Talvez seja da data ou da hesitação entre estações que marcou o primeiro domingo de Outubro e segundo do Outono. Mas os protagonistas dos discursos políticos do dia, nas comemorações de mais um aniversário da República (o 104.º) ou fora delas, pareceram andar à roda do mesmo ponto sem se aproximarem demasiado dele. O Livre, no I Congresso, anda à procura de “abertura”, Costa de um “ponto de equilíbrio”, Cavaco de uma “cultura de compromisso” que tarda. Tudo isto supõe diálogo, hipotéticas alianças entre políticos. Tudo isto pressupõe um sistema partidário minimamente saudável e credível. Mas, ouvindo o Presidente da República, ficamos a saber que tal sistema corre “o risco de implosão”. Porque não é satisfatório, porque não concilia os portugueses com a democracia, porque há promessas incumpridas que deixam marcas, porque há falta de confiança nas instituições. Isto é o que diz quem preside, há quase dez anos, ao regime que abriga tal sistema partidário. Não se pense, no entanto, que as palavras de Cavaco Silva contêm um lastro de autocrítica: o discurso que ele faz é para quem não se apazigua quando ele sugere, para quem rompe acordos quando ele dita que se façam, para quem segue caminhos que atrapalham o seu. Isso não impede que os seus alertas, réplicas de outros anteriores, façam sentido. Mas mais do que o “perigo” de implosão do sistema partidário “tal como o conhecemos” (as palavras são de Cavaco), o que implicaria que PSD, PS e CDS se pulverizassem em seitas distintas, assistimos é à infância de partidos emergentes e até à suprema ironia de ver um homem (Marinho e Pinto) arrasar os partidos mas formar um, apelando embora à “abertura da política aos cidadãos”. Não faria, com tal discurso, mais sentido formar um movimento de cidadãos para mudar o regime? Não, porque Marinho e Pinto já percebeu que vive bem nele. Mesmo com implosão, há-de querer sobreviver nos seus escombros.
Do editorial do PÚBLICO 6.10.14