quinta-feira, 26 de abril de 2018

A divulgação dos interrogatórios a José Sócrates



 São José de Almeida, presidente do Conselho de Deontológico do Sindicato dos Jornalistas, declarou ao PÚBLICOde hoje que é inegável que as reportagens da SIC divulgaram aspetos do processo de relevante interesse público sendo, por isso, legítimas.
Inegável? Legítimas?
Interesse público? 
Onde está a confiança na Justiça? Onde está "a separação dos poderes"? 
Voyeurismo televisivo. Claramente. Trabalhos tendenciosos. Claramente. Sem falar da conquista a qualquer preço das audiências.
Se assim não fosse, por que razão não foram apresentados a público/ não vimos os depoimentos "também ao vivo e a cores" das pessoas envolvidas no caso CASA PIA? Isto é IGUALDADE? Isto é serviço público? Tudo calado. Tudo parado...Tudo escondido... 
Jornalismo sério e a sério, com profissionais isentos e ética profissional, não é este nem é assim que se afirma.
Bem vi e ouvi os depoimentos dos jornalistas envolvidos "nesta investigação". Que argumentos! Que pobreza de fundamentação! É isto que queremos no estado de Direito que tanto defendemos? 
Num estado de Direito, quem julga são os tribunais, não os jornais. Num estado de Direito não há linchamentos públicos nem julgamentos encomendados, muito menos, casos "escolhidos". Não. Não é por aqui que caminharemos em prol de uma sociedade decente, porque a decência começa em nós, no que pensamos, no que dizemos ou escrevemos, no que mandamos ou não fazer quando as decisões de nós tiverem de partir.
Numa sociedade decente e democrática, os direitos e deveres de cada um devem ser assumidos com a dignidade com que sempre os exigimos, não só para nós mas para todos.
Estou de acordo com a ministra da Justiça, sim, quando afirma que a divulgação de imagens de interrogatórios da Operação Marquês “constitui crime” e que o Ministério Público tomará “as iniciativas necessárias” para “reprimir a ilegalidade”. “Aquilo que está em causa é uma divulgação não-autorizada de peças de um processo e, portanto, isso constitui crime e estou segura de que o Ministério Público tomará as iniciativas necessárias para reprimir a ilegalidade neste caso, tal como faz em outras questões de matéria criminal”.
Efetivamente, tal como referiu o MP, embora o processo em causa já não se encontre em segredo de justiça, a divulgação destes registos está proibida, nos termos do art.º 88.º n.º 2 do Código de Processo Penal, incorrendo, quem assim proceder, num crime de desobediência (artigo 348.º do Código Penal)”.
Passados que são 44 anos a seguir à revolução de Abril, continuamos a ver o estado de Direito ameaçado por gente que, com “pequenos poderes”, vai minando as instituições democráticas constitucionalmente organizadas, recorrendo à desobediência da lei e, pior ainda, subvertendo-a aos seus interesses.
Não se trata, aqui, do direito à liberdade de expressão mas, seguramente, do respeito pelo uso da mesma. "Vale tudo menos tirar olhos"?

Nazaré Oliveira