domingo, 15 de dezembro de 2013

A vergonha dos líderes europeus na crise dos refugiados sírios




Quando a Amnistia Internacional divulgou esta notícia, infelizmente, não me surpreendi.
Senti a revolta habitual por ver esta Europa egocêntrica, de memória histórica bem curta, desumana e arrogante face a mais uma cenário de morte e destruição, neste caso, na Síria, para a qual há muito se pediu socorro e ajuda humanitária.

Mas poucos olhos se voltaram apesar dos gritos de apelo e dos horrores que nos surgem diariamente em imagens devastadoras de cruéis atrocidades.

Segundo informações recentes de um dos relatórios da Amnistia Internacional, relativamente ao pedido de ajuda de milhares de refugiados, os líderes europeus tiveram uma posição vergonhosa face aos baixos números de sírios que está disposta a acolher.
Fogem da guerra. Procuram a paz.

Neste documento - “An international failure: The Syrian refugeee crisis” (“Um falhanço internacional: A crise dos refugiados sírios”) - a Amnistia mostra como os países membros da União Europeia apenas se ofereceram para abrir portas a cerca de 12 mil dos mais vulneráveis refugiados da Síria (0,5% dos 2,3 milhões de pessoas que fugiram do país desde a eclosão deste sanguinário conflito começado em 2011).

Eu sei que estas situações são sempre muito complicadas e geram muita polémica nos países de acolhimento e na opinião pública. No entanto, partindo sempre daquilo que considero essencial porque de uma obrigação moral se trata - ajudar quem de mim precisa mesmo que aflita eu também esteja -, aceito, como portuguesa e como cidadã do mundo, que estes pedidos desesperados de quem há muito não sabe, seguramente, o que é uma noite sem bombas, sem gritos de dor, sem corpos desfeitos na rua, sem gente a morrer, sejam aceites por quem melhor do que eles está, pois, meus amigos, nada se compara ao inferno que vivem e do qual nos pedem para sair.

Apesar da conjuntura económica que vivemos, nós, Europa, nós, Portugal, não estamos em guerra mas já estivemos e muita destruição e inquietação também provocámos em povos indefesos, quer em nome da fé quer em nome da ganância e de um poder político e comercial que, afinal, jamais consolidámos.  
Ao longo da nossa História também ocupámos e conquistámos territórios em nome da fé e em nome do comércio. Também matámos, provocámos guerras, estropiámos, torturámos, destruímos e vandalizámos. Mas também sentimos os horrores da guerra e partimos, quer por razões políticas quer por razões económicas, sobretudo desde o século XV. Mesmo durante o Estado Novo, muitos e muitos portugueses pediram ajuda a quem lha pudesse dar (e deu), caso da França, RFA e EUA, quando o fascismo português na mais completa observância daqueles que eram os seus valores fundamentais – Deus, Pátria, Família -, mantinha os pobres deste país a pão e água e no mais aterrador analfabetismo, reprimindo e perseguindo ferozmente quem se lhe opusesse, sobretudo quem da guerra colonial fugisse, embriagado que sempre esteve o salazarismo com a ideia de construir o tal "Portugal multirracial e pluricontinental". 
Sentimos os horrores da 1ª e da 2ª guerra mundial mas nunca deixámos de procurar (até hoje!) uma vida melhor noutras paragens. 

Defenderei sempre o acolhimento dos que buscam em nós a paz e querem, deste modo, salvar a vida dos seus filhos. 

Há muito que o mundo sabe os horrores que este povo tem sofrido, este massacre diário, esta matança de inocentes. Por que não ajudar? Somos, afinal, também um país de emigrantes, espalhados há séculos pelos quatro cantos do  mundo e que partiram bem cedo à procura de uma vida melhor.
Nem sempre pelas melhores razões, é certo, nem sempre da melhor forma, é certo, mas sempre com o objetivo de “partir para encontrar”.

“A União Europeia está a falhar miseravelmente no papel que lhe é devido em garantir refúgio seguro a estas pessoas que perderam tudo menos as suas vidas. O número daqueles que os países europeus estão dispostos a acolher é verdadeiramente vergonhoso. Todos os líderes europeus deviam envergonhar-se”, sustenta o secretário-geral da Amnistia Internacional, Salil Shetty.  
De facto, foi assim que a Europa respondeu:
Os 28 países da União Europeia (UE) apenas se comprometerem a realojar uma muito ínfima parte dos refugiados sírios, e a grossa maioria nem sequer fez tal oferta, incluindo Portugal:
  • Apenas dez estados membros da UE se ofereceram para realojar ou instalar em estruturas de ajuda humanitária refugiados da Síria;
  • A Alemanha é de longe o país que revelou maior generosidade: o país aceitou receber 10 mil refugiados (80 por cento de todos os compromissos feitos pela UE);
  • Excluindo a Alemanha, os restantes 27 países membros da UE ofereceram-se para acolher tão só 2.340 pessoas que fugiram da guerra na Síria;
  • A França disponibilizou-se a receber 500 refugiados: não mais do que 0,02 por cento do total das pessoas que fugiram da Síria;
  • A Espanha aceitou dar acolhimento a apenas 30 refugiados: 0,001 por cento dos refugiados sírios
  • Um total de 18 países da UE – incluindo o Reino Unido e a Itália – não se disponibilizaram para receber nem mesmo um só refugiado da guerra na Síria;
  • Portugal não se comprometeu igualmente à partida a acolher quaisquer refugiados sírios. O país recebeu, porém, um total de 80 pedidos de asilo de cidadãos sírios entre novembro de 2011 e outubro de 2013, e, ainda na madrugada de quinta-feira, 12 de dezembro, chegaram a Portugal 74 cidadãos sírios num voo da TAP oriundo de Bissau.

Devemos olhar para quem precisa. Para o ser humano que de nós precisa.


Afinal, também nós, portugueses, continuamos a precisar!


Nazaré Oliveira