segunda-feira, 27 de julho de 2015

Como é que se esquece alguém que se ama?




Como é que se esquece alguém que se ama?


Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver?
Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar?
Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar.
As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar.
Sim, mas como se faz?
Como se esquece?
Devagar.
É preciso esquecer devagar.
Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre.
Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente.
Elas não saem de lá.
Estúpidas! É preciso aguentar.
Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar.
A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente.
É preciso paciência.
O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada.
Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração.
Ninguém aguenta estar triste.
Ninguém aguenta estar sozinho.
Tomam-se conselhos e comprimidos.
Procuram-se escapes e alternativas.
Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se.
Não se pode esquecer alguém antes de terminar de lembrá-lo.
Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma.
A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada.
É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar.

É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo.

É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução.
Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si, isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução.

 Não adianta fugir com o rabo à seringa.
Muitas vezes nem há seringa.
Nem injecção.
Nem remédio.
Nem conhecimento certo da doença de que se padece.
Muitas vezes só existe a agulha.

 Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar.

Fica tudo à nossa espera.

Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.

 O esquecimento não tem arte.

Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar.

Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.



Texto de Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume'.

Foto minha.

O governo de Portugal prepara-se para PAGAR mais 53 milhões de euros aos colégios privados!

 Clicar nos gráficos para ampliar



Gráficos por mim selecionados in http://e-publica.pt/index.html - Revista Eletrónica de Direito Público





Dizem as notícias que o governo de Portugal se prepara para PAGAR mais 53 milhões de euros aos colégios privados, em cima dos milhões que já esbanja, para que criem mais de 600 turmas, em cima das que já existem, destinadas a acolher alunos do sistema de educação pública. O senhor ministro Crato é um homem generoso e de bem, visivelmente preocupado com o futuro dos jovens portugueses, os seus dotes para a equitação e outras práticas de bom-tom almejadas pela generalidade das famílias.
Acrescentam as notícias que muitas dessas turmas funcionarão em estabelecimentos privados vizinhos de escolas públicas, as quais ficarão cada vez mais vazias de professores e estarão desde já condenadas a um presente penoso e a um futuro sem futuro.
Quem quer educação que a pague, é o lema do governo e do seu ministro das escolas privadas. Embora o pagamento, eventualmente, não seja suportado na íntegra pelos pais, sê-lo-á, em última análise, pelos contribuintes, sujeitos a uma carga fiscal criminosa para que se desenvolvam processos de engorda do sector privado, onde nem sequer está assegurada a qualidade da educação. Porque a parte formada por meia dúzia de instituições com nível aceitável, vocacionadas para acolher os filhos da elite financeira e da corrupção, não passa de um ilhéu no meio de um oceano poluído de escolas e escolinhas criadas para viver à custa das tetas do Estado, com a agravante de, em muitos casos, imporem ensino confessional num país que é oficialmente laico.
Esta situação é mais uma pincelada forte no retrato degradante do PORTUGAL dos tempos que correm. O governo em exercício, como parte de um dito “arco da governação” temente à senhora Merkel e às hordas financeiras cujos interesses ela manda APLICAR, não descansará enquanto todo o Estado não for privatizado, enquanto os elementares serviços a prestar aos cidadãos não sejam pagos e a bom preço para nutrir as contas dos donos de Portugal bem acondicionadas no estrangeiro, de preferência em paraísos fiscais.
A Constituição da República, no quadro do respeito estrito pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, determina o direito de todos à saúde e à educação. O governo em exercício, atacando ostensivamente a Constituição, vem degradando a saúde a níveis anteriores ao Sistema Nacional de Saúde e, por vias indirectas, vai expulsando das escolas aqueles que são os filhos das famílias – esmagadoramente maioritárias no todo nacional – vítimas da cruel austeridade.
O recurso do governo ao ensino privado não é uma medida supletiva decorrente de circunstâncias existentes e destinada a suprir carências. Nada disso: é uma opção ideológica praticada em prejuízo do Estado e dos contribuintes, em benefício de uma clientela que medra à sombra do sistema corrupto de privatização do país. Enquanto isso, o governo ataca os professores como se fossem párias, obrigando as multidões de desempregados e desempregadas a mendigarem TRABALHO EM escolas privadas, onde serão sujeitos às epidemias da moda desde o trabalho precário ao jogo sinistro da ameaça do despedimento arbitrário e do desemprego. A provar esta opção está o facto escabroso de o governo pagar turmas em colégios privados situados nas imediações das escolas públicas, assim deixando uma dica importante: multipliquem-se escolas privadas, onde quer que seja, porque o Estado não deixará de as abastecer.
Este ano serão mais de 600 novas turmas e mais 53 milhões de euros do nosso DINHEIRO deitados para o lixo. Imaginem quantas turmas serão para o ano e quantos mais milhões serão inutilizados se uma qualquer versão do “arco da governação” for reabastecida com o combustível do voto popular.


José Goulão, in http://mundocaohoje.blogspot.pt/?m=1, 26.07.2015





Outro artigo muito interessante, sobre esta matéria, aqui.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

Um Documentário Bestial (legendado em Inglês)




Um Documentário Bestial

- FESTRÓIA Portugal, 2013
- ANIMAL BEHAVIOR SOCIETY FILM FESTIVAL EUA, 2013
- 14 EXIBIÇÕES NACIONAIS
- 4 EXIBIÇÕES EM ESPANHA
- Além da selecção oficial para os festivais de cinema, exibição ainda nos SHORTCUTZ LISBOA e PORTO, FESTIVAL GRANT´S TRUE TALES, e FESTIVAL NOVAS ARTES ASSOCIADAS (Barcelos)


Sinopse:


Como a quimera e o grifo, o touro é um animal inventado pelos homens. Na Antiguidade, os homens inventaram o touro como um animal mitológico. Nos dias de hoje, o sociólogo inventa o touro como um animal de catarse. O ganadeiro inventa o touro como um animal bravo. E com todas estas invenções, os homens acabaram por inventar o touro como um animal Bestial! E em torno do touro acabariam por inventar uma série de Bestialidades, como o touro não sofre ou a tradição é que manda.

Concebida numa linguagem humorística - além da narração de Adolfo Luxúria Canibal, um conto zen interpretado por Rui Reininho, spots publicitários, legendas e separadores satíricos - e segundo uma lógica conceptual, a narrativa do filme subdivide-se em três partes que permitem problematizar as diferentes bestialidades - científica, ética, legal, religiosa, psicológica e económica - presentes nas Corridas de Touros.

O que diz a ciência sobre o sofrimento do touro? O que nos faz gostar de uma Corrida de Touros? A tradição é um argumento per si? A Igreja concorda com a tauromaquia? As crianças deviam assistir a Corridas de Touros? Poderá HAVER alternativa ao negócio tauromáquico? Não serão estas perguntas anacrónicas quando ainda se torna necessário fazê-las em pleno século XXI? Para estas e muitas outras questões bestiais só mesmo respostas bestialíssimas.

E a mais improvável das respostas é-nos dada pelo protagonista do fenómeno sobre o qual foram inventadas todo o tipo de bestialidades: o touro. Porque ele, afinal, é capaz  da mais bestial das respostas: O Amor.

(não deixem de ler o excelente texto que este realizador escreveu sobre esta temática, aqui publicado a seguir  ao documentário)





Ficha Técnica:

Realização: Nuno Costa
Edição e Montagem: Abel Rosa
Narração: Adolfo Luxúria Canibal e Rui Reininho
Guião: Nuno Costa, Abel Rosa e Carla Pinho
Produção: Sofia Martinho
Animação: César Duarte
Câmaras: Zito Colaço, João Trindade, Abel Rosa, Sandro Costa e Bruno Alves
Sonoplastia: Nuno Andrade
Captação de Som: Hélder Fernandes
Estúdios de Som: Carlos Zíngaro e Fernando Matias (The Pentagon)
Design Gráfico: Hugo Costa e Eduardo Antunes
Banda-Sonora: Hors et Libre (Aura Lee) de Tozé Xavier, Maestro Myguel Santos e Castro com Vox Laci e Jovens Vozes de Lisboa ao vivo no Campo Pequeno (Imagine)
Making of (Photos): Zito Colaço e Helena Colaço Salazar
Agradecimentos: Praça de Touros do Campo Pequeno, Praça de Touros Celestino Graça, FLAG, Rodrigo Duarte, Diogo Peseiro e zZzUmBii (vídeos YouTube)


Um Documentário Bestial (2013):





















DA IMPOSSIBILIDADE DE COMUNICAÇÃO COM O BESTIAL

Vivemos tempos de conflitos, onde o poder, o dinheiro, enfim, manifestações primárias do ego se sobrepõem aos valores inquestionáveis da civilização.

 Dos genocídios de populações indefesas em Gaza e no Tibete até ao sofrimento bárbaro de animais em linhas de produção em massa para consumo alimentar nada de novo na História a não ser uma palavra singela que traduz um estado de atenção interior chamado: CONSCIÊNCIA.

 É um fardo, dos bons, que temos de carregar. É uma albarda impossível de deitar fora. Ela cresce, cresce ao longo das eras e tudo o que podemos fazer é aceitá-la e tornarmo-nos conscientes.

 Ou alienarmo-nos, o que podemos fazer com todo o tipo de distracções e paliativos. Comida, álcool, entretenimento, televisão, telenovelas, reality-shows, sexo, futebol, touradas, drogas, fármacos legais, ou substâncias ilícitas, tudo aquilo que nos inebrie e impeça de sentir e pensar a realidade como um Todo.

 E tudo aquilo que nos afasta de sentir e pensar o sofrimento do outro distancia-nos do Todo. Não importa se possuímos uma Biblioteca de Alexandria em casa, se devorámos 50 mil livros nos últimos quatro anos, se conhecemos a história do jazz de cor e salteado ou se temos orgasmos místicos diante dos quadros do Picasso.

 Pelos vistos, ele também tinha orgasmos místicos diante de uma tourada e daí? A propósito, um estudo recente de psicólogos de Harvard conclui que os nossos jovens são dotados de extrema inteligência e encontram-se muito bem preparados para grandes carreiras profissionais. Contudo, não possuem grande inteligência emocional nem capacidade de cooperação nem espírito de grupo.

 Razão sem coração e coração sem razão serão sempre capacidades deficitárias, apoiadas em muletas, à espera do milagre da união. Mais do que provado que não existem motivos éticos, científicos, humanos e filosóficos para a existência das touradas, tenho verificado que a minoria política que decide em sede parlamentar, e controla os meios de comunicação social, continua refém dos medos clássicos: a necessidade de manutenção de um status quo que as mantenha na rota do poder e do dinheiro. Ego dixit.

 E, esgotados, todos os argumentos racionais e sensíveis, tem sido construído um fait-divers, alimentado por grupos afectos ao CDS, ao PSD e alguns núcleos do PS, de que existe uma clivagem entre o mundo urbano e o mundo rural. Um artefício, uma mentira de diversão, pois a tourada é o pó residual de um antigo culto sacrificial que se mantém de pé apenas em meia dúzia de regiões no planeta. Só que mantém-se de pé pelos mesmos senhores que têm mantido contas abertas entre o BES e o GES, num RIO FORTE de dinheiro pouco transparente que nos some das mãos.

 E, neste contexto, não é que se me esgotem os limites do diálogo e da tolerância. Mas, confesso que tenho dificuldade de conversar com mentirosos e canalhas. Contra Neandertais, é só porque não domino o idioma.

Por isso,tenho constatado que há diálogos impossíveis de travar. São impossibilidades decorrentes da bestialidade do fenómeno. Se é um campo em que o poder e o dinheiro ainda se confundem com o rito e o sacrifício, as pessoas que habitam este universo são um pouco menos pessoas. Não lhes quero mal, nem as respeito menos por isso, mas não sei sinceramente como lidar com bestas destas.

Talvez só se amanse uma besta com Amor. Não sei se é verdade, mas acredito que seja possível. Nesse caso, Um Documentário Bestial foi o meu gesto de Amor para com as bestas remanescentes. Poucas, no que diz respeito a esta matéria, devo dizer.

 Preocupam-me mais os outros. Os que nem acreditam nem gostam de touradas. Os marketeers, os empresários, gestores de produto, os assessores de imprensa, os que, maquiavelicamente, se aproveitam das bestas. Mas o que será um ser que manipula uma Besta?

 Diabólico? Demoníaco? Não, recuso-me a acreditar em folclore. Isto é Baphomet a mais. Acho que uma sessão de terapia seria suficiente. E, afinal, descobririam o elementar: existe em Portugal melhor colocação de produto do que indústria das touradas. Teatro, bailado, séries, cinema? Convergência crescente com as novas plataformas?

 Dito (tudo) isto, o capítulo das touradas, encerrou para mim pelo menos como voz tão activa. O filme continua disponível. Até que as bestas despertem. No mínimo, como seres humanos.

 Realizador
 Nuno Costa