Fala-me de Amor
O sexo é a
única matéria inteligente, palavras
da minha escritora favorita de língua portuguesa, Agustina Bessa Luís. Não sei
se tal frase poderia sair da cabeça de um homem, porque se há matéria em que
mulheres e homens são bastante diferentes, é no sexo. Usei bastante, porque nuns caso são muito e noutros casos são pouco. E quando estão apaixonados
ficam iguais a nós: o mundo transforma-se num lugar maravilhoso onde as cores
são mais nítidas, cheira a pipocas e voam lindas a graciosas borboletas dentro
e fora do estômago.
A
terapeuta belga Hellen Perrel também fala de inteligência erótica do sexo,
considerando-o não uma acção, mas uma linguagem, que se desenvolve de formas
diferentes. Matéria inteligente ou linguagem erótica, isto para as mulheres faz
sentido, mas será que faz para os homens?
Quando um
homem deseja uma mulher não quer dizer que a ame. Geralmente começa por
deseja-la, e depois, encanta-se e apaixona-se. Mas o desejo físico, esse grande
incendiário perturbador do nosso quotidiano, está lá para nos trocar as voltas
e nos levar ao céu ou nos atirar para o inferno sem que sobre isso tenhamos
algum controlo, pelo menos durante o chamado voo nupcial ou momento de
acasalamento. Nessa fase é tudo muito fácil. O pior é o que vem a seguir. Há
homens que não lidam bem com as suas emoções: ou se deixam dominar por elas e
ficam uns chatos, ou as consideram perigosas e ficam frios. E há ainda outros
tipos de homens: os que só se apaixonam por relações clandestinas ou
extra-conjugais e os que têm o sexo dissociado dos afectos profundos, quando se
apaixonam por uma mulher atiram-na para um pedestal e transformam-na numa
estátua.
No entanto,
a questão do erotismo é séria, porque se tornou um produto de consumo para
grandes massas. E o povo português descobriu que afinal havia mais qualquer
coisa para lá da penetração atabalhoada ao fim de noite, entre o sexto e o
sétimo sono e uma bebedeira mal cozinhada, de luz apagada a disfarçar a
vergonha, tudo misturado numa salada de confusão mental onde o prazer para as
mulheres não era mais do que um luxo raro.
O sexo é
para todos e nisso estamos todos de acordo. E já agora que seja bom. Mas será
que com tanto sexo explícito e tanto erotismo barato, a vida sexual das pessoas
melhorou mesmo?
A igualdade
entre sexos ganhou contornos equívocos: agora são eles que gostam que elas lhes
abram a porta, lhes comprem presentes caros e os convidem para jantar. As
mulheres estranham, sentem-se apanhadas na sua própria armadilha. No sexo, as
regras do jogo também não se alteraram. Os homens têm saudades de ir à caça, de
prazer da perseguição, de fixar o alvo, de focar e disparar, de gozar
intensamente o segundo imediatamente antes de agarrar a presa. Talvez a
natureza humana tenha mudado menos do que aparenta desde o tempo das cavernas
em que o macho arrastava pelos cabelos a sua fêmea e a cobria a um canto da
gruta em solavancos descompassados.
À
custa da afirmação feminina, os homens confundem agora segurança com
arrogância, independência com desprendimento, entrega com leviandade. E têm
medo que as mulheres façam com eles o que sempre acharam natural fazer com
elas: usar e deitar fora.
O sexo não
pode por isso ser tratado como uma lata de tomate pelado, nem visto como um cartoon. Sem a sacralização do
acto, este perde o seu lado mágico. E afinal, sem borboletas, quem não desiste
à segunda volta? A alquimia da paixão é o que torna o sexo bom. Ou ótimo, já
agora.
por Margarida Rebelo Pinto