O dr. José
Manuel Durão Barroso vai ser presidente da Goldman Sachs International. É o
culminar de uma linda carreira, iniciada nos bancos da universidade, onde
abraçou a causa maoísta do MRPP, para não muito tempo depois aplicar tais
ensinamentos à social-democracia, para onde se mudou de armas e bagagens,
chegando a líder do PSD, primeiro-ministro acidental, a que se seguiu uma
“tocata e fuga” para presidente da Comissão Europeia. Agora chega o
reconhecimento da mais poderosa entidade financeira mundial. É obra!
Durão
Barroso é um exemplo para a juventude portuguesa. Soube perceber que nunca
chegaria a líder do MRPP, onde pontificavam Arnaldo Matos e Saldanha Sanches.
Mudou-se para o PSD, onde as lideranças mudavam com uma rapidez extraordinária.
Viu o então líder Marcelo Rebelo de Sousa demitir-se ao fim de três anos, por
ter sido traído pelo seu aliado da altura, Paulo Portas, e avançou para a
liderança dos sociais-democratas. Analistas e comentadores garantiram inúmeras
vezes que Durão Barroso nunca chegaria a primeiro-ministro. Mas na sequência de
umas eleições autárquicas, o então primeiro-ministro, António Guterres,
demitiu-se, o PS viu-se envolvido no escândalo da Casa Pia e Barroso chegou a
São Bento. Governou dois anos, organizou a cimeira dos Açores, onde estiveram
Bush, Blair e Aznar e que serviu para o presidente norte-americano obter os
apoios internacionais de que necessitava para invadir o Iraque. Como prémio,
Barroso foi convidado para presidir à Comissão Europeia, onde se manteve
durante dez anos.
Durante esse
período, a Europa sofreu o embate da crise financeira mundial, que nasceu nos
Estados Unidos, e assistiu à crise das dívidas soberanas e do euro. Foram dez
anos em que a Comissão deixou de ser o epicentro da construção europeia, perdeu
claramente poder para o eixo Berlim-Paris, primeiro, e depois para Berlim e
para o Conselho Europeu, deixou de ser o defensor dos interesses dos pequenos
países no processo de integração, não conseguiu responder de forma célere à
crise grega, que depois se propagou à Irlanda e aos países mediterrânicos,
submeteu-se ao ritmo e aos ditames de Angela Merkel – mas conseguiu aquilo que
almejava: ser eleito para um segundo mandato à frente da Comissão, coisa que
antes só um francês (Delors) e um alemão tinham logrado.
Saiu com um
lindo discurso no Parlamento Europeu em várias línguas. Depois, ficou à espera
que o fossem buscar num andor para se candidatar à Presidência da República
Portuguesa. Mas ninguém foi. E as sondagens também iam mostrando que o povo
português não o amava. Injustamente, claro, pois não só o criticavam por ter
deixado o seu mandato a meio, como por não ter defendido suficientemente o país
durante o período de ajustamento.
O dr.
Barroso ficou então de pousio, a dar umas conferências e umas aulas numa
universidade americana. Mas uma pessoa com tanto valor e experiência nunca
ficaria muito tempo no desemprego. E surge agora esta maravilhosa oportunidade
para liderar a parte internacional da Goldman Sachs, por acaso exatamente a
mesma empresa que foi acusada de ajudar a Grécia a maquilhar as suas contas
públicas para enganar a Comissão quando o dr. Barroso estava à frente da dita.
Mas o que interessa isso? Já lá vai…
O que conta
é que o dr. Barroso é o político português com a mais fulgurante carreira
internacional e um exemplo para todos os emigrantes: com esforço e dedicação e
os amigos certos tudo se consegue na vida. Que não seja muito apreciado por cá
releva apenas da tradicional inveja do povo português. Os outros, entre os
quais me incluo, esperam muito desta nova fase profissional do dr. Barroso.
Sobretudo do ponto de vista ético.
(Nicolau
Santos, in Expresso Diário, 08/07/2016)