segunda-feira, 11 de março de 2019

“Universidade Católica tem uma lei feita à medida”




Em 1990, o governo de Cavaco Silva revogou o decreto-dei sobre o enquadramento da Universidade Católica, de 1971. Contudo, deixou em vigor o artigo que atribui à instituição uma isenção fiscal total. Segundo Mariana Mortágua, uma das regras de um Estado laico “é que as instituições e as diferentes religiões se regem pelas mesmas regras”.
15 de Fevereiro, 2019 - 12:35h

Durante um debate na TVI sobre a isenção fiscal da Universidade Católica, a deputada bloquista Mariana Mortágua lembrou que “em 1971, quando esta lei foi criada, o Estado português não era um Estado laico”.
“E, portanto, todo o ordenamento jurídico que daí resulta é diferente, porque a Igreja era a religião oficial do Estado. A partir de 74 e, principalmente, com a Constituição de 1976, o Estado português passou a ser laico”, acrescentou a dirigente do Bloco.
Conforme frisou Mariana Mortágua, “uma das regras desse Estado laico é que as instituições e as diferentes religiões se regem precisamente pelas mesmas regras”.
“Todas as instituições, ou seja, uma faculdade que é uma cooperativa, ou uma IPSS [Instituição Particular de Solidariedade Social], têm todas as mesmas regras. Surgem então as duas formas que podem ser assumidas por uma universidade: pessoa coletiva de utilidade pública ou IPSS, que têm direito a vários benefícios fiscais. Nomeadamente, o artigo 10º do IRC confere isenção de IRC, a lei dos benefícios fiscais confere benefícios em sede de IMI e outros impostos patrimoniais”, assinalou a deputada.
Mariana Mortágua assinalou que, para usufruir destes benefícios “é preciso fazer um requerimento ao Ministério das Finanças e correr o risco de não serem atribuídos. E isto é assim para todas as IPSS, tenham elas caráter religioso ou não, para todas as fundações, para todas as instituições em Portugal”.
“Exceto para uma que tem uma lei feita à medida, que é uma lei que vem de 1971, quando o Estado português não era laico”, vincou.
A dirigente do Bloco referia-se à Universidade Católica, lembrando que, em 1990, o então primeiro ministro Cavaco Silva promulgou a prorrogação da vigência do artigo que atribui à instituição uma isenção fiscal total. Tal aconteceu “um ano antes de ter aumentado as propinas em Portugal com o argumento de 'justiça social'”, recordou Mariana Mortágua, salientando que “esta é apenas uma ironia da história”.
A deputada bloquista citou a Concordata de 2004 que diz, no artigo 21º, que “a República Portuguesa garante à Igreja Católica e às pessoas jurídicas canónicas (…) no âmbito da liberdade de ensino o direito de estabelecerem e orientarem escolas em todos os seus níveis de ensino e formação de acordo com o direito português, sem estarem sujeitas a qualquer forma de discriminação”.
“Eu tenho a dizer que concordo”, assinalou Mariana Mortágua, destacando que “o que está em causa aqui não é uma forma de discriminação negativa da Universidade Católica, pelo contrário, é uma discriminação positiva da Universidade Católica que lhe confere, por decreto-lei próprio, benefícios que as restantes instituições religiosas ou de outras confissões não podem aceder”.
“A Concordata também diz que qualquer instituição religiosa, entre elas a Igreja Católica, tem isenções fiscais quando a atividade é dirigida ao fim de culto. E eu compreendo isso em igualdade de circunstâncias para todas as confissões e religiões”, adiu.
“Não me parece que os fins únicos da Universidade Católica sejam fins de culto, até porque a Universidade Católica tem outro tipo de programas de ensino privado de licenciaturas, mestrados, doutoramentos de valores bastante elevados”, estando “muito longe de uma atividade meramente de culto e é uma universidade com uma atividade comercial”, vincou Mariana Mortágua.
Respondendo ao argumento da Universidade Católica de teria esses benefícios recorrendo ao estatuto de utilidade pública, a dirigente do Bloco afirmou que “então, se é assim, é possível revogar este artigo sem quaisquer consequências e estabelecemos a normalidade das relações entre o Estado e as diferentes confissões e religiões”.
Em 2015, o Fisco decidiu cobrar impostos à instituição de ensino, que fatura anualmente cerca de 65 milhões. A Universidade Católica contestou e seguiu para tribunal.


6.03.2019