) e Planos de Utilização dos Baldios (PUB), não executaram as medidas de emergência nela inscritas para o combate aos fogos, não criaram o fundo financeiro previsto, só o fazendo agora e em condições profundamente questionáveis.Aquela tese – responsabilizando o pequeno proprietário florestal e os compartes dos baldios pela pouca ou nenhuma viabilidade económica da floresta portuguesa – pretende fazer esquecer as responsabilidades de sucessivos governos por uma política de comercialização das madeiras inteiramente nas mãos e conforme os interesses das celuloses, dos aglomerados e outras indústrias grandes consumidoras, quer pela política de preços, quer pela política de liberalização das importações. (Quem ouvir o secretário de Estado pode julgar que ao longo dos últimos anos os pequenos produtores florestais retiraram grossas maquias das suas pequenas parcelas de floresta, quando se sabe que a venda de madeira não dá qualquer rendimento significativo aos seus produtores directos, grandes e pequenos, e que o grosso do valor acrescentado da fileira tem sido apropriado pelos grandes intermediários madeireiros, e sobretudo pelas empresas transformadoras. Ou não se sabe que o preço do eucalipto está praticamente congelado desde 1996?! Ou que o duo Portucel/Soporcel domina 60% do mercado nacional de madeira?!)Aquela tese – responsabilizando o pequeno proprietário florestal pela ausência de gestão profissional da floresta – procura passar uma esponja sobre a responsabilidade do Estado (e de sucessivos governos) como co-gestor técnico dos baldios, procurando fazer-nos esquecer que, ao não cumprir o seu papel de gestor técnico nos cerca de 400 mil hectares de mata dos baldios, se tem traduzido na degradação e abandono dessa floresta, a venda desvalorizada da sua produção lenhosa e outros subprodutos na não afectação de apoios comunitários, e consequente perda de mais valias geradas no sector. Ou que o Estado se tem limitado, em geral, a sacar a parte que lhe compete das receitas (e às vezes até a parte dos compartes) para as gastar nas despesas decorrentes do aparelho do Ministério da Agricultura, em vez de o investir na floresta.Aquela tese – a da responsabilidade do pequeno proprietário pelo estado a que chegou a floresta portuguesa – pretende fazer esquecer as políticas do Estado mínimo, que dentro da boa filosofia neoliberal sucessivos governos vêm aplicando à estrutura do Ministério da Agricultura virada para a floresta, liquidando a extensão florestal, reduzindo os serviços regionais ao osso, liquidando paulatinamente o número de guardas florestais (privatizando algumas das suas funções, como no caso da caça), contendo ou reduzindo os meios de vigilância e fiscalização para as brigadas de sapadores entretanto criadas, em particular dificultando ao máximo a mobilidade dos quadros e profissionais existentes. Isto sem, agora e aqui, nos referirmos aos processos de corrupção verificados na aplicação dos fundos comunitários e no ordenamento da caça, até hoje sem esclarecimento à vista!Aquela tese é também partilhada pelo PS, e percebe-se bem porquê.Prosseguindo, agora na oposição, a política florestal do ex-governo de António Guterres e do então ministro da Agricultura Capoulas Santos, o Grupo Parlamentar do PS avançou recentemente com um Projecto de Lei que, independentemente da sua bondade técnica e política, refere no seu preâmbulo o seguinte: «A estrutura de propriedade florestal que a história nos legou tem constituído e constitui o principal constrangimento à gestão activa e profissional de uma parte significativa da floresta nacional e, por consequência, a maior limitação à optimização do aproveitamento das potencialidades sociais, económicas e ambientais do importante recurso natural que é a floresta, para além de representar um factor determinante para a propagação dos incêndios.»Nada distingue esta análise da que é referida pelo actual secretário de Estado do Governo PSD/CDS-PP, com uma pequena diferença: o eng. João Soares quer que «as propriedades florestais sejam geridas de forma profissional e activa»; o PS pretende uma gestão activa e profissional!Mas a questão central é que aquela tese é rotundamente falsa e só pode ser erigida em pedra angular de uma política florestal por quem tem culpas no cartório, e sobretudo por quem pretende justificar e desenvolver soluções identificadas com os interesses dos grandes proprietários florestais, e com os grandes grupos industriais que exploram a matéria-prima lenhosa da floresta portuguesa. Ou ainda dos que vêem as potencialidades e possibilidades de especulação imobiliária nas áreas de floresta localizadas junto dos aglomerados urbanos. Dos que pretendem intencionalmente contrapor como antagónicas a fragmentação da propriedade florestal em pequenas e médias dimensões à boa gestão e ao ordenamento florestal.Sublinhe-se, tanto quanto se sabe, a grande propriedade florestal, mesmo de áreas contíguas, do País em geral e do Norte e Centro em particular, não é propriamente sinónimo de boa gestão e ordenamento, e não tem sido mais poupada que as pequenas à praga dos incêndios. E tal sem ignorar que, sendo verdade apenas 1% das explorações ter cem ou mais hectares, contudo a concentração da superfície florestal nas grandes explorações é notória, dispondo 1% das explorações de 55% da superfície florestal total (Estudo do Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa).Porque arderam extensas áreas de montados de sobro no Verão, na área da grande propriedade alentejana e ribatejana? Para não falar de algumas áreas geridas pelas celuloses!Porquê significativas e extensas áreas de floresta (dimensões de milhares de hectares) onde o Estado tem particulares responsabilidades, como nas já citadas áreas baldias ou nas matas nacionais (ardeu este ano 20-25% do Pinhal de Leiria), ou nas áreas protegidas (parques naturais, por exemplo S. Mamede e Peneda-Gerês) o flagelo dos fogos tem igual e fortemente assolado, se não neste Verão, claramente em anos anteriores?O argumento da pequena propriedade é falso, e só pode pretender esconder incompetências, incapacidades e erros de sucessivas políticas. E, fundamentalmente, para justificar soluções adequadas aos interesses do grande capital. As soluções do Governo PSD/CDS-PP têm apenas um mérito: são coerentes com as análises efectuadasA responsabilidade é da pequena propriedade florestal, da estrutura minifundiária? Abata-se a pequena propriedade. A responsabilidade é do pequeno proprietário florestal? Exproprie-se o pequeno proprietário florestal. A culpa é dos compartes dos baldios? Extingam-se os seus direitos seculares – o uso, posse e fruição das terras baldias – e entregue-se a sua gestão aos privados. A culpa é do mau funcionamento dos serviços florestais do Estado? Privatizem-se esses serviços e entreguem-se as suas missões, atribuições e competências a empresas privadas.«Privatizem-se» a pequena propriedade privada e as terras baldias a favor de quem as saiba gerir de forma activa e profissional: os privados que têm dimensão e são capazes de uma «gestão profissional activa», os que são capazes de viabilizar economicamente a floresta portuguesa. Os que produzirão a matéria-prima lenhosa de que as indústrias da fileira necessitam.Para isso, contem com os dinheiros públicos e a força coerciva do Estado.Dinheiros dos contribuintes, tais como o imposto sobre os combustíveis, os fundos comunitários e nacionais, as receitas que cabem ao Estado da gestão dos baldios, as receitas dos instrumentos fiscais criados para a «penalização do fraccionamento e do abandono da propriedade florestal»! A força coerciva do Estado para elaborar e fazer aplicar «os instrumentos regulamentares e fiscais que se mostrarem adequados», por exemplo «preparação expedita de processos de expropriação de espaços», para «induzir e fomentar de forma enérgica» um «processo de reestruturação fundiária das explorações florestais». Não haja dúvidas, o sr. secretário de Estado das Florestas o disse, e mais que uma vez: «(...) é preciso ter a coragem de admitir que muitos dos actuais proprietários florestais terão de abdicar de sê-lo ou, no mínimo, terão de passar a terceiros a gestão dos seus espaços silvícolas». (Expresso, 18 de Outubro de 2003, Intervenção em Seminário da CNA na Guarda).As soluções avançadas pelo Governo PSD/CDS-PP são à medida dos grandes interesses económicos ligados à floresta e até do capital financeiro.As medidas agora propostas pelo Governo não são propriamente nenhuma novidade. Elas tinham sido avançadas pelo grande capital da fileira num Estudo independente(?!) preparado para a Portucel, Sonae, Soporcel e CAP pelo BPI, AGRO.GES e JAAKKO POYRY, de Novembro de 1996, onde, na avaliação das «insuficiências da produção florestal», surgem como questões essenciais «uma insuficiente ocupação de solos com vocação florestal; uma estrutura da propriedade inadequada (...)».Mais recentemente, a Associação das Indústrias de Madeira e Mobiliário de Portugal (AIMMP)recordou, em Agosto último, em carta dirigida ao primeiro-ministro, o documento entregue a Durão Barroso durante o período eleitoral «Fileira Florestal – Proposta de Intervenção Urgente», e subscrito pela referida AIMMP e pelas suas congéneres das subfileiras da cortiça (APCOR) e da papeleira/celulose (CELPA). Documento onde diz o mesmo que o Estudo acima referido e as teses do secretário de Estado das Florestas.Podemos assim dizer que a dita Resolução do Conselho de Ministros é também o cumprimento de uma promessa eleitoral. Um cumprimento tardio, mas os incêndios só foram no Verão de 2003... Outra visão, outros caminhos para a floresta portuguesa – as respostas do PCPÉ com autoridade política de uma continuada, coerente e rigorosa intervenção e proposta sobre a matéria, e feita não ao ritmo do impacto mediático dos fogos florestais, que o PCP critica e contesta a falsificação e os eixos centrais das propostas do Governo, mesmo que se avaliem positivamente alguns dos seus aspectos, que, no essencial, pretendem afastar pequenos proprietários e produtores e compartes dos baldios da intervenção e exploração das suas áreas florestais, despovoando ainda mais os espaços florestais, substituindo-os, através de uma política de concentração da propriedade nas mãos de grandes empresas florestais e das celuloses.Continuamos a insistir como questões estruturantes e centrais:– A aplicação da Lei de Bases da Política Florestal e o consequente Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa para a concretização do necessário e inadiável ordenamento da floresta e áreas florestais do País, com uma forte participação dos proprietários e compartes, e no respeito pelas soluções constitucionais do associativismo e do emparcelamento para os problemas da pequena propriedade florestal. – Uma única Autoridade Florestal Nacional (cujas atribuições eram assumidas pela Direcção-Geral das Florestas, hoje baptizada Direcção-Geral dos Recursos Florestais), mas dotada dos meios financeiros, humanos e capacidades técnicas que lhe permita cumprir as suas missões e funções. – Disponibilização de meios técnicos e financeiros para as medidas de redução do material combustível da floresta, sobretudo o que resulta da não limpeza das matas e do subproduto dos cortes. – Na área do combate, importa complementar o heróico esforço dos bombeiros voluntários com a participação efectiva de técnicos florestais e corpos profissionais especializados no combate aos fogos florestais, colocados com o respectivo material nos pontos mais sensíveis e de risco da floresta. Refira-se que as dotações do Orçamento do Estado para 2004 do Ministério da Administração Interna para alguns destes objectivos não correspondem ao discurso governamental sobre o reforço dos meios para o combate.

Sobre os incêndios florestais e a anunciada política florestal do Governo
Declaração de Agostinho Lopes, da Comissão Política do PCP

3 Dezembro 2003

in http://otempodascerejas2.blogspot.pt/2016/08/a-nossa-sina.html

domingo, 16 de outubro de 2016

Raposa morre após ser torturada durante dias por armadilha




Como é possível continuar a usar-se peles de animais sabendo da tortura, sofrimento e crueldades a que foram sujeitos?
Pobres animais! Jamais pararei a luta para os defender. Jamais.
Malditos humanos que isto causam, em nome da vaidade, da futilidade e das suas vidinhas tão ocas e tão insensíveis a quem sofre!
Neste caso, uma raposinha, mas há tantos e tantos mais!... Por favor, partilhem esta notícia! Mostrem mais uma das monstruosidades perpetradas por humanos contra estes seres indefesos.



Raposa morre após ser torturada durante dias por armadilha

14 de outubro de 2016 às 6:40
Redação ANDA – Agência de Notícias de Direitos Animais
Fotos: Reprodução/SWNS

Estas imagens terríveis mostram a morte de uma raposa aterrorizada por uma armadilha. O dispositivo medieval aprisionou a raposa indefesa com seus dentes de metal brutais. Gatos, cães ou até mesmo uma criança poderiam facilmente ter sido vítimas dessa armadilha bárbara usada de forma indiscriminada.
As armadilhas dentadas foram proibidas na década de 1950, mas ainda são mantidas por sádicos que querem infligir dor e sofrimento a animais inocentes. A raposa capturada por sua perna dianteira direita estava tão ferida que teve sua morte induzida em East End, em Londres (Inglaterra).

O dispositivo foi colocado em Tower Hamlets e ainda estava firmemente preso em torno do pé do animal quando a RSPCA chegou ao local. Depois de divulgar fotografias da perna mutilada da raposa, o grupo descreveu a cena comovente.
“Sua perna estava completamente presa no meio e totalmente mutilada. Estava claro que o sofrimento era extremo. Não sabemos quanto tempo ela ficou assim. Não podemos descartar que pode ter sido até por uma semana. Seja qual for o caso, ela estava naquele estado terrível há muito tempo”, declarou Susan Naish, integrante da organização de bem-estar animal.
 A RSPCA está investigando o incidente e tentando descobrir o responsável pelo dispositivo, informou o Express.

As armadilhas Gin, que já foram muito utilizadas no campo para controlar parasitas, foram finalmente proibidas em 1958 e qualquer captura de animais selvagens com os dispositivos pode resultar em até seis meses de prisão e uma multa de £ 20 mil.
“Estas armadilhas são ilegais por uma razão. Eles são brutais e causam muito sofrimento. É absolutamente repugnante que elas sejam usadas em nossa época. Elas não são projetadas para matar, mas para prender o animal até que o criminoso lide com a vítima”, afirmou Naish.

Nota da Redação: A vida de uma raposa indefesa foi encerrada de maneira cruel porque um assassino montou um dispositivo implacável e doloroso.  Armadilhas são métodos de tortura  arcaicos e brutais que deveriam ser proibidos em todo o mundo e restringir apenas o uso de algumas delas não evita a captura, os ferimentos e as mortes dos inúmeros animais vítimas desse horror. Este caso deveria inspirar a justiça a lutar pelo fim de todas as armadilhas e, assim, pela
vida de todas as espécies.

segunda-feira, 26 de setembro de 2016

Por uma sociedade decente


Muito Bom.
Indispensável ler.

O submundo da tauromaquia

A imagem da tal “identidade nacional” de um Portugal pequenino, que ainda persiste, com o aval de legisladores portugueses que sofrem de cegueira mental



Já tudo foi dito sobre a tauromaquia.
 
Esgotaram-se todas as palavras para definir esta “coisa” a que teimam em chamar “arte” e “cultura” e “identidade nacional”, que deve manter-se por ser tradição.
 
Ora, arte até pode ser, sim, a “arte” covarde de torturar Touros e Cavalos com requintes de malvadez, numa luta absolutamente desigual, onde a covardia do torturador contrasta com a heroicidade do animal, previamente enfraquecido, o qual, ainda assim, luta valorosamente pela sua vida, enquanto é cruelmente flagelado física e psicologicamente, até à extrema exaustão, quando finalmente desiste de viver, e o torturador aproveita para vangloriar-se, levantando os braços, triunfante, como se fosse ele o herói, numa cena sinistra e patética.
 
Será a tauromaquia cultura?
 
Na Universidade aprendi que Cultura é o resultado da acção positiva do Homem sobre a Natureza; é a actividade preparatória que conduz o espírito do Homem a produzir frutos; é a realização de valores espirituais; é o conjunto orgânico dos valores expressos pela actividade intelectual do Homem na sua faceta construtiva.
 
Cultura é posse espiritual; é conquista interior; é a grandeza moral do Homem irradiada no seu agir construtivo; é a capacidade de escolher entre o saber e a erudição, e de ser capaz de utilizar positivamente esse saber.
 
A Cultura produz valores; é o conhecimento elaborado; é a assimilação do saber pela inteligência. Como formação, Cultura é a agilidade do espírito; é capacidade de síntese, de apreciar, de criticar e seleccionar os valores que nos são apresentados.
 
Cultura é, em suma, a atitude positiva do Homem em relação ao mundo.
 
Enquadrar-se-á a tauromaquia neste conjunto de significações de Cultura?
 
Quanto à tradição, só é válido manter uma tradição quando esta dignifica a Humanidade e está conforme a atitude positiva do Homem em relação ao mundo. Estará a tauromaquia dentro deste parâmetro?
 
Dalai Lama diz o seguinte: «A vida é tão preciosa para uma criatura muda quanto é para o Homem. Assim como ele busca a felicidade e teme a dor, assim como ele quer viver e não morrer, todas as outras criaturas anseiam o mesmo». E isto é tão verdade que basta conviver com qualquer animal, qualquer um que seja, para aferirmos esta certeza.
 
Então por que hão-de os tauricidas achar-se no direito de torturar Touros e Cavalos para se divertirem e ganharem dinheiro à custa desta tortura?
 
Nazaré Oliveira, uma abolicionista activista, no seu excelente Blog denominado Suricatina, escreveu um artigo intitulado «A Internet = arma contra as ditaduras», que podem ver neste link:
 
 
Neste artigo, Nazaré Oliveira aborda a informação global e refere: «Não há desculpa para o que desculpa nunca terá: a cumplicidade com os usurpadores do poder e para com a barbárie».
 
E não há mesmo.
 
Sabemos que a tauromaquia é uma prática cruel, que não tem lugar no mundo moderno, e as pessoas que ainda teimam em dirigir-se a uma arena para aplaudir esta barbárie e aquelas que a praticam, não têm desculpa alguma para dizerem «eu não sabia», quando se toca na questão da dor e do sofrimento dos animais.
 
Também não há razão para que os governantes sejam cúmplices desta barbárie.
 
Está tudo escrito e dito e falado e gritado na Internet. Só não sabe quem não quer ou quem é analfabeto ou não tem capacidade intelectual para compreender as palavras que se escrevem e se gritam.
 
No Facebook, esta matéria é tratada por um grupo de cidadãos portugueses, que, não sendo jornalistas, não têm obrigação de informar formando as pessoas, mas fazem-no, por se sentirem insultados na sua humanidade, pela prática subhumana da tauromaquia, fazendo aquilo que os órgãos de comunicação social deveriam fazer, e não fazem. (E até podemos imaginar porquê)!
Foi no Facebook que encontrei um texto magnífico da autoria de Luís Martins que, em poucas palavras, nos conduz ao submundo da tauromaquia.
 Escreveu ele:
 «Os aficionados tentam de formas cada vez mais desesperadas, tornar a defesa da tauromaquia num reduto inexpugnável. Sabem perfeitamente que não há argumento algum que possa justificar a tortura e o sofrimento de seres vivos sencientes, e isso assusta-os.
 Primeiro tentaram de todas as formas colar a tourada à tradição, julgando ser esse o tal argumento que lhes iria proporcionar segurança no seu mórbido reduto. Enganaram-se! Agora, depois de terem comprado a dignidade da Canavilhas, afirmam que o Estado Português considera a tourada como uma forma de Arte, e que a Arte é indiscutível. Segundo os torcionários é apenas uma questão de gosto... ou se gosta ou não!!!

Não é preciso muito esforço para desmontar tão débil argumentação. Em primeiro lugar, o Estado é o Povo, e é patente a condenação do Povo Português a essa forma legalizada de tortura em que consiste a tourada.
 
No último inquérito conhecido, 71% dos portugueses manifestou-se contra a tourada! Mais expressividade que isto? O facto da tauromaquia ter conquistado um lugar na Secretaria da Cultura, mais não torna evidente, que os poderes obscuros dos seus defensores, que conseguiram comprar a dignidade de Canavilhas. E fosse ou não a tourada, uma forma de arte!
 
Justifica tal designação o uso da tortura? Quantas formas de violência foram já consideradas formas de arte? Os espectáculos com gladiadores foram durante centenas de anos, considerados formas de arte. Os vestígios que chegam até nós são muitos e variados, como se pode ver pelas fotos.
 
Deveremos exigir a reposição de tais espectáculos?
 
Ou devemos concluir que a designação de forma de arte, em espectáculos que promovem a violência, em vez de classificar o espectáculo, desqualifica quem a faz?
 
Bem podem os torcionários continuar a buscar nas suas mentes reduzidas e limitadas, justificações que só existem nos seus delírios. Essa argumentação caduca só nos ajuda, pela ignorância que traduz, pelo desconforto que revela. Em vão tentam recrutar mais apoiantes para as suas empobrecidas hostes. Não é de certeza com argumentos tão ridículos
 
O que será necessário dizer mais?
 
Ah! Sim! Falta falar nos subsídios que a tauromaquia recebe para poder manter-se neste país, onde não há dinheiro para o que faz falta, mas para torturar Touros e Cavalos há sempre dinheiros públicos.
 
Isto não será insultar o Povo Português? 
 
E aquela iniciativa caricata, de alguns municípios (Barrancos, Sabugal, Vila Franca de Xira) terem elevado a tauromaquia a Património Cultural Imaterial? O que será isso? Uma anedota de mau gosto?
 
Talvez, mas é também o Portugal pequenino, no seu pior.
 
 
 
 
Isabel A. Ferreira in http://arcodealmedina.blogs.sapo.pt/95384.html  11 DE ABRIL DE 2012


quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Contra burkas e burkinis




Contra burkas e burkinis, pela liberdade e igualdade de género


Somos não só frontalmente contra o uso da burka e do burkini (e símbolos equivalentes), como achamos que pode haver fundamentos para tal proibição.

 A discussão sobre a proibição do uso do burkini por algumas autarquias francesas levou a um aceso debate, algo enviesado por ambas as partes. Se o argumento securitário subjacente ao medo do terrorismo pode não se aplicar ao burkini, pelo menos do ponto de vista objetivo (algo que pode ser diferente do ponto de vista subjetivo…), também a liberdade da mulher de vestir o que bem lhe aprouver não é o cerne da questão. Para nós, é irrelevante que se trate de burka, burkini, niqab ou chador porque o que nos move não é o temor de possíveis atentados islâmicos, nem tão pouco a suposta castração da liberdade (religiosa) das mulheres de se vestirem como desejarem. Com efeito, o que pretendemos defender, assertivamente, é a liberdade e a igualdade de género; e, por essa via, defender um dos elementos-chave do núcleo duro das nossas sociedades liberais e democráticas: os direitos humanos fundamentais, nomeadamente o direito à igualdade (e à liberdade) de género. E, por isso, somos não só frontalmente contra o uso da burka e do burkini (e símbolos equivalentes), em espaços públicos das nossas sociedades democráticas, como achamos que pode haver fundamentos histórico-políticos e, acessoriamente, jurídico-constitucionais para tal proibição, mesma que fira a liberdade religiosa.

A nossa perspetiva contra o uso da burka e do burkini assenta em três eixos fundamentais. Primeiro, na necessidade de defendermos os direitos humanos fundamentais, nomeadamente o direito à igualdade de género, como núcleo duro das nossas sociedades liberais e democráticas desde o alvor do liberalismo político (Revoluções Americana, 1776, e Francesa, 1789), mais tarde atualizado pelo democratismo, pelo republicanismo e pela social democracia.  O mínimo ético irredutível estabelecido pela Declaração Universal dos Direitos do Homem postula no seu artigo 1º que “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência”, confirmando a ideia de que os direitos humanos decorrem da dignidade humana, como um valor ínsito ao homem, exatamente por esta sua condição de racionalidade. Os direitos humanos nas sociedades liberais e democráticas são direitos inalienáveis dos indivíduos, ou seja, tem uma raiz individualista e não coletivista (como nas visões marxistas de tipo soviético) ou comunitarista (como nas visões multiculturalistas). Portanto, sendo nas nossas sociedades liberais e democráticas os direitos humanos uma proteção dos indivíduos contra a arbitrariedade do poder, não podem os mesmos ser usurpados nem pelo governo do dia, nem pela pertença a determinadas comunidades: às mulheres muçulmanas não pode ser subtraído o direito à liberdade e à igualdade de género só porque pertencerem a uma comunidade étnico-religiosa que não se revê nesse axioma.

Em segundo lugar, do nosso ponto de vista o que está aqui em causa não é a suposta liberdade da mulher de vestir o que bem lhe aprouver.  Achamos aliás que seriam patéticas, se não fossem trágicas, as comparações (que por aí pululam, nas redes sociais, na imprensa, etc.) comparando a proibição do burkini com uma eventual proibição da utilização de leggies, fatos de mergulhador, de motard, indumentárias de freira, etc. Por um lado, porque não estamos a falar de membros do clero muçulmano, mas sim de cidadãs em geral. Por outro lado, porque o burkini é um símbolo de menorização e subalternização das mulheres que fere ostensivamente os nossos princípios da liberdade e igualdade de género. Alguém já viu algum homem muçulmano com esta indumentária? Sobre este assunto vale a pena citar as palavras de uma voz dissonante na comunidade muçulmana, Kamel Daoud, que escreveu em 14/2/2016 um interessantíssimo artigo para o New York Times sobre “A miséria sexual no mundo árabe”: “O sexo é um completo tabu em países como a Argélia, a Tunísia, a Síria ou o Iémen, devido a um ambiente conservador associado a uma cultura patriarcal (…). Em alguns países é-lhes (às mulheres, leia-se) permitido o acesso ao espaço público apenas se renunciarem aos seus corpos pois deixá-las ir descobertas seria revelar o desejo que o islamita, o conservador e o jovem fanatizado querem negar. As mulheres são vistas como uma fonte de destabilização”. Também a organização de mulheres muçulmanas "Women Without Veils” publicou uma declaração, no Dia Internacional da Mulher, intitulada “O véu negador da liberdade e da igualdade" na qual declarava que "Nós nos recusamos a usar o véu, pois representa uma violência simbólica visível num espaço público... os islamitas estão formalizando a desigualdade entre os sexos no contexto familiar e social em detrimento dos valores fundamentais da República”. Por isso as comparações citadas são perversamente míopes porque enformadas por uma visão assente numa (suposta) liberdade ahistórica e apolítica das mulheres muçulmanas.

Claro que as comunidades muçulmanas não são homogéneas e mesmo do ponto de vista do grau de conservadorismo e patriarcalismo há uma significativa diversidade. Basta pensar, do lado mais liberal e secularizado, na comunidade ismaelita, onde as mulheres andam geralmente sem quaisquer véus. Todavia, também sabemos que o recrudescimento do uso destes símbolos ultraconservadores e das orientações e práticas que lhes estão associadas, nos tempos mais recentes, está ligado à crescente influência de duas das mais conservadoras correntes do islamismo, o wahbismo e o salafismo (ver Yasmin Alibhai-Brown, Refusing the Veil, Biteback, 2014).

Relativamente ao pressuposto de que há uma decisão livre e autónoma destas mulheres no uso destes símbolos, gostaríamos de sublinhar que tal é algo que está por demonstrar (e que será, tendo em conta os dados que conhecemos sobre esses grupos sociais, algo residual, na melhor das hipóteses). Com efeito, o exercício da plena liberdade pressupõe autonomia no processo de deliberação face às escolhas individuais, mas os últimos dados referentes à liberdade das mulheres e o “Global Gender Gap Index 2015” revelam um recuo, nos últimos 10 anos, das liberdades das mulheres e um agravamento do hiato entre homens e mulheres nos países muçulmanos, encontrando-se a Arábia Saudita, Oman, Egipto, Mali, Líbano, Marrocos, Jordânia, Irão, Chad, Síria, Paquistão e Iémen no fundo da tabela.

É verdade que pode haver aqui um conflito entre valores fundamentais das nossas sociedades demoliberais, nomeadamente entre o direito à liberdade religiosa, por um lado, e os direitos à liberdade e igualdade de género, por outro. Logo, impõe-se uma escolha que é sobretudo do domínio da política e não tanto do foro jurídico. Do nosso ponto de vista, do que se trata é, num contexto em que é preciso optar e afirmar como queremos viver nas nossas sociedades democráticas e liberais, de defender os nossos valores matriciais da liberdade e da igualdade de género mesmo que tal implique comprimir a liberdade de uma determinada religião que, pelo menos em determinadas leituras, os põe claramente em causa. E estão enganados aqueles que acham não se podem produzir determinadas normas que visam apenas certas comunidades: basta pensar que, num contexto de plena liberdade e pluralismo partidários, determinadas sociedades proíbem os partidos fascistas e/ou nazis. É que acima do direito está a história e a política, ou seja, a consolidação do direito à liberdade e igualdade de género traduz um conjunto de lutas sociais e políticas, nas nossas sociedades, que urge defender assertivamente, para não as defraudarmos.

Professor de Ciência Política do ISCTE-IUL


Professora de Relações Internacionais da UBI