quinta-feira, 26 de maio de 2011

Rua e Luta



Em 1896, Guerra Junqueiro, no seu Pátria, refere que “um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas (...)”, mostra bem como a passividade e a indiferença de um povo perante uma realidade que lhe é hostil, melhor dizendo, a falta de atitude de um povo perante a prepotência, o autoritarismo e a injustiça, podem torná-lo presa fácil de ditadores e exploradores que dele se servem e dele dependem. Ao longo da História, particularmente a partir das grandes revoluções do século XVIII, na Inglaterra e na França, animado pelos ideais iluministas, empreende a caminhada para a sua libertação e toma nas suas mãos o seu destino.
Cortam-se amarras! O povo vem para a rua e, com enorme coragem e determinação, muitos são os que pagam com a vida a sua luta pela liberdade e pela dignidade roubada, há muitos e muitos anos, por ditadores sanguinários e corruptos instalados na cadeira do poder.
Esta onda está a varrê-los e não parará jamais!
Começou com toda a força na Praça Tahrire, no Cairo, e continua a alastar por todo o Médio Oriente, África, Europa...
Em Portugal, iniciou-se a 12 de Março de 2011 com a GERAÇÃO À RASCA, um acontecimento histórico, um dia memorável!
Também lá estive. Porque a minha geração continua à rasca e a dos nossos filhos à rasca está e estará. Porque são sempre os mesmos à rasca para desenrascar os do costume: os "comedores", os "trafulhas", os medíocres, "os das cunhas", "os
 promíscuos", os corruptos, os lambe-botas, "os vendilhões" ...
Não foi para isto que os meus pais lutaram mas também é por isto que eu continuarei a lutar.
Todos somos responsáveis pelo estado a que isto chegou. A defesa da democracia merece a nossa intervenção cívica e política, já, não somente porque o futuro estará comprometido se não agirmos, mas, sobretudo, porque o HOJE já é uma luta desesperada contra a fome, a miséria, a opressão e a prepotência instaladas. E porque o amanhã nada será se o HOJE nada for, estaremos todos irremediavelmente perdidos se não tivermos a consciência dos problemas e as razões que os causaram. Olhemos para a História, particularmente, a partir da 1ª metade do século XX. Quando é que aprendemos a lição? Lição de História, Lição de Vida?
12 de Março de 2011 foi a voz da Rua, do Povo, do Descontentamento, da Revolta, da Injustiça.
A voz de uma democracia ameaçada, violada sistematicamente pela arrogância e estupidez de uma espécie de políticos, para os quais não existe a cultura do exemplo nem moral política, muito menos democracia ética.
Servem políticas de ocasião à medida das suas clientelas e fazem da Política um meio rápido e infalível para o mediatismo que tanto procuram, a qualquer preço, desconhecendo o que é a dignidade, sentido do dever, honra e lealdade, para com o com o país e para com os eleitores.
No dia 12 de Março, senti que se levantava do chão o espírito de Abril e a confiança na luta.
Pacificamente, milhares de pessoas, jovens e adultos, explorados, escravizados, enganados, defraudados, saíram à rua. Mostraram a verdade dos seus dias e uma vida cada vez mais perto de o não ser.
Mostraram que a mentira impera e o terror também. Que da seriedade continuamos arredados, falsamente conduzidos para um beco de desilusões e fracassos, em nome de uma modernidade demagogicamente optimista, incorporada no sorriso e discurso dos líderes que NÃO ouvem o clamor da multidão.
Ética e moral política, precisam-se, mas coragem e determinação, também!
Bertolt Brecht, no seu Elogio da Dialéctica, diz-nos:
“A injustiça avança hoje a passo firme.
Os tiranos fazem planos para dez mil anos.
O poder apregoa: as coisas continuarão a ser como são.
Nenhuma voz além da dos que mandam. (…) Quem pois ousa dizer: nunca?
De quem depende que a opressão prossiga? De nós. De quem depende que ela acabe? Também de nós.” (…)
O que é esmagado, que se levante!
O que está perdido, lute!
O que sabe ao que se chegou, que há aí que o retenha?
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de amanhã.”

"you know, a job you can always get another. Not another country!"


Maria Nazaré Oliveira