Análise ao
sangue capaz de detectar e localizar oito tipos de cancro
Investigadores apresentam um teste não invasivo que usa a informação de
dois biomarcadores: os níveis de proteínas associadas a cancro, bem como a
presença de mutações genéticas no sangue.
Chama-se
CancerSEEK e combina a análise do ADN com a detecção de oito proteínas
associadas a oito tipos de cancros. O novo método é apresentado esta sexta-feira
na revista Science por uma equipa liderada por cientistas da
Faculdade de Medicina da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, nos EUA. O
objectivo deste teste não invasivo, que ainda terá de ser validado para chegar
à prática clínica, é conseguir uma detecção precoce de vários cancros e a um
baixo custo. Para já, foi usado em mais de mil doentes demonstrando uma
sensibilidade que varia entre os 69 e 98%, dependendo do tipo de cancro.
Uma
rápida pesquisa na internet leva-nos a várias notícias sobre projectos de
investigação que procuram detectar o cancro (vários tipos de cancro) através de
uma simples análise ao sangue. Uma equipa de investigadores apresenta agora o
CancerSEEK que representa mais um avanço neste caminho para uma detecção simples
(não invasiva) e precoce de cancro. “Há vários elementos novos no nosso
estudo”, esclarece ao PÚBLICO Nickolas Papapdopoulos, autor principal do artigo
e professor de oncologia e patologia no Centro de Cancro Kimmel na Universidade
de Johns Hopkins.
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Assim,
enumera o cientista, este é “um teste único, não invasivo, multi-analítico que
avalia simultaneamente os níveis de oito proteínas de cancro e a presença de
mutações genéticas associadas a cancro no sangue”.
A lista
dos novos ingredientes deste método de diagnóstico não pára por aqui. “Este
teste usa um pequeno mas robusto painel [de biomarcadores] para detectar
mutações de genes associadas a cancro. Este pequeno painel é essencial para
minimizar o número de falsos positivos e manter o teste acessível”, nota
Nickolas Papapdopoulos, que acrescenta ainda que o CancerSEEK “determina com
precisão a localização de um tumor, usando esta informação de várias fontes,
ultrapassando a limitação actual dos testes existentes de biópsias líquidas”.
Por fim, justifica que a abordagem multi-analítica usada foi essencial para
desenvolver um teste de triagem com uma sensibilidade adequada, já que cada um
dos marcadores não é suficiente, por si só, para detectar cancro.
Falta “refinar o
teste”
O
CancerSEEK foi testado em mais de mil doentes e para oito tipos de cancro:
ovário, fígado, estômago, pâncreas, esófago, colorrectal, pulmão e mama. Além
das oito proteínas para cada tipo de cancro, o painel de biomarcadores
apoiou-se na detecção de mutações em 16 genes. Em alguns casos, o teste também
deu informações sobre o tecido de origem do cancro. Os doentes envolvidos nesta
investigação, já tinham sido diagnosticados com cancro pré-metastático com base
nos sintomas da doença.
No
artigo científico, os investigadores apresentam uma estimativa de custo deste
teste de sangue para os oito tipos de cancro que, dizem, pode ficar abaixo dos
500 dólares (408 euros). Porém, estamos apenas a falar de uma estimativa a
confirmar-se no futuro. “Para realmente estabelecer a utilidade clínica do
CancerSEEK e demonstrar que pode salvar vidas, serão necessários estudos
prospectivos de todos os tipos de cancro e numa grande população”, avisa
Nickolas Papapdopoulos, que sublinha ainda que é necessário “explorar ainda
mais a especificidade e sensibilidade num cenário de triagem mais realista e
refinar o teste”.
O
cientista antecipa ainda que outros biomarcadores para o cancro podem ser
combinados para aumentar a sensibilidade e precisão do teste. “O nosso estudo
estabelece o fundamento conceptual e prático para um exame de sangue único e
multi-analítico para muitos tipos de cancro”, resume, frisando que existe ainda
um longo caminho a percorrer até ao dia em que poderá ser comercializado.
Na
opinião de José Luís Costa, investigador no Instituto de Investigação e
Inovação em Saúde (i3S), no Porto, e professor do Departamento de Patologia e
Oncologia da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, este trabalho (no
qual não participou) “abre as portas para num futuro próximo se começar a
pensar em detecção precoce de cancro”. Um assunto que, avisa, é “discutível do
ponto de vista clínico”. “Estes investigadores do Johns Hopkins têm-nos
habituado a trazer assuntos bastante relevantes, fazendo com que novos
conceitos e possibilidades façam com que todo o campo de investigação dê passos
em frente”, refere o cientista que actualmente se dedica à investigação de
métodos menos invasivos para a detecção de cancro, como é o caso das biópsias
líquidas que têm estado numa das frentes de investigação mais activas.
“A
utilização do sangue periférico para identificar mutações tumorais com impacto
clínico, isto é, com informação importante para a escolha terapêutica, tem sido
introduzido na rotina oncológica nos últimos tempos. Aliás, nós no Ipatimup
[Instituto de Patologia e Imunologia Molecular da Universidade do Porto que faz
parte do i3S] fazemos estes estudos há alguns anos com resultados muito
positivos”, constata José Luís Costa.
Mas,
confirma o cientista português, neste novo estudo há um avanço importante. “O
que estes investigadores acrescentam com este estudo é trazerem uma camada
adicional de informação obtida através da biopsia líquida. Além de
identificarem mutações clinicamente relevantes, conseguem através da
identificação de proteínas específicas identificar qual o órgão onde se
encontra o tumor.” E, citando Bert Vogelstein, que é um dos autores do estudo e
que o cientista português ouviu recentemente numa conferência científica,
sintetiza que este estudo é mais um passo “para ligar a medicina de precisão
com o rastreio e a prevenção, de modo a interceptar o cancro em estadios mais
precoces e a maximizar as hipóteses de cura.”
19 de
Janeiro de 2018, jornal PÚBLICO
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revista "Science"