terça-feira, 17 de julho de 2012

D. Januário Torgal Ferreira e os anjinhos



Defendo uma sociedade laica mas considero que a Igreja de Pedro (apóstolo), a Igreja que Jesus Cristo pretendeu e pretende, é aquela que, inequivocamente, deve estar ao lado dos pobres, dos explorados, dos humilhados, dos injustiçados, coisa que nem sempre vejo de forma clara, tal o pecado por omissão que tanto critico em certos membros da Igreja, sobretudo da Católica, mais temente aos homens do que a Deus, mais voltada para a teatralização e mediatização da fé do que para a verdadeira espiritualidade e cumprimento dos mandamentos que tanto propagandeia mas deveria interiorizar, deles sendo o principal exemplo.

Já lá vai o tempo em que o poder espiritual subordinava a si tudo e todos, e em que esse mesmo poder, omnipotente e omnipresente governava "a bem da nação", como aconteceu no Estado Novo, numa promíscua e aterradora ligação com o governo de Salazar-Caetano, e até, com Franco, Hitler ou Mussolini.

Mas é óbvia a importância que tiveram e têm homens (e mulheres) ligados a esta Igreja, como foi o caso de D. António Ferreira Gomes e tem sido o de D. Manuel Martins e de D. Januário Torgal Ferreira que, em nome do povo e em nome de valores que a todo o custo alguns querem varrer, vêm, destemidamente, num Portugal cada vez mais amordaçado, pôr-se ao lado da realidade que quem manda quer impingir, quando essa realidade é feita de mentira e de inverdades e que, por isso mesmo, denunciadas devem ser.
Aliás, em democracia, chega a ser crime não o fazer em nome da justiça e igualdade de todos perante a lei, pois é inadmissível o que, à custa do “25 de Abril” e do voto popular muitos têm galgado, pondo-se a salvo do atoleiro e da pouca-vergonha em que nos meteram e querem continuar a meter, completamente protegidos pelas leis que fazem (ou não fazem) e pelas impunidades políticas que os seus “cargos” lhe permitem.

É um imperativo moral fazer isto! Um dever cívico!

Pena é que a Igreja Católica, do seu púlpito, quer no Vaticano quer numa qualquer povoação de um qualquer lugar o faça, seja que membro for ou que funções ocupem, até mesmo os leigos e, particularmente, os que se dizem “praticantes-militantes”.
Incrível esta acomodação aos cargos e aos “lugarzinhos marcados”!
Relendo Eça de Queirós, sempre com uma inteligência e perspicácia fabulosas, de facto, mais uma vez concluo quão lentos temos sido ou andado há tantos séculos em matéria de intervenção e exigência cívica, política e governativa!

Em 1867, no “Distrito de Évora “dizia:

Em Portugal não há ciência de governar nem há ciência de organizar oposição. Falta igualmente a aptidão, e o engenho, e o bom senso, e a moralidade, nestes dois factos que constituem o movimento político das nações. A ciência de governar é neste país uma habilidade, uma rotina de acaso, diversamente influenciada pela paixão, pela inveja, pela intriga, pela vaidade, pela frivolidade e pelo interesse. A política é uma arma, em todos os pontos revolta pelas vontades contraditórias; ali dominam as más paixões; ali luta-se pela avidez do ganho ou pelo gozo da vaidade; ali há a postergação dos princípios e o desprezo dos sentimentos; ali há a abdicação de tudo o que o homem tem na alma de nobre, de generoso, de grande, de racional e de justo; em volta daquela arena enxameiam os aventureiros inteligentes, os grandes vaidosos, os especuladores ásperos; há a tristeza e a miséria; dentro há a corrupção, o patrono, o privilégio. A refrega é dura; combate-se, atraiçoa-se, brada-se, foge-se, destrói-se, corrompe-se. Todos os desperdícios, todas as violências, todas as indignidades se entrechocam ali com dor e com raiva. À escalada sobe todos os homens inteligentes, nervosos, ambiciosos (...) todos querem penetrar na arena, ambiciosos dos espetáculos cortesãos, ávidos de consideração e de dinheiro, insaciáveis dos gozos da vaidade.

D. Januário Torgal Ferreira, o bispo das Forças Armadas, diz que há «diabinhos negros» no atual Governo, dizendo que “Há jogos atrás da cortina, habilidades e corrupção. Este Governo é profundamente corrupto nestas atitudes a que estamos a assistir", frisou, acrescentando: "Nós estamos numa peregrinação em direção a Bruxelas e quando tudo estiver pago daqui de Portugal sai uma procissão de mascarados a dizer: vamos para um asilo, salvem-nos".

Mas, D. Januário, se me permite, se estes são negros, os outros negros foram, pois, como todos sabemos e por aquilo que nos provocaram, nenhum deles tem desculpa pelo que fez ou permitiu que se fizesse!

O registo crítico relativamente ao Governo não é uma novidade, mas os termos utilizados por D. Januário Torgal Ferreira nunca tinham sido tão fortes.
Na última noite, o bispo das Forças Armadas disse que por comparação com alguns dos atuais membros do Governo, os anteriores eram uns «anjos ao pé destes diabinhos negros que acabam de aparecer».
Há alguns meses, este bispo já tinha comparado Pedro Passos Coelho a Salazar.
Contactada pela TSF, fonte do executivo disse que as palavras do bispo não mereceram qualquer tipo de reação.

"O problema é civilizacional, porque é ético. Eu não acredito nestes tipos, em alguns destes tipos, porque são equívocos, porque lutam pelos seus interesses, porque têm o seu gangue, porque têm o seu clube, porque pressionam a comunicação social, o que significa que os anteriores, que foram tão atacados, eram uns anjos ao pé destes diabinhos negros que acabam de aparecer", frisou no programa Política Mesmo da TVI 24horas.


D. Januário tem sido uma voz ao lado da razão. Diferente, pela positiva, desassombrada, corajosa.

Espero que o continuem a deixar falar e que as suas palavras continuem a ser um alerta para o nosso povo, tão revoltado mas tão manso e tão apático.

De boas intenções e de diabinhos destes está o inferno cheio! Bem cheio!


nazaré oliveira