Defendo uma sociedade laica mas
considero que a Igreja de Pedro (apóstolo), a Igreja que Jesus Cristo pretendeu
e pretende, é aquela que, inequivocamente, deve estar ao lado dos pobres, dos
explorados, dos humilhados, dos injustiçados, coisa que nem sempre vejo de
forma clara, tal o pecado por omissão que tanto critico em certos membros da
Igreja, sobretudo da Católica, mais temente aos homens do que a Deus, mais
voltada para a teatralização e mediatização da fé do que para a verdadeira
espiritualidade e cumprimento dos mandamentos que tanto propagandeia mas
deveria interiorizar, deles sendo o principal exemplo.
Já lá vai o tempo em que o poder
espiritual subordinava a si tudo e todos, e em que esse mesmo poder, omnipotente
e omnipresente governava "a bem da nação", como aconteceu no Estado
Novo, numa promíscua e aterradora ligação com o governo de Salazar-Caetano, e
até, com Franco, Hitler ou Mussolini.
Mas é óbvia a importância que tiveram
e têm homens (e mulheres) ligados a esta Igreja, como foi o caso de D. António
Ferreira Gomes e tem sido o de D. Manuel Martins e de D. Januário Torgal
Ferreira que, em nome do povo e em nome de valores que a todo o custo alguns
querem varrer, vêm, destemidamente, num Portugal cada vez mais amordaçado,
pôr-se ao lado da realidade que quem manda quer impingir, quando essa realidade
é feita de mentira e de inverdades e que, por isso mesmo, denunciadas devem
ser.
Aliás, em democracia, chega a ser
crime não o fazer em nome da justiça e igualdade de todos perante a lei, pois é
inadmissível o que, à custa do “25 de Abril” e do voto popular muitos têm
galgado, pondo-se a salvo do atoleiro e da pouca-vergonha em que nos meteram e
querem continuar a meter, completamente protegidos pelas leis que fazem (ou não
fazem) e pelas impunidades políticas que os seus “cargos” lhe permitem.
É um imperativo moral fazer isto! Um
dever cívico!
Pena é que a Igreja Católica, do seu
púlpito, quer no Vaticano quer numa qualquer povoação de um qualquer lugar o
faça, seja que membro for ou que funções ocupem, até mesmo os leigos e,
particularmente, os que se dizem “praticantes-militantes”.
Incrível esta acomodação aos cargos e
aos “lugarzinhos marcados”!
Relendo Eça de Queirós, sempre com
uma inteligência e perspicácia fabulosas, de facto, mais uma vez concluo quão
lentos temos sido ou andado há tantos séculos em matéria de intervenção e
exigência cívica, política e governativa!
Em 1867, no “Distrito de Évora
“dizia:
Em Portugal não há ciência de
governar nem há ciência de organizar oposição. Falta igualmente a aptidão, e o
engenho, e o bom senso, e a moralidade, nestes dois factos que constituem o
movimento político das nações. A ciência de governar é neste país uma habilidade,
uma rotina de acaso, diversamente influenciada pela paixão, pela inveja, pela
intriga, pela vaidade, pela frivolidade e pelo interesse. A política é uma
arma, em todos os pontos revolta pelas vontades contraditórias; ali dominam as
más paixões; ali luta-se pela avidez do ganho ou pelo gozo da vaidade; ali há a
postergação dos princípios e o desprezo dos sentimentos; ali há a abdicação de
tudo o que o homem tem na alma de nobre, de generoso, de grande, de racional e
de justo; em volta daquela arena enxameiam os aventureiros inteligentes, os
grandes vaidosos, os especuladores ásperos; há a tristeza e a miséria; dentro
há a corrupção, o patrono, o privilégio. A refrega é dura; combate-se,
atraiçoa-se, brada-se, foge-se, destrói-se, corrompe-se. Todos os desperdícios,
todas as violências, todas as indignidades se entrechocam ali com dor e com
raiva. À escalada sobe todos os homens inteligentes, nervosos, ambiciosos (...)
todos querem penetrar na arena, ambiciosos dos espetáculos cortesãos, ávidos de
consideração e de dinheiro, insaciáveis dos gozos da vaidade.
D. Januário Torgal Ferreira, o bispo
das Forças Armadas, diz que há «diabinhos negros» no atual Governo, dizendo que
“Há jogos atrás da cortina, habilidades e corrupção. Este Governo é profundamente
corrupto nestas atitudes a que estamos a assistir", frisou, acrescentando:
"Nós estamos numa peregrinação em direção a Bruxelas e quando tudo estiver
pago daqui de Portugal sai uma procissão de mascarados a dizer: vamos para um
asilo, salvem-nos".
Mas, D. Januário, se me permite, se
estes são negros, os outros negros foram, pois, como todos sabemos e por aquilo
que nos provocaram, nenhum deles tem desculpa pelo que fez ou permitiu que se
fizesse!
O registo crítico relativamente ao
Governo não é uma novidade, mas os termos utilizados por D. Januário Torgal
Ferreira nunca tinham sido tão fortes.
Na última noite, o bispo das Forças
Armadas disse que por comparação com alguns dos atuais membros do Governo, os
anteriores eram uns «anjos ao pé destes diabinhos negros que acabam de
aparecer».
Há alguns meses, este bispo já tinha
comparado Pedro Passos Coelho a Salazar.
Contactada pela TSF, fonte do
executivo disse que as palavras do bispo não mereceram qualquer tipo de reação.
"O problema é civilizacional, porque
é ético. Eu não acredito nestes tipos, em alguns destes tipos, porque são
equívocos, porque lutam pelos seus interesses, porque têm o seu gangue, porque
têm o seu clube, porque pressionam a comunicação social, o que significa que os
anteriores, que foram tão atacados, eram uns anjos ao pé destes diabinhos
negros que acabam de aparecer", frisou no programa Política Mesmo da TVI
24horas.
D. Januário tem sido uma voz ao lado
da razão. Diferente, pela positiva, desassombrada, corajosa.
Espero que o continuem a deixar falar
e que as suas palavras continuem a ser um alerta para o nosso povo, tão
revoltado mas tão manso e tão apático.
De boas intenções e de diabinhos
destes está o inferno cheio! Bem cheio!
nazaré oliveira