Em 1990, o governo de Cavaco Silva revogou o decreto-dei sobre o
enquadramento da Universidade Católica, de 1971. Contudo, deixou em vigor o
artigo que atribui à instituição uma isenção fiscal total. Segundo Mariana
Mortágua, uma das regras de um Estado laico “é que as instituições e as
diferentes religiões se regem pelas mesmas regras”.
15 de Fevereiro, 2019 - 12:35h
Durante um debate na TVI sobre a isenção fiscal da
Universidade Católica, a deputada bloquista Mariana Mortágua lembrou que “em
1971, quando esta lei foi criada, o Estado português não era um Estado laico”.
“E, portanto, todo o ordenamento jurídico que daí
resulta é diferente, porque a Igreja era a religião oficial do Estado. A partir
de 74 e, principalmente, com a Constituição de 1976, o Estado português passou
a ser laico”, acrescentou a dirigente do Bloco.
Conforme frisou Mariana Mortágua, “uma das regras
desse Estado laico é que as instituições e as diferentes religiões se regem
precisamente pelas mesmas regras”.
“Todas as instituições, ou seja, uma faculdade que é
uma cooperativa, ou uma IPSS [Instituição Particular de Solidariedade Social],
têm todas as mesmas regras. Surgem então as duas formas que podem ser assumidas
por uma universidade: pessoa coletiva de utilidade pública ou IPSS, que têm
direito a vários benefícios fiscais. Nomeadamente, o artigo 10º do IRC confere
isenção de IRC, a lei dos benefícios fiscais confere benefícios em sede de IMI
e outros impostos patrimoniais”, assinalou a deputada.
Mariana Mortágua assinalou que, para usufruir destes
benefícios “é preciso fazer um requerimento ao Ministério das Finanças e correr
o risco de não serem atribuídos. E isto é assim para todas as IPSS, tenham elas
caráter religioso ou não, para todas as fundações, para todas as instituições
em Portugal”.
“Exceto para uma que tem uma lei feita à medida, que é
uma lei que vem de 1971, quando o Estado português não era laico”, vincou.
A dirigente do Bloco referia-se à Universidade
Católica, lembrando que, em 1990, o então primeiro ministro Cavaco Silva
promulgou a prorrogação da vigência do artigo que atribui à instituição uma
isenção fiscal total. Tal aconteceu “um ano antes de ter aumentado as propinas
em Portugal com o argumento de 'justiça social'”, recordou Mariana Mortágua,
salientando que “esta é apenas uma ironia da história”.
A deputada bloquista citou a Concordata de 2004 que
diz, no artigo 21º, que “a República Portuguesa garante à Igreja Católica e às
pessoas jurídicas canónicas (…) no âmbito da liberdade de ensino o direito de
estabelecerem e orientarem escolas em todos os seus níveis de ensino e formação
de acordo com o direito português, sem estarem sujeitas a qualquer forma de
discriminação”.
“Eu tenho a dizer que concordo”, assinalou Mariana
Mortágua, destacando que “o que está em causa aqui não é uma forma de
discriminação negativa da Universidade Católica, pelo contrário, é uma
discriminação positiva da Universidade Católica que lhe confere, por
decreto-lei próprio, benefícios que as restantes instituições religiosas ou de
outras confissões não podem aceder”.
“A Concordata também diz que qualquer instituição
religiosa, entre elas a Igreja Católica, tem isenções fiscais quando a
atividade é dirigida ao fim de culto. E eu compreendo isso em igualdade de
circunstâncias para todas as confissões e religiões”, adiu.
“Não me parece que os fins únicos da Universidade
Católica sejam fins de culto, até porque a Universidade Católica tem outro tipo
de programas de ensino privado de licenciaturas, mestrados, doutoramentos de
valores bastante elevados”, estando “muito longe de uma atividade meramente de
culto e é uma universidade com uma atividade comercial”, vincou Mariana
Mortágua.
Respondendo ao argumento da Universidade Católica de
teria esses benefícios recorrendo ao estatuto de utilidade pública, a dirigente
do Bloco afirmou que “então, se é assim, é possível revogar este artigo sem
quaisquer consequências e estabelecemos a normalidade das relações entre o
Estado e as diferentes confissões e religiões”.
Em 2015, o Fisco decidiu cobrar impostos à instituição
de ensino, que fatura anualmente cerca de 65 milhões. A Universidade Católica
contestou e seguiu para tribunal.
6.03.2019